Beautiful Boy – Sem Meias Palavras

 

Um tique da pós-modernidade é a glamourização de situações terríveis. O uso das drogas é uma dessas instâncias em que a dor e as consequências se transformam mais em atos corajosos contra um sistema opressor do que situações em que a vida de alguém pode estar em jogo. Músicas, filmes, livros, entre outros produtos da indústria cultural, devidamente amplificados pela ação da mídia, desviam o foco da realidade dura da coisa: é  uma doença e precisa de tratamento. “Beautiful Boy”, magistral longa dirigido por Felix Van Groeningen (Arizona Monroe) e estrelado por Steve Carell e Timothée Chalamet é uma espécie de chamado para esta realidade.

O roteiro é inspirado em dois livros, escritos por David Sheff e Nic Sheff, pai e filho,  sobre o vício do segundo e as tentativas do primeiro em trazê-lo de volta. As diversas  situações típicas do usuário de várias drogas aparecem em efeito cascata ao longo da montagem/edição, criando um painel quase psicodélico, no qual a dualidade entre a  dependência de Nic e o desespero de David vão assumindo papéis de dois lados da mesma moeda, no caso, a fragmentação humana, individual e, numa segunda estância, familiar.

Nic é o mais velho dos três filhos de David, o único do primeiro casamento dele. Os dois caçulas, fruto da união com Karen (a ótima Maura Tierney), têm exata noção da condição do irmão mais velho, mesmo ainda bem jovens. Todas as situações possíveis vão surgindo na tela: roubo de itens domésticos para comprar drogas, tentativa de tratamento, internação em reabilitação, tentativa de cura por mudança de ares, tentativa de cura por ida para a faculdade, recaídas após muito e pouco tempo sem usar drogas, overdoses…O filme não se dispõe a poupar o espectador em nenhum momento e se vale da ótima química em Carell e Chalamet para isso. Ambos estão excelentes.

É difícil entender como o longa não teve indicações para o Oscar. Merecia ao menos para os dois atores e de roteiro. Seu maior mérito é colocar o espectador sem qualquer ideia do fim, temendo pelo pior ao longo das duas horas de projeção. A trilha sonora também ajuda a manter o clima e assume identificação com Nic, trazendo de John Lennon a Sigur Rós, passando por David Bowie e Massive Attack. É especialmente tocante a cena em que Nic canta “Territorial Pissings”, do Nirvana, ao lado do pai, ambos ouvindo a música no rádio do carro. Não deixe de ver.

Cotação: 4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)
Duração: 120 min.
Elenco: Steve Carell, Timothée Chalamet, Maura Tierney
Direção: Felix Van Groeningen

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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