Sandy & Junior contra Bolsonaro

 

Em reportagem do dia 25 de agosto, o site RD1, do Portal Terra, relatou que a dupla Sandy & Junior não poupou falas de caráter político em seu show no Allianz Park, no último sábado, dia 24. Hoje, quatro dias depois da apresentação da dupla, outros sites, inclusive, alinhados à esquerda, começam a repercutir o acontecido.

Junior Lima disse: “Deixem a nossa Amazônia em paz” e foi acompanhado por um coro de 55 mil vozes, que endossaram sua fala. Mais tarde, ao cantar a música “Maria Chiquinha”, Júnior recusou-se a entoar o último verso, no qual a letra diz sobre “cortar a cabeça da Maria Chiquinha e ficar com o resto”. O músico disse que tal verso seria inadmissível hoje, e que “não estávamos mais nos anos 1990”. Novamente foi aplaudido.

E por quê estamos falando disso por aqui?

Porque já vimos várias manifestações políticas vindas de artistas e praticamente sua totalidade é alinhada com a esquerda. Longe de invalidá-las, pelo contrário, mas elas confirmam apenas um posicionamento ideológico prévio. Mas, quando vemos gente que não tem nenhuma tradição em falar de política, que, por afinidade, estaria muito mais próximo do conservadorismo, se manifestando contra um governo essencialmente conservador, acendemos o nosso sinal amarelo.

E o quê isso tem a ver?

Há poucos dias escrevemos um texto sobre (falta de) posicionamento de Neymar e Anitta, dois ídolos da juventude nacional atual. Sandy e Júnior já ocuparam este posto não faz muito tempo. Sua turnê vigente é uma celebração nostálgica para trintões da classe média nacional, que admiravam a dupla há vinte anos, pelo menos. É uma produção artística desprovida de qualquer viés político, calcada nas canções de amor e celebração. Também não há nada errado nisso, o pop é assim, porém, repito, a incorporação de um posicionamento político neste momento, longe de ser oportunismo, soa como um sintoma e um reflexo.

O atual governo, eleito em circunstâncias, no mínimo peculiares – alto número de abstenções, ausência do vencedor em debates, atentado com poucas provas e prisão do candidato com maior intenção de votos – recebeu o aval dos cidadãos descontentes com a corrupção e várias questões que orbitam a segurança e a economia. Até agora, oito meses depois, pouco ou nada foi feito, com o agravante de presenciarmos uma sucessão inesgotável de fatos constrangedores e inadmissíveis.

Sandy e Júnior, ricos, bem sucedidos, se incomodaram. E se manifestaram.

A história ensina: quando artistas não alinhados politicamente se expõem junto ao público com posturas questionadoras – ainda que em número pequeno – estão dando uma prova de que seu protesto ultrapassou guetos ideológicos e espalhou em setores sociais novos.

Agora é esperar e ver.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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