O inofensivo Red Hot Chili Peppers

 

 

Red Hot Chili Peppers – Unlimited Love

Gênero: Rock alternativo

Duração: 73:15 min
Faixas: 17
Produção: Rick Rubin
Gravadora: Warner

3 out of 5 stars (3 / 5)

 

 

Pergunta sincera: quem estaria interessado em 17 faixas, totalizando mais de 73 minutos de Red Hot Chili Peppers? Exatamente, os fãs da banda e só eles. Difícil imaginar que quem jamais se interessou pelos discos do grupo, agora, finalmente, terá comichões se não ouvir o novo trabalho. Por outro lado, os admiradores de Kiedis, Flea, Smith e, de volta, Frusciante, vão dar cambalhotas pelas ruas, soltando rojões e jurando amizade eterna uns para os outros, uma vez que este “Unlimited Love” é um álbum duplo, longo, cheio de tempo e espaço para que todas as facetas do quarteto californiano sejam exploradas. Com a formação clássica de volta e, ainda por cima, Rick Rubin na produção, repete-se o line up que deu vida a “BloodSugarSexMagic”, o álbum mais importante da carreira do grupo. E também o que gerou “Californication”, espécie de marco zero do som que o RHCP passou a fazer de 1999 para cá. Na verdade, não do som, mas da atitude. Sai de cena uma banda intensa e endiabrada e toma o seu lugar uma versão pálida e inofensiva de músicos talentosos e só.

 

“Unlimited Love” é um disco que dá continuidade a este modelo mais acomodado. E quando a gente reclama dele, aponta o quão tedioso ele pode ser, na verdade, estamos ainda lembrando que o RHCP já foi capaz de fazer muito mais em disco e em show. A novidade foi abandonada em favor da reprodução deste modelo e, mesmo em discos que não eram tão fieis ao modelo sonoro – como o anterior, “The Getaway” – o que ficou foi a impressão de um grupo fazendo menos do que pode. Neste novíssimo álbum, a impressão é a mesma. Há canções que deixam aparecer traços endiabrados, mas eles são raros e pálidos. O baixista Flea e, principalmente, o baterista, Chad Smith, novamente são os responsáveis pelos momentos de interesse no feixe de dezessete canções. Frusciante, que é saudado com um dos melhores guitarristas da história galáctica do rock, segundo os fãs mais exacerbados, parece meio eclipsado pela exuberância da cozinha. Aliás, Smith e Flea são uma das mais – talvez a mais – poderosa cozinha do rock mundial há tempos e dá raiva vê-los subaproveitados em um roteiro longo que compreeende várias canções que soam desnecessárias.

 

Alguns fãs mais inflamados disseram que os Chili Peppers “experimentaram, lançaram apenas o que tinham vontade, desafiaram a indústria” quando se referem às canções deste álbum. Nada disso fica evidente nas audições, pelo contrário. É, sim, um trabalho em que a banda pode dar vazão para seus lados baladeiro, dramático, até careta, além de sua produção habitual, aqueles funk rocks angulosos, pontuados pelo baixão de Flea e pela bateria de Smith. O modelo já desgastou há tempos, mas ainda rende caldo, especialmente quando o grupo acerta próximo do alvo, caso de “Aquatic Mouth Dance”, a melhor faixa dentre todas registradas aqui. Também tem alguns outros momentos bacanas, caso de “Poster Child”, que, apesar de autorreferente demais da conta, tem bom groove e arranjo bacanudo. “She’s A Lover” é outro ótimo momento, novamente com Flea pulsando suas quatro cordas em meio a uma levada próxima da disco music, só que um pouco mais de peso. Frusciante, assim como em “Aquatic…” aparece fazendo bons chacunduns e wah-wahs, mas num papel meio acessório.

 

O problema maior aqui é a quantidade enorme de canções autorreferentes e que só fazem mostrar como a banda já foi mais forte e poderosa. “Here Ever After” é o primeiro caso, pegando carona no modelo de funk pesado, que encanta tanta gente. Novamente Flea salva o resultado, mas os vocais, as guitarras, o andamento, tudo aponta para algo que já foi mais interessante no passado. “It’s Only Natural” vai na caixinha de “baladinha psicodélica” e dá acenos e piscadelas para canções como “Soul To Squeeze”, lá de 1993. “Whatcu Thinking” vai naquela onda de “funk doidinho” do grupo, que os fãs amam e que vão usar para mostrar como Frusciante ainda dá caldo. Não passa de autochupinhagem. “White Braids & Pillow Chair” é mais um exemplo, esta sendo tributária da palidez sonora de “Californication”, o disco e a canção. “Veronica”, apesar de ter um pouco mais de sangue nas veias, também vai neste modelito. Por fim, “Tangelo” é uma balada lenta, contemplativa e … desnecessária.

 

Não dá pra dizer que o RHCP é uma banda chata ou desinteressante. Mas dá pra cravar que a opção estética que fizeram num passado de médio prazo, já causa ônus há tempos. “Unlimited Love” é longo demais, autorreferente demais e mostra um grupo completamente despreocupado em trazer sua sonoridade para o presente. Se tentou isso em “The Getaway”, chamando Danger Mouse para produzir, com alguns resultados interessantes, que mostravam desejo de contemporaneidade, este novo trabalho os arremessa de volta para 1999, para a delícia do fã mais conservador.

 

Ouça primeiro: “She’s a Lover”, “Aquatic Mouth Dance”, “The Heavy Wing”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

6 thoughts on “O inofensivo Red Hot Chili Peppers

  • 3 de abril de 2022 em 22:51
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    Resenha certeira! Achei um disco bem morno, longo demais e sem inspiração. E infelizmente vai ter gente da mídia colocando como o grande disco de rock nesse ano como se fosse há 20 anos atrás.

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  • 2 de abril de 2022 em 00:03
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    Resenha no alvo. Getaway é melhor do que esse álbum, pelo simples motivo de ter vontade. Esse é um disco cansado, como se o RHCP simplesmente tivesse decidido viver na sua própria sombra. É triste, porque é uma das melhores formações dos últimos 30 anos. Mas não tem alma aí. Infelizmente

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  • 1 de abril de 2022 em 19:20
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    Hahahaha, o fã é capaz de dizer tudo, meu caro. Obrigado pelo comentário, o último disco interessante do RHCP foi lá em 1995. São quase 30 anos sem produzir nada interessante,

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    • 1 de abril de 2022 em 21:24
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      Pois aqui jaz um fã de longa data capaz de dizer: o disco é uma autocelebração apática e completamente esquecível. Nem acho que o maior problema seja a repetição de uma fórmula radiofônica, desde que fosse uma repetição boa ou convincente. E infelizmente, não é. As três grandes fragilidades, na minha opinião: 1) A atitude e o lirismo (!!!) de Anthony Kiedis envelheceram muito, muito mal; 2) Se um disco duplo já era um exagero em 2006, no superestimado Stadium Arcadium, que dirá na atual fase da banda com esse tipo de material; 3) O impacto do regresso de Frusciante foi assustadoramente nulo aqui, ao contrário do que ocorreu em Mother’s Milk e em Californication, que gostando ou não, reescreveu a carreira da banda a partir do apelo melódico do guitarrista. Sobre Flea-Chad, a impressão que fica é que ambos fazem um exercício tresloucado no disco inteiro tentando em vão tapar os buracos que aparecem na audição: “Virtuose” em excesso, inspiração de menos. Mas nada disso surpreende: novidade seria um disco relevante de RHCP em 2022.

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    • 2 de abril de 2022 em 00:05
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      Interessante tem bem depois de 95. Bom de verdade, só o Californication. O resto tem momentos maravilhosos, mas outros embaraçosos, como Dani California

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  • 1 de abril de 2022 em 14:24
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    Extamente!!!!, conheci a banda através da revista BIZZ, os peppers apareceram em uma coluna da revista chamada porão se não me engano, como sou do Interior, mas a minha cidade faz fronteira com a Argentina, tinha uma loja lá na cidade dos hermanos que a gente conseguia esses discos que ainda não eram lançados aqui no Brasil, pois bem comprei o ” Freak styley “, acho que eu era o unico que curtia o Peppers aqui na cidade, o tempos passou e eles estouraram com o ” Blood…”, dai em diante larguei, pior e que a banda foi adotada pelos pseudoroquistas, pior escutar nas conversas que os Peppers foram os inventores do Funk, juro que escutei essa conversa!!!!!

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