The Weeknd chega ao melhor disco com “Dawn FM”

 

 


The Weeknd – Dawn FM

Gênero: Pop, eletrônico

Duração: 51:49 min
Faixas: 16
Produção: Abel Tesfaye
Gravadora: Republic

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

 

 

 

Vamos lá: este novo disco de The Weeknd é o primeiro grande álbum de 2022 e isto é ponto pacífico. Se ele fosse lançado em 2021, brigaria de igual pra igual com os melhores e mais parrudos lançamentos do ano passado mas Abel Tesfaye, o homem por trás do nome, decidiu jogar seu novo trabalho no colo de todo mundo já na abertura de 2022 e deve ter mandado um “vocês que lutem” entredentes. O fato é que “Dawn FM” é um colosso pop de primeira linha, um álbum que apresenta uma mui bem resolvida releitura/apropriação do funk pop de FM oitentista, na melhor escola de Michael Jackson e gente menos gigante, mas igualmente legal, como Debarge e Shalamar. Ou seja, o que Abel apresenta aqui é ouro puro, uma música que é praticamente infalível, dançante e, ao que parece, imortal. Ele tem a manha para embarcar nessa vertente sem medo de soar derivativo e isso faz com que suas canções soem totalmente pessoais, dentro desta universalidade que o som escolhido por ele prevê.

 

Muita gente conheceu The Weeknd recentemente e deve ter achado absolutamente natural a sonoridade de “Dawn FM” porque tem no hit “Blinding Lights” o seu parâmetro. Esta canção, lançada por ele no bom disco anterior, “After Hours”, é uma visita a esta mesma década de 1980, mas com uma onda diferente, mais próxima do que gente como A-Ha poderia fazer então. Ou seja, pra esses novos fãs, The Weeknd seria então um artista revisionista e cool, nada mais. Tal visão deixa de lado o passado inicial do homem, no qual habitam canções geladas, de natureza r&b mas totalmente desaceleradas e encharcadas de letras taradas e deprês. Alguns mais atentos poderão lembrar as colaborações que ele fez com o Daft Punk que, sim, apontavam já a verve pop oculta sob tristeza e dor. Com “Blinding Lights”, entre outras canções do disco anterior (como, por exemplo, “Save Your Tears” e “In Your Eyes”), vieram à tona toda a energia acumulada e a alegria de fazer música de um jeito mais aberto e pop. Deu no que deu e “Dawn FM” é a total coroação desta fase feliz e de bem com a vida.

 

É bem raro encontar um disco em 2022 que tenha 16 faixas e que todas, ou a maioria esmagadora delas, seja muito boa. “Dawn FM” é assim, flui fácil, tudo parece – como disse meu amigo Ricardo Schott – uma grande audição de coletâneas de pop funk, o que, entendo, é um grande elogio. Tudo é natural e esta suposta falta de surpresa é compensada por esta fluência pop da qual falamos acima, porque, além de tudo, Abel/The Weeknd é um baita compositor e sabe muito bem o que está fazendo. Uma faixa como “Out Of Time”, por exemplo, seria enorme nas paradas de 1984/85 sem qualquer dúvida, não só pela letra – de amor e cuidado – mas pelo arranjo sensacional. E o disco ainda tem algumas participações bem legais e inusitadas. Jim Carrey – ele mesmo – faz as vezes de um locutor de FM que entra em momentos específicos e manda muito bem. Quincy Jones, o arquiteto maior desta sonoridade lá na virada dos anos 1970/80, aparece com um trecho de conversa em “A Tale By Quincy”. E dois gigantes do rap atual estão presentes, Tyler, The Creator, mandando muito bem em “Here We Go…Again” – uma balada de fazer cosquinha nos corações mais experientes dessa vida – e Lil Wayne, que soma esforços na dinâmica e sensacional “I Heard You’re Married”, que poderia estar em “Bad”, de MJ, sem qualquer esforço.

 

Então, além de todos esses detalhes, conceitos e execuções muito bem feitas, ficam as canções que The Weeknd oferee ao público neste novo disco. Como dissemos, não tem encheção de linguiça ou tempo desperdiçado, tudo brilha e faz muito bonito. “Gasoline” é um pequeno primor aerodinâmico dançante, “How Do I MAke You Love Me?” é linda e poderia ser algo de um Jon Secada da vida, enquanto “Take My Breath” quase extrapola as possibilidades atuais do tal synthpop revisionista e adentra o imaginário coletivo dos anos 1980 com timbres que oscilam tanto como herdeiros de algo que fugiu de “Thriller” quanto de “Tron”, ou seja, um crossover dos diabos, no melhor dos sentidos. E tem “Sacrifice”, que também lembra “Thriller”, a canção, mas que também resgata algo de “Don’t Stop Til Get Enough”, do Michael Jackson sacrossanto de 1979, fase “Off The Wall”, que, a meu ver, é sua melhor encarnação.

 

Começar um ano com um colosso deste porte é um ótimo presságio mas o que desejo mesmo é que The Weeknd integre a mais alta divisão do pop planetário com este álbum e que ele seja uma espécie de porta-voz dessa sonoridade dourada por muitos e muitos anos. O sujeito sabe muito bem o que faz e como faz. “Dawn FM” é um clássico instantâneo e ponto final.

 

Ouça primeiro: todo o disco

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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