Rock In Rio – Resumão 10 de setembro

 

 

Olhando no papel, este seria o equivalente a um “dia do pop” à moda antiga no Rock In Rio. Digo “à moda antiga” porque o “pop mais moderno” está presente no dia 11, com o encerramento do festival ao som da popstar inglesa Dua Lipa. Mesmo assim, as presenças de Coldplay, Camila Cabello, Bastille, além de CeeLo Green ofereceram uma variedade de apresentações capazes de agradar a todo e qualquer pessoa presente no Rock In Rio. Pensando bem, nem todas. O eventual espectador que tem um grau maior de exigência musical será capaz de notar que duas apresentações meio esquecidas nas listas de prognósticos dos melhores momentos, tornaram-se fortes candidatas aos melhores postos: Djavan, no Palco Mundo e Maria Rita, no Palco Sunset. Vamos ver o que aconteceu neste dia.

 

 

Duas bandas apadrinhadas por grandes nomes da música brasileira abriram os shows Sunset: Bala Desejo e Gilsons. A primeira tem nomes como Zé Ibarra e Dora Morelenbaum na formação e a segunda é formada por netos e filhos de Gilberto Gil. O som que apresentam é relativamente semelhante, ou seja, releituras modernas de influências mpbísticas setentistas, com força em Novas Baianos, Caetano Veloso e o próprio Gil. É ruim? Não, mas também ainda está bem longe de ser bom. Melhor esperar maturar e ver os próximos frutos que virão.

 

 

A subida de Maria Rita ao Palco Sunset iniciou os shows mais consistentes do dia. A filha de Elis Regina, hoje uma cantora de samba com muita relevância e força, mostrou como se faz uma apresentação incandescente, com uma bandaça de samba, repertório reunindo faixas do primeiro disco, como “Cara Valente”, de Marcelo Camelo, misturadas a versões furiosas de “O Bêbado E A Equlibrista”, passando por medleys em homenagem a Gilberto Gil e por vários sambas de sucesso como “É”, de Gonzaguinha e pot-pourris com canções de Clara Nunes, Arlindo Cruz, além de vários momentos politizados, Maria Rita não desafinou um instante sequer, mostrando que tem a melhor voz de sua geração. Com o público na mão e cheia de mensagens políticas explícitas, seu show arrebatou o Palco Sunset e se transformou na melhor apresentação do Rock In Rio por lá.

 

 

Se Maria Rita arrebatou o Palco Sunset, Djavan pegou o Palco Mundo pela mão e o levou para passear por um repertório infalível. Também com a plateia nas palmas das mãos, o cantor e compositor alagoano começou vacilante, mas pegou força e, à frente de uma bandaça de nível jazzístico internacional, desfilou clássicos como “Açaí”, “Samurai”, “Se”, “Flor de Lis”, “Oceano”, “Lilás”, sempre com uma postura afetuosa e interagindo muito com o público. Além de tudo isso, a cenografia de seu show foi a mais bela de todo o Rock In Rio, com destaque para as obras de arte que um telão de altíssima resolução apresentava em meio às músicas. De quebra, Djavan ainda cantou “Num Mundo de Paz” e “Iluminado”, faixas de seu ótimo álbum, “D”, lançado há cerca de um mês. Momento de rara beleza.

 

 

Os shows que vieram em seguida – Bastille no Palco Mundo e CeeLo Green no Palco Sunset – não foram tão interessantes assim. A banda inglesa é um sub-Imagine Dragons, ou seja, é bem fraca. Faz um dance pop aguado, subiu ao palco com uma postura conceitual sobre o futuro que já chegou e cantou um repertório chocho que só empolgou a fãs obliterados. CeeLo, por sua vez, é um baita vocalista e chamou pra si uma responsa danada: apresentar um tributo a James Brown, cantando vários clássicos de seu repertório. Tipo de coisa que só rola no Brasil, que tem um conhecimento aquém do resto do mundo em relação à majestade do Godfather Of Soul. Mesmo que tenha arregimentado uma banda legal e performática, CeeLo, que é ótimo frontman, não conseguiu empolgar. Cansou rápido demais, executou versões genéricas de clássicos como “Sex Machine”, “The Payback”, “Superbad” e “I Got You, recorrendo também a seus dois maiores sucessos solo – “Crazy” e “Fuck You”. O povo cantou e tal, mas já esqueceu de tudo. Poderia ser inesquecível, mas ficou muito aquém disso.

 

 

Preparando o público para o fim da noite, veio a cantora cubana Camila Cabello, que é legal e tem um disco recente bem interessante, chamado “Família”. O problema é que Camila é mais uma dessas cantoras que precisam se inserir num modelo de apresentação que impõe um formato esquizofrênico que contempla trocas múltiplas de vestuário, milhares de bailarinos de um lado para outro, luzes e efeitos especiais e, pra completar, música. No que ela é mais talentosa – a música – Camila apresentou um blá-blá-blá latino de qualidade duvidosa, recorrendo a elementos do funk carioca para ganhar a plateia, que aplaudiu as performances da moça dançando e cantando proibidões com a convidada MC Bianca. Apresentação que já deve ter sido totalmente esquecida até pelos fãs.

 

 

Depois de Camila veio a grande atração da noite, o Coachplay (nome dado ao grupo anteriormente conhecido como Coldplay). Como é possível supor, Chris Martin e seus parças oferecem um espetáculo multimídia, multiplataforma, com direito a todos os efeitos especiais que o dinheiro pode comprar. Tem marionete, clipes no telão, piso que brilha no ritmo da música, pulseiras eletrônicas e coloridas para os fãs que, extasiados, aplaudem como se estivessem diante de uma lenda, um mito, um semideus. E Martin e sua banda adoram isso, eles se divertem e sorvem com delícia essas demonstrações, oferecendo ao público aquele coquetel glitter com algumas faixas do tempo em que eram banda – “Yellow”, “The Scientist” – com a insuportável “Viva La Vida” coroando a metamorfose em startup do entretenimento global, coroando tudo com as faixas do péssimo álbum “Music Of The Spheres”, entre elas a imperdoável “Biutyful”, cantada por uma … marionete. Sendo a banda preferida de Luciano Huck, Angelica e Marcos Mion, fica fácil entender o que o Coachplay significa hoje para a música e o efeito que seu show causou nos presentes. Você faz o seu juízo.

 

 

Fotos: G1

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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