13 (+ 3) Discos ao Vivo Internacionais

 

 

Elaborar essas listas com melhores gravações, melhores discos e demais marcos de efemérides é uma tarefa muito árdua. Não podemos ultrapassar este limite do número 13 – pelo menos, não de forma ostensiva, algo que a gente dribla colocando esses “+3” ou “+4” aqui e ali. No caso de discos ao vivo, a tarefa é tão complexa que dividimos em uma lista internacional e outra nacional, que virá em breve. E o desejo de recordar/apresentar esses álbuns para o leitor vem da belezura que é – ou era – ouvir versões diferentes das músicas que já conhecíamos das gravações em estúdio. Em outros casos, muito mais específicos, a ideia é ter um souvenir de um show no qual estivemos…

 

De qualquer forma, os discos listados aqui são experiências que primam pelo ineditismo com que os artistas apresentaram seu próprio repertório diante de um público grande ou nem tanto. E de como este público interagiu, cantou, vivenciou esta ou aquela canção. Porque disco ao vivo tem a ver com produzir algo novo a partir do que já é conhecido e não uma mera regurgitação de algo que já existe e que é executado com preguiça pelo artista. Ou seja, álbuns ao vivo em que as faixas surgem quase iguais aos registros de estúdio já saem limados do critério de escolha. E também procuramos olhar para discos que adquiriram uma aura histórica dentro da carreira do artista. Sendo assim, aqui vão nossas escolhas internacionais. Em breve viremos com os escolhidos brasileiros.

 

 

James Brown – Live At Apollo, 1962 – Aqui é outro momento da história sendo escrita com letras fortíssimas. James Brown, a ponto de se tornar “o homem que mais trabalhava no show business” ou “o soul brother número 1” adentra o palco do Apollo Theatre, em Nova York, e desfila seu repertório de transição entre o jazz, o soul e o r&b, dando pistas do que faria pouco tempo em seguida. “Think”, “I Don’t Mind” e “Night Train” são indescritíveis.

 

 

 

Sam Cooke – Live At Harlem Square Club, 1963 – Mostra aquele que deve ser o mais influente cantor de soul de todos os tempos em seu elemento natural – o palco, no qual ele interage com a plateia de um pequeno clube em Miami. O repertório traz colossos imemoriais como “Cupid”, “Chain Gang”, “Twistin’ The Night Away” e vários outros. Dá pra ver ingleses promissores e adolescentes como Rod Stewart e Mick Jagger desejando cantar como Sam.

 

 

Jerry Lee Lewis – Live At Star-Club Hamburg, 1964 – Com 28 anos, após ser preso por casar com a prima pré-adolescente e enfrentar vários problemas com justiça e gravadoras, Jerry Lee Lewis estava no topo da forma em 1964. Por essas e outras, este show, dado num clube em Hamburgo no qual os Beatles haviam estado anos antes, é uma aula de fúria rocker em estado primitivo e incandescente. As versões ao vivo de “Great Balls Of Fire” e “Whole Lotta Shakin’ Going On” são imoralmente selvagens. Pena que o álbum está incompleto nos serviços de streaming.

 

 

Frank Sinatra – At The Sands, 1966 – Este é um dos álbuns ao vivo mais sensacionais de todos os tempos. Sinatra entra em cena e já dispara: “Como essa gente toda veio parar no meu quarto?” e já enfia, logo de cara, três sucessos monstruosos de sua carreira: “Come Fly With Me”, “I’ve Got A Crush On You” e “I’ve Got You Under My Skin” diante da plateia felizarda do Sands Casino, em Las Vegas. Muita malandragem de palco, várias piadas com o público e a Count Basie Orchestra regida por Quincy Jones. Sério, não dá pra melhorar mais.

 

 

Johnny Cash – At Folson Prison, 1968 – “Hello, I’m Johnny Cash” é o que se ouve primeiro neste clássico dos discos ao vivo. É Johnny Cash, o homem de preto, a alma torturada do country americano, adentrando o palco da penitenciária de Folson, na Califórnia, a ponto de desfilar seu repertório diante de presidiários de várias condenações, seu público mais fiel. E Johnny faz isso com a maestria e o conhecimento de causa dos caminhos cruzados e encruzilhadas da vida. O resultado é histórico e atrelaria para sempre a imagem dele com as cadeias e esses velhos diabos cumprindo pena por crimes terríveis.

 

 

The Who – Live At Leeds, 1970 – Este é o The Who pós-Tommy, em mutação daquele estado original de banda raivosa e mundana, decantada já na psicodelia do sensacional “The Who Sell Out”, de 1968 e realizador da primeira ópera rock de sua carreira. Gravado na Universidade de Leeds, este disco duplo é considerado um dos maiores álbuns ao vivo de rock de todos os tempos. Versões luminosas de “Substitute”, “I Can’t Explain”, a versão sensacional para “Summertime Blues” (de Eddie Cochran) e o medley ao vivo de “My Generation”, com quase 15 minutos. Sensacional é pouco.

 

 

Rolling Stones – Get Yer Ya-Ya’s Out, 1970 – Este disco sintetiza – e encerra – a década de 1960 dos Rolling Stones. É uma aula de como soar ao vivo, com fúria e precisão. Gravado em novembro de 1969, ele flagra os Stones logo após lançarem seu álbum “Let It Bleed”, já com Mick Taylor nas guitarras e desfila esse repertório blues-rock da banda à época, abrindo com “Jumpin’ Jack Flash” e indo em frente com “Symphathy For The Devil”, “Street Fighting Man”, “Honky Tonk Women” e com aquela cover-tributo ao mestre Chuck Berry: “Little Queenie”.

 

 

James Brown – Love Power Peace, 1971 – James Brown já era uma criatura completamente definida e formada neste momento de sua carreira, a tal ponto de justificar a entrada de um segundo disco ao vivo nesta lista. Gravado em Paris, ele já mostra Brown com os furiosos JB’s no palco, constituindo uma máquina muito bem azeitada de ritmos e climas funky. Destaque absoluto para “Ain’t It Funky Now”, “Sex Machine” e o medley insano de “Papa’s Got A Brand New Bag” com “I Got You (I Feel Good)” e “I Got The Feeling”.

 

 

B.B. King, ‘Live in Cook County Jail’, 1971 – Não era só Johnny Cash que desfrutava de uma audiência de condenados. BB King, o mestre absoluto da guitarra elétrica no blues em seu tempo, também cravou seu nome na história com um disco registrado em uma penitenciária, no caso, a Cook County Jail, em Chicago. O álbum foi gravado na tarde do dia 10 de setembro de 1970 e mostra King com uma banda enxuta em desfile total de clássicos de sua carreira, como “The Thrill Is Gone” e versões maravilhosas como “Every Day I Have The Blues” (Memphis Slim) ou “How Blue Can You Get?” (Johnny Moore).

 

 

Donny Hathaway – Live, 1972 – Donny foi uma dessas realidades da soul music que brilharam intensamente pelo curto espaço de tempo que estiveram entre nós. Dono de uma voz impressionante e um talento avassalador para interpretar canções próprias e alheias, ele veio com este álbum ao vivo, cujo lado 1 foi gravado no mítico Troubadour, em Los Angeles e o lado 2 no The Bitter End, Greenwich Village, em Manhattan. O repertório é imaculado, a abertura já traz o sujeito se apropriando de nada menos que “What’s Going On”, de Marvin Gaye, enquanto ele ainda passearia por “You’ve Got A Friend” (Carole King) e por uma versão enorme de sua canção-símbolo: “The Ghetto”.

 

 

Van Morrison – It’s Too Late To Stop Now, 1974 – Van Morrison gravou este álbum duplo ao vivo entre a Califórnia e Londres, sintetizando seus primeiros anos como artista solo devidamente referendado por álbuns sensacionais e uma presença de palco única. Estes shows foram dados em meio a uma turnê de três meses, com Van ancorado pela Caledonia Soul Orchestra, sua banda de apoio de 11 pessoas naquele tempo. É um desfile de gala do melhor da lavra do irlandês àquele tempo, passando por clássicos como “Caravan”, “Warm Love”, “Ain’t Nothing You Can Do” e covers de Ray Charles, Willie Dixon e Sonny Boy Williamson. De quebra ainda temos releituras dos tempos de Them, com “Gloria” e “Here Comes The Night”.

 

 

Joni Mitchell – Miles Of Aisles, 1974 – Esta é Joni Mitchell fazendo o inventário de seu início de carreira como semideusa do folk rock californiano e prestes a decolar para voar por céus mais audaciosos, que envolviam apropriações jazzy e experimentos com música erudita. Aqui Joni tinha acabado de lançar o belo e indispensável “Court And Spark” e estava soberana no palco. As versões de “Big Yellow Taxi”, “Blue”, “Carey”, “Woodstock” e “Last Time I Saw Richard” parecem vir de outro lugar, outro tempo.

 

 

Peter Frampton – Comes Alive, 1976 – Peter Frampton vinha egresso de uma banda chamada Humble Pie, famosa por ser integrante daquela leva de formações inglesas que tocavam blues-rock setentista, como Free ou Faces. Nada do que ele fez ou faria depois em sua carreira se compararia ao sucesso impressionante que seu álbum duplo ao vivo fez em 1976. “Show Me The Way” – com o famoso uso do efeito vocal na guitarra – e “Baby I LOve Your Way” foram sucessos interplanetários extraídos do disco e até hoje marcam a carreira de Frampton. De quebra ainda há uma cover bem bacana de “Jumpin’ Jack Flash”, dos Rolling Stones, honrado as conexões blueseiras de Peter.

 

 

Peter Gabriel – Plays Live, 1983 – Aqui está um dos grandes, enormes registros ao vivo de um artista em todos os tempos. Gravado na turnê americana de Gabriel, ele resume com generosidade a primeira parte de sua carreira solo – do pós- Genesis, passando pela lindeza de sua descoberta da world music e da consolidação do art rock. Clássicos como “Biko”, “Intruder”, “San Jacinto”, “Solsbury Hill” são executados por uma banda que ainda tinha monstros como Tony Levin – baixo, e Jerry Marotta – bateria. Sem este resumo, PG não seria capaz de alçar novos voos e ingressar num novo momento de sua trajetória com seu arrasa-quarteirão de 1986, “So”.

 

 

Nirvana – MTV Unplugged In New York, 1994 – Curioso que uma banda elétrica e explosiva na origem, como o Nirvana, tenha um de seus momentos mais importantes justo num álbum acústico e despojado. Este trabalho mostra, não só a versatilidade de Cobain e cia, mas como o trio poderia abraçar outros caminhos em sua trajetória, caso não tivesse a interrupção trágica que veio com a morte de Kurt pouco tempo depois do lançamento do disco. A versão que fizeram para “The Man Who Sold The World”, de David Bowie, apresentou o clássico para novas hordas de fãs e foi apropriada pela banda para sempre. Um clássico indiscutível.

 

 

Carole King – The Living Room Tour, 2005 – Carole King tem registros ao vivo que surgiram ao longo do tempo, especialmente focados em seu auge no início dos anos 1970, mas este aqui, feito já com a artista em paz com seu repertório e obra, é perfeito. A ideia era trazer Carole e sua banda num ambiente que reproduzisse sua sala de estar e, a partir deste clima de informalidade, permitisse que a artista fizesse performances intimistas. E o resultado é esse mesmo, com clássicos famosos na voz de outros (“Pleasant Valley Sunday”, “You Make Me Feel Like A Natural Woman”, “You’ve Got A Friend” ou “The Locomotion”) figurando ao lado de maravilhas pessoais e intransferíveis como “It’s Too Late”, “Snow Queen” e “So Far Away”. Uma lindeza sem par.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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