Onde está sua autocrítica agora?

Se não fosse pela ação de sergio moro, provavelmente o país não estaria como está hoje. Tal afirmação não é exagero, é mera constatação. É mera análise dos fatos, vendo causas e consequências. Não teríamos a contaminação política do Judiciário como ela ocorreu, ainda que a fala do ex-senador romero jucá ecoe pela eternidade: “com o Supremo, com tudo, num grande pacto nacional”. Mas tal aparelhamento da Justiça começou com a operação lava-jato, com moro e sua atuação junto aos inquéritos que mancharam a imagem do presidente Lula e da presidente Dilma. No fim das contas, todos estavam do mesmo lado: moro, cunha, jucá, ministros do STF, dallagnol, o powerpoint, os departamentos de jornalismo das grandes redes de TV…O antipetismo é o grande legado disso tudo, até porque, a corrupção segue firme no governo federal.

Mas moro é o grande elemento disso tudo. E isso é engraçado. Como será que é feita a escolha dessas pessoas? Um sujeito sem eira nem beira, ainda que jovem, mas que não consegue falar, que tem um timbre vocal péssimo, que fala errado, é levado ao patamar de herói do povo brasileiro. Também pudera: durante anos a lava jato foi tema de novela global, exibida em horário nobre, turbinado por propagandas canastronas que custam até um milhão de reais nos intervalos do jornal nacional. Ali, os apresentadores, os repórteres, editores, todos, cooperaram para sedimentar a imagem de moro como herói. Como paladino da justiça, como alguém que chegara para limpar o país da corrupção. Os programas televisivos foram responsáveis diretos por isso. Exibiram de forma sucessiva e os diálogos grampeados, as escutas feitas sem autorização da justiça, não se importando com qualquer constitucionalidade. E mais: chegaram a fazer um jogral com os diálogos de Lula e Dilma, colhidos de forma ilegal.

Quando veio a aviltante condução coercitiva de Lula, novamente a mídia estava presente e foi incapaz de suspeitar de sua legitimidade. Pelo contrário: glamurizou sua ocorrência, colocando o ex-presidente como um bandido que merecia ser tratado daquele jeito. Aliás, o pressuposto da inocência, presente na Constituição, não se aplicou a Lula ou a Dilma. Foram julgados culpados antes mesmo de moro. Formaram um time junto com o ex-juiz e os procuradores júniores da lava-jato, que aproveitaram a chance para tirar sua casquinha de fama, especialmente deltan dallagnol.

Lula foi condenado por um triplex que nunca teve. Por um sítio que nunca teve e por dar pedalinhos para seus netos. Foram processos com manobras mirabolantes, vícios, erros, falhas, tudo feito para colocá-lo na cadeia a qualquer custo. Aliás, Lula perdeu sua esposa, seu irmão e seu neto durante o período em que esteve preso de forma indevida. Qual a indenização que alguém pode pedir por isso? Não consigo pensar.

Sem Lula preso, como seriam as eleições de 2018? Eu duvido que o atual ocupante da presidência fosse eleito caso o ex-presidente viesse para a disputa.

O fato é que moro foi declarado suspeito pela segunda turma do STF ontem, por um placar de 3 x 2. Com ele, são declarados suspeitos (i.e culpados) todos os que o adotaram como herói. Sem exceção. Todos os que viram nele a chance de exercer seu preconceito político e de classe. Todos os que se voltaram contra governos que ajudaram o país e proporcionaram um raro momento de prosperidade para quem nunca os teve. Cada foto nas redes sociais, cada editorial de jornalão da grande mídia, cada ação safada que visou a desinformação das pessoas e que contribuíram para a difamação de um dos maiores presidentes que o país já teve, deveriam ser alvo de profunda autocrítica. Do mesmo nível das autocríticas que esta mesma mídia cobra do PT por conta de fazer alianças com políticos que, quando estão juntos sob a forma de Centrão ou outro termo, são aliviados totalmente de qualquer pressão jornalística.

Sim, porque quem cerrou fileira com moro, seja quem for, contribuiu para atirar o Brasil no pântano que está hoje. Contribuiu com a injustiça, com a safadeza, jogou a favor do que a sociedade brasileira tem de pior. Foi peão. Uma mera foto de avatar em rede social já bastava. Sem falar no constrangimento eterno de participar de coisas como o “morobloco”, usar camisetas “in moro we trust” e endossar um boneco gigantesco do ex-juiz vestido de Super Homem.

E os roqueiros brasileiros? Muitos se esbaldaram com a figura do moro, aplaudiram o ex-juiz em shows, puxaram até salva de palmas quando ele estava presente…. Que vexame, hein?

E o que dizer da série “o mecanismo”, de josé padilha? Que endeusava um personagem similar ao ex-juiz, expondo toda uma rede de corrupção que o julgamento do STF de ontem mostrou ser totalmente viciada e irreal? Que vergonha, gente. Imagina quem deu dinheiro para isso…

E não adianta dizer que não sabia, que se enganou ou algo do gênero.

Não foi por falta de aviso. Você fez isso porque gostou. Porque quis. Curtiu. Chamou o ex-presidente de “nove dedos”, como os procuradores fizeram. Vi jornalista da área de cultura fazendo isso. Que vergonha.

Onde está sua autocrítica agora?

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.