Sugar Ray – Little Yatchy
Gênero: Rock alternativo
Faixas: 11
Duração: 37 min
Produção: Grant Michaels
Gravadora: BMG
Lembra do Sugar Ray? Eu lembro. Num belo dia, ainda na redação da gloriosa Rock Press, chegou o primeiro disco dos caras, intitulado “Lemonade And Brownies”. O som era funk rock genérico, com aproximação em relação ao hip hop, ou seja, mais do mesmo para aquele distante 1996. O disco seguinte, “Floored”, do ano seguinte, seguia o mesmo modelo, mas com um hit planetário na manga: “Fly”, que tinha a participação do rapper Super Cat e um inequívoco apelo pop. O terceiro álbum, “14:59”, de 1999, colocou a banda californiana no primeiro time dos artistas “pop rock” daquele tempo, por causa de dois hits dourados: “Every Morning” e “Someday”, com um terceiro, “Even Though”, correndo por fora. Pronto, era o Sugar Ray formando sua identidade musical.
Algo deu errado, entretanto. A fórmula sonora dos caras era infalível, especialmente no terceiro disco, quando misturaram pop californiano ensolarado às levadas de funk de branco, tingidas por reggae e hip hop lights. Era como um Sublime – pra citar um contemporâneo – mais pop e eficiente em termos de groove. O líder da banda, Mark McGrath, ainda insistiu com dois bons discos, “Sugar Ray” (2001) e “In The Persuit Of Leisure” (2004), que, entretanto, tiveram menos sucesso e visibilidade que o anterior, levando a banda para a decadência. McGrath saiu do grupo e este encerrou atividades em algum ponto dos anos 2000, sem sentido e sem motivos para voltar à ativa. Mas, como já dizia o profeta Jorge Ben, o tempo é o senhor das demandas e o Sugar Ray viu uma brecha para existir em pleno 2019 como um grupo que faz revisão de pop rock setentista californiano, o tal “AOR”, adult oriented rock, também conhecido como yatch rock. E o novo disco, lançado há pouco chama-se…”Little Yatchy”.
McGrath está de volta e com um senso de propósito bem definido: reeditar a profusão de melodias solares que ele sabe compor como poucos, aliadas ao seu bom senso pop. Sendo assim, as guitarrinhas e violões espertos dominam os arranjos, com muita simplicidade e boa vontade. Este é um disco completamente pop, de bem com a vida e sacudindo a poeira dos ombros do ouvinte. Se você quiser estampar um sorrisão no rosto vincado pelas agruras do cotidiano pós-moderno de 2019, este é um passaporte para um mundo que há coquetéis coloridos na beira da piscina e pessoas de sarongue que te recebem com um “boas vindas, pegue um drink e bem vindo ao paraíso”.
Você pode escolher sua preferida por aqui. Tem “Highest Tree”, com seu refrão infeccioso, andamento quase reggae e ukulele no bolo sonoro bem azeitado. Tem “Coconut Bay” com vibe padrão Stella Barros turismo e foto com Pateta e Mickey na bagagem. Tem mais reggae de branco mas com um aceno inequívoco aos Beach Boys em “Good Good Lovin'”, com pureza de espírito e aplaudo ao por do sol sob as dunas do barato. O disco é cheio de perfeições pop tão doces e bem feitas que seja a cansar um pouco. Em algum ponto do fim do percurso musical há uma cover simpática de “Escape (Piña Colada Song)”, completando o cenário “tiozão de férias”.
“Little Yatchy” é um álbum anti-hype, cheio de camisas floridas e chapéus de palha, tudo de gosto bem duvidoso, mas totalmente solar e de papo pro ar na beira da praia. Não dá pra dizer “não” ou implicar com quem faz um disco desses. Lindeza sem contra-indicações.
Ouça primeiro: “Good Good Lovin'”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.