Garageiros e dançantes

 

 

Death From Above 1979 – Is 4 Lovers

Duração: 31 min.
Faixas: 10
Produção: Jesse F. Keeler e Sebastien Grainger
Gravadora: Universal

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Vários duos rock moderninhos vêm acusando o mesmo sinal: uma guinada mais ou menos intensa em direção a ritmos eletrônicos e um certo apelo dançante. Primeiro foram os Black Keys que buscaram uma pegada um pouco mais próxima do pop-rock estilizado, resultando num abraço a texturas sintéticas em “Let’s Rock”, ainda em 2019. Depois vieram os singles lançados pelos ingleses do Royal Blood, que anunciaram novo álbum para breve, devidamente voltados para uma abordagem mais sacolejante. E agora vem a dupla canadense DFA 1979, formada por Jesse Keeler e Sebastien Graigner, devidamente motivados por esta mistureba simpática de rock’n’roll garageiro básico devidamente aditivado por timbres eletrônicos e intenções dançantes. Este “Is 4 Lovers”, o quarto álbum dos sujeitos, é um abraço fraterno e caloroso a este universo. E funciona bem.

 

Sempre foi bacana prestar atenção nas soluções de timbres e execução que essas duplas garageiras/roqueiras desenvolveram ao longo do tempo para viabilizar seus discos. O uso de guitarra via baixo sintetizado, a bateria minimalista e básica e todos os filtros possíveis de voz e teclados, tudo é sempre interessante, ainda que o risco de repetir fórmulas seja sempre real e presente. O DFA 1979 era o mais raivoso desses duos em atividade na seara pop-rock até agora e este mergulho em algo mais pulante e dançante é bem legal, até porque a dupla não faz isso de uma forma óbvia. A têmpera é muito mais rock que eletrônica ou pop, soa mais como um investimento pesado de climas e atitudes mais dançantes, porém muito próximos do rock. É como se saísse dos fones de ouvido alguma coisa híbrida de new wave, garage rock e aquele pós-punk do início dos anos 00, desencadeado por Strokes e seus seguidores, só que mais pesado e insano.

 

Mas, uma coisa que é legal neste “Is 4 Lovers” é a surpresa. Esta regra de priorizar a abordagem roqueira ao longo das faixas tem exceções. A maior delas é, sem dúvida, “Glass Homes”, que tem um arranjo totalmente eletrônico, cheia de ruídos datados intencionalmente e que se transformam em adornos para o clima de festa que se instala ao longo da faixa. Outro momento incomum é a quase balada “Love Letter”, que tem andamento pianístico e uma pegada quase acústica, devidamente disfarçada por teclados e detalhes na produção. “Mean Streets” também seria assim, mas ela surge atacada ferozmente a meio caminho do fim por uma tempestade de turbilhonamento rock, que, logo em seguida, cede espaço para a levada original, numa brincadeira de gato e rato interessante. O resto do álbum apresenta variações de pancadarias dançantes e batedoras de cabeça.

 

A abertura com “Modern Guy” aponta guitarras sintetizadas que conduzem a bateria acústica e eletrônica devidamente transformada numa coisa só. A impressão é de que estamos diante de uma variação mais sanguinolenta do Muse inicial, o que é bom. “One + One” tem riff de bateria e percussão como alicerce, devidamente encorpado por guitarras e vocais numa onda meio obsessiva e perigosa. “Free Animal” é mais pancadaria eletrônica, altamente pulante e feita para ser apreciada em espaços abertos, enquanto as duas partes de “New York City Power Elite” brincam com as possibilidades de reeditar andamentos e climas de uma new wave oitentista aloprada e suarenta, devidamente trazida para hoje e adaptadas para a instrumentação minimalista da dupla. Funciona.

 

Esta liga malvadinha, eletrônica, guitarreira, noturna e dançante funciona e faz mexer até o mais letárgico dos seres. Se este é o novo padrão das duplas minimalistas, garageiras e barulhentas do rock em 2021, a gente gostou.

 

Ouça primeiro: “Glass Homes”, “Modern Guy”, “One + One”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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