Peter Frampton enquanto é tempo

 

Peter Frampton – Forgets The Words

Gênero: Rock

Duração: 47:54
Faixas: 10
Produção: Peter Frampton, Chcuk Ainlay
Gravadora: Universal

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Peter Frampton está doente. Ele tem uma variação de miosite, inflamação muscular parecida com artrite e febre reumática, já tendo recebido o prognóstico de que terá os movimentos de pernas e braços afetados seriamente. Em suma: em breve Frampton vai parar de se apresentar e tocar, silenciando como artista, o que, além de trágico, é triste, visto que o homem é um dos bons guitarristas surgidos no blues rock inglês dos anos 1970 e, mais que isso, tornou-se um popstar com brilho intenso na segunda metade daquela década, após lançar seu álbum duplo ao vivo “Frampton Comes Alive”. O tempo, no entanto, se encarregou de devolvê-lo ao seu lugar, o de cantor e guitarrista virtuoso, mas próximo do que a gente entende por low profile. Agora, sob a pressão do tempo escorrendo pelas mãos, ele retorna ao disco com este “Frampton Forgets The Words”, um disco de covers instrumental, belo, direto e reto, que tem nas escolhas e na elegância das execuções os seus maiores trunfos.

 

Peter gravou o álbum em seu estúdio caseiro, em Nashville e deu asas à imaginação na hora de escolher as faixas que interpretaria. Em alguns momentos as opções vão longe do óbvio, seja nas próprias faixas, seja nos artistas. E o tratamento dado aos arranjos e execuções é bem polido, beirando o jazz rock ou o blues rock estilizado, algo que pode ser meio entediante, mas que, graças ao talento do homem e de sua banda, não acontece. E é bem divertido perceber como um cara vinculado ao passado clássico do rock pode ter visões mais arejadas e interessantes da música feita mais recentemente. Este é um detalhe que faz a diferença, porque seria fácil pinçar um monte de standards do blues e do rock e mandar ver. Frampton evita esse caminho fácil com gentileza.

 

Outro detalhe interessante: ele usa em estúdio a sua reaparecida guitarra Gibson 1954, que acreditava ter sido destruída num acidente aéreo em 1980. A julgar pelo som das seis cordas, ela nunca pareceu tão bem. Sendo assim, as escolhas que dão a dimensão pessoal ao projeto já surgem logo de cara, com a abertura de “If You Let Me Stay”, cavalo de batalha de Sly And Family Stone. A leitura de Peter é precisa, o arranjo não escapa muito do original e a graça é ver a guitarra expressiva do sujeito passear pelo funkão fundamental do grupo americano. Bonito também é o tratamento dado a “Reckoner”, do Radiohead fase “In Rainbows”, igualando o original de Thom Yorke e sua turma.

 

Quando vai para os artistas mais óbvios, Frampton também se sai bem em escolhas legais: “Isn’t It Pity” (George Harrison), “Loving The Alien” (David Bowie), “I Don’t Know Why” (Stevie Wonder) e, mesmo quando não vai em terrenos secretos de gente como Roxy Music (“Avalon”) e Lenny Kravitz (numa versão demolidora de “Are You Gonna Go My Way”), Frampton exibe o refinamento técnico na medida para não tornar o álbum um compêndio de guitarrismo vazio. Tudo o que está presente por aqui é elegante e sincero.

 

“Frampton Forgets The Words” pode ser um dos últimos discos de Peter. Se você é fã dele ou de uma boa dose de bom gosto e sentimento, este disco pode ser altamente recomendado.

 

Ouça primeiro: “Are You Gonna Go My Way”, “Loving The Alien”, “Avalon”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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