Cobra Kai, melhor que Karate Kid

 

Está na Netflix a terceira temporada de Cobra Kai, uma das séries mais bem boladas dos últimos tempos. Se você esteve fora do planeta nestes últimos tempos, trata-se da revisita aos personagens dos três primeiros filmes da franquia Karate Kid (houve um quarto, imperdoável, que tinha Hillary Swank como a pupila do Sr. Miyagi (Noriuki Pat Morita) em vez de Daniel Larusso (Ralph Macchio)). A grande sacada está no foco da ação se voltar para o vilão do primeiro longa, de 1984: Johnny Lawrence, o valentão típico das high schools americanas, louro, burro, atlético, bonitão e truculento. Aqui, em especial, Lawrence era chefe de um grupo de lutadores de caratê, o Cobra Kai, que tinha em John Kreese (Martin Kove), o seu sensei. No filme é fácil ver que Lawrence (William Zabka) é o vilão estilizado e Larusso é o mocinho, tudo bem superficial e estereotipado. E chato. Apesar de emblemático dos anos 1980, Karate Kid nunca foi um de seus filmes mais legais. Eu, por exemplo, sempre torci contra Larusso.

 

 

Cobra Kai é sensacional porque coloca Lawrence no foco, mostrando-o como um zé ninguém que errou tudo na vida. Tem um filho delinquente com o qual não se relaciona e uma ex- esposa junkie. Larusso, por sua vez, tem um império de concessionárias de automóveis de luxo, é casado e tem dois filhos. Esta realidade é transformada quando Lawrence conhece Miguel (Xolo Maridueña), um menino humilde e bonzinho, que sofre bullying na escola por ser latino e tímido. Daí vem a ideia: treinar Miguel para que aprenda alguns golpes de caratê e consiga se defender dos valentões. Dito e feito. Daí ressurge o Cobra Kai, tendo Johnny como sensei. O sucesso é imediato, com várias adesões de meninos e meninas que sofrem violência na escola, tornando a empreitada um sucesso. A rivalidade entre Larusso e Lawrence também irá reacender e ganhar corpo, na medida em que o caratê volta a fazer parte da rotina de ambos. Entra em cena o time de novos atores/personagens da série, especialmente Mary Mouser, que vive Samantha, filha de Daniel, e Robby, filho de Lawrence, vivido por Tanner Buchanan. Até que o próprio Kreese ressurge das trevas, reivindicando sua participação no sucesso do Cobra Kai.

 

 

Estes dois parágrafos cobrem os eventos que tiveram lugar nas duas primeiras temporadas da série. A terceira amplia as discussões e dá espaço para que eventos ocorridos no segundo Karate Kid, de 1986, sejam revisitados, com presença de personagens originais, o que dá uma bela turbinada na trama. Aliás, a história não avança muito além da pancadaria ensejada especialmente no fim da segunda temporada. As consequências estão evidentes e afetaram especialmente Johnny e Daniel, cada um a seu jeito. Enfrentando diferentes barras pesadas, emocionais e financeiras, ambos irão lidar com as questões decorrentes e encontrar meios para superar. Há prisão, reformatório, traições e mais pancadaria, com o risco sério de Cobra Kai perder a mão neste quesito, abusando muito das cenas de violência pura e simples. É um ponto importante a ser conferido na próxima temporada.

 

 

Fica muito difícil falar algo mais profundo sobre a nova temporada sem cair no risco de dar algum spoiler. A mão chega a formigar de vontade, mas me limito a dizer que há o retorno de um personagem que terá um episódio só para si. E o resultado desta quase homenagem é perfeito, faz muita coisa ganhar encaixe e sentido. Ainda que a trama esteja flertando com a violência além da conta e com doses mais pesadas de dramalhão, Cobra Kai ainda tem a seu favor as cenas com William Zabka na pele de Johnny Lawrence, sem dúvida, uma das mais bem sucedidas sacadas recentes da dramaturgia televisiva. Ele é canastrão de forma intencional, protagoniza um brucutu de coração bom, que não tem qualquer desenvoltura no mundo moderno e que, por exemplo, não sabe que um laptop pode ser recarregado na tomada. Suas cenas são tragicômicas na medida certa, fazendo de Johnny um anti-herói na medida mais que certa.

 

 

Atenção para um dos mais simpático cantores de rock dos anos 1980, que aparece num dos
primeiros episódios. A cena toda é ótima e muito bem bolada.

 

 

Ops, não resisti. Vejam.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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