Sting: 70 anos, 13 canções e dois bônus

 

 

O tempo passa cada vez mais rápido e isso não é um achismo. Imagine, por exemplo, que o Sting está fazendo 70 anos hoje, dia 02 de outubro de 2021. Não sei vocês, mas sempre enxerguei a figura do baixista, guitarrista, cantor, compositor e ativista inglês Gordon Sumner como a de alguém vinculado, necessariamente, à juventude e inventividade. No caso da carreira solo de Sting, iniciada em 1985, quando ele tinha 34 anos, esta premissa se traduziu na ousadia de deixar de lado um grupo tão pródigo quanto o The Police e embarcar numa nova trajetória, muito mais vinculada à fusão do jazz com o pop/rock, sem abrir mão de um amor perene por ritmos como o reggae, por exemplo. O fato é que Sting conseguiu ser relevante artisticamente por um bom tempo, mas, em algum lugar dos anos 1990, foi perdendo o gume para misturar seu talento para fazer ótimas canções com uma relevância maior. Foi perdendo espaço, ainda que tenha feito muito sucesso com uma canção chamada “Desert Rose”, de seu álbum “Brand New Day”, de 1999.

 

 

Dali pra frente, Sting alternou projetos vinculados à música clássica, assinando álbuns voltados para o estilo e gravando musicais (“Pedro e o Lobo”, de Sergei Prokofiev) e peças próprias como “If On A Winter’s Night” e “The Last Ship”. Em meio a isso, ele registrou álbuns ao vivo com e sem orquestra, além de dois trabalhos mais voltados para o pop rock, caso de “57th & 9th” e o terrível “My Songs”, no qual abriu seu baú de ótimas canções – solo e com o Police – para arranjos péssimos “contemporâneos”, que transformaram suas criações em trilha sonora de festas de fim de ano de agência de publicidade. A exceção a esta lógica foi o excelente disco que gravou em parceria com o cantor jamaicano Shaggy, “44/876”, que é um álbum de reggae descomplicado, pop e cheio de pequenas maravilhas ensolaradas.

 

 

Por essas e outras, é surpreendente que Sting esteja de volta em 2021 com um novo disco, que será lançado ainda neste mês de outubro, com o nome de “The Bridge”. Os dois singles que ele soltou, “If It’s Love” e “Rushing Water”, estão entre as melhores canções que faz desde os anos 1990.

 

 

Sendo assim, fizemos a nossa já tradicional listinha de 13 canções para homenagear Sting, cujo show de 1987, no Maracanã, foi um dos primeiros de um artista internacional ao qual compareci. Temos um bônus no finzinho da lista porque ninguém é de ferro. Em tempo: a regra manda que só coloquemos obras da carreira solo do homem, ok? Portanto, nada de cavalos de batalha dos tempos do Police.

 

 

14 – If You Love Somebody Set Them Free (1985) – esta foi a canção que deu o pontapé inicial na carreira solo de Sting. Foi o single que puxou “The Dream Of The Blue Turtles”, seu primeiro disco desta fase, e tocou até não poder mais nas rádios da época. A letra é ótima, o arranjo é sensacional mas ela cansou ao longo do tempo. Ainda assim, é uma grande canção.

 

 

13 – Fields Of Gold (1993) – maravilha dramática e com acento folk clássico presente em “Ten Summoner’s Tales”, talvez o último álbum realmente interessante feito por Sting. Depois daí, exceto por uma canção inédita, registrada numa coletânea, no ano seguinte, sua pena não esteve em boa forma.

 

 

12 – Englishman In New York (1987) – uma das melhores gravações de Sting, com um arranjo belíssimo, interrompido por um fraseado de bateria altíssimo, que quase põe tudo a perder e que nunca compreendi o motivo de existir. Fora isso, é uma história cinematográfica, cantanda com sotaque e charme. Do ótimo terceiro disco, “Nothing Like The Sun”.

 

11 – Another Day (1986) – esta canção surgiu apenas com registro ao vivo, gravado em Roma, 1985, integrando o sensacional disco duplo “Bring On The Night”. Foi este trabalho que aprofundou o namoro com o jazz que Sting insinuara na estreia solo, “The Dream Of Blue Turtles”.

 

10 – Shape Of My Heart (1993) – outra belíssima canção de “Ten Summoner’s Tales”, que também fez parte da trilha sonora do excelente filme de Luc Besson, “O Profissional”. O arranjo é impressionante, mas a melodia é uma das mais belas que Sting já fez em toda sua vida.

 

 

09 – They Dance Alone (1987) – faixa presente em “Nothing Like The Sun”, em homenagem aos desaparecidos da ditadura chilena. É bom lembrar que, na época da gravação, o ditador pinochet ainda estava vivo e o país sul-americano ainda vivia sob seu governo. O arranjo é, novamente, impressionante e a letra fala de uma dança feita pelas mãe e avós dos mortos, sozinhas, mas como se estivessem com seus entes queridos.

 

 

08 – Russians (1985) – arrepiante faixa de “Blue Turtles”, com mais um arranjo impressionante. Há vários detalhes presentes, como, por exemplo, samples de diálogos das missões Apollo e Soyuz; o uso de trechos de uma melodia de Sergei Prokofiev, chamada “Lieutenant Kijé”, que servia como tema de abertura de noticiários soviéticos. Além disso tudo, a letra é um grito de angústia em meio à Guerra Fria, acirrada em meados daquela década de 1980.

 

 

07 – Why Should I Cry For You? (1991) – canção do belíssimo e subestimado álbum “The Soul Cages”, no qual Sting exorciza a perda recente do pai, lembrando que ele já perdera sua mãe nas gravações do álbum anterior, “Nothing Like The Sun”, quatro anos antes. É uma canção romântica, mas desiludida e triste. E linda.

 

 

06 – Moon Over Bourbon Street (1985) – outra faixa de “Blue Turtles”, dessa vez com inspiração no livro de Anne Rice, “Entrevista Com O Vampiro”. O arranjo evoca jazz clássico, mas tal definição não é totalmente precisa. O resultado é arrepiante e até hoje inigualado.

 

 

05 – When We Dance (1994) – uma das mais belas baladas que Sting já compôs e gravou. Ela surgiu como faixa inédita na coletânea “Fields Of Gold – The Best of Sting”, que comemorava sua primeira década de atividade como artista solo. É mais um exemplo de belezura total e bom gosto.

 

 

04 – Love Is The 7th Wave (1985) – a paixão de Sting pelo reggae é pública e notória e ele não poderia deixar o ritmo jamaicano de fora em seu primeiro álbum solo, “Blue Turtles”. A letra é otimista e o clipe trazia Sting como um professor, explicando para crianças em sala de aula, a importância do amor e de tudo mais. Detalhe: Sting recita os versos de “Every Breath You Take” no fim da canção, meio como se debochasse dela, uma vez que tratava-se de uma canção obsessiva, contrastando com a leveza absoluta de “7th Wave”.

 

 

03 – Consider Me Gone (1985) – mais uma faixa de “Blue Turtles”, dessa vez, inspirada em sonetos de Shakespeare, provando a erudição e a ilustração que Sting trazia para sua música na época. A levada é meio que um jazz-funk minimalista, que vai crescendo e que incorpora mais instrumentos à medida que chega em seu final. Maravilha.

 

 

02 – Be Still My Beating Heart (1987) – faixa meio obscura de “Nothing Like The Sun”, mas que é um verdadeiro milagre de estúdio. Arranjo, músicos, letra, melodia, tudo é tão complexo e belo que fica difícil até para descrever. A letra é um pedido, uma assunção de perda e vulnerabilidade diante de algo mais forte e poderoso. O resultado é raro e bem bonito.

 

 

01 – All This Time (1991) – minha gravação preferida de Sting é esta canção, que foi o single de “The Soul Cages” e que puxou o disco. É o relato histórico e pessoal da perda do pai, de como o mundo será sem ele e da falta de sentido em tantas coisas, de forma automática. Tudo isso numa melodia/arranjo pop perfeito, com ares que remetiam aos momentos mais animados do Police.

 

 

Bônus: Rushing Water (2021) – este segundo single do vindouro “The Bridge” consegue rever o melhor dos aspectos pop que Sting exibia até meados dos anos 1990 e misturá-los com esta sua característica erudição. A letra é ótima, o arranjo é direto e reto. E a letra tem versos como “This is the sound of atmospheres//Three metric tonnes of pressure//This is the sum of all my fears//Something I just can’t measure”.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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