DJ Hum – Alquimia

 

Gênero: Funk, hip hop, jazz

Duração: 33 min.
Faixas: 10
Produção: DJ Hum
Gravadora: Humbatuque

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

 

Ao apagar das luzes, aos 45 do segundo tempo, no finalzinho do ano, surge o bom e velho Humberto Martins Arruda, mais conhecido como DJ Hum, com seu novo álbum. “Alquimia” é o nome da criança musical, a décima-quinta da carreira do homem, misturando aí sua parceria essencial com o rapper Thaíde, que nos deu tantas maravilhas ao longo do tempo. Pois aqui, agora, o DJ Hum nos brinda com um trabalho totalmente instrumental, voltado para a revisita de suas influências como músico e integrante da gloriosa cena black da música nacional. Herdeiro das sonoridades do fim dos anos 1970 e da totalidade dos anos 1980, Hum é o cara indicado para este passeio, mas ele vai além e inclui samba jazz, bossa nova e outros temperos inesperados neste disco que foi composto e gravado em meio à pandemia da covid-19. É um feixe afetivo de canções, algo verdadeiramente admirável.

 

O mais bacana em “Alquimia” – nome perfeito para a proposta do álbum – é, justamente, esta diversidade de estilos, mas, não só isso. A percepção de que a música black brasileira deve tudo ao original americano é algo valioso e que às vezes fica de lado em nome de um purismo estético que é vazio de sentido. Por isso, assumir a influência gringa é um ato de coragem e fidelidade artística. E “Alquimia” tem dois momentos iluminados em que o amor pela música americana é exaltado, justo na abertura, com uma versão emocionante de “All Night Long”, sucesso interestelar das Mary Jane Girls, sampleado e resampleado ao longo do tempo, que vem numa versão instrumental e meio jazzística, possivelmente uma das coisas mais legais lançadas no Brasil em 2020. Sobre ela, o próprio DJ fala:

 

“Cresci ouvindo essa música nos bailinhos da quebrada e nas grandes festas das equipes de som. Agora, em 2020, fui convidado pra produzir uma versão instrumental. Confesso que foi um desafio. Regravar um clássico é de muita responsabilidade. Principalmente, executar todos os instrumentos, mixar e deixar moderno, mas, ao mesmo tempo, com uma cara vintage”.

 

E o fecho, que traz “Big Payback”, a homenagem ao maior de todos, James Brown, que ressurge aqui numa colagem de batidas, samples e loops, tudo muito bem feito e manipulado pelo DJ. Mas não é só isso. “Alquimia” não tem uma única faixa ruim. Após a abertura sensacional, é a vez de “Corra Pelo Certo”, que é uma canção em downtempo, que não deixa nada a dever à produção noventista de gente como Zero 7 e outros congêneres. Em seguida, “Lu e as Estrelas”, que tem duas versões: lo-fi e boom bap mix. A ideia surgiu quando o artista conversava com sua esposa. “Ela apontou pra cima e disse: Será que foi de lá que viemos?

 

“O Ciclo”, que foi primeira música criada para o projeto, traz a influência de “A Tribe Called Quest”. É um daqueles crossovers de jazz e Hip Hop, com o uso de sampler, filtros, instrumentos orgânicos e solo com sintetizador. “Laís e Manu” é um samba jazz feito para homenagear as duas filhas do DJ Hum. “Gosto de bossa nova, venho do berço do samba rock e dos bailes black. Não poderia faltar uma produção no estilo”. Esse som foi composto em parceria com o trompetista Reginaldo 16, do Funk Como Le Gusta.

 

“Recomeçar” inspira-se em “Summer Madness” (Kool & The Gang) e é a viagem jazzy do disco. “Tem piano Fender Rhodes, beat inspirado no grande J Dilla, melodia com infusão de sintetizadores espaciais na parte do solo. É um começo para despertar o novo e incentivar a superação de novos desafios”. “Funk das Antigas” é pra quem curtiu os balanços dos anos 80s, época dos bailinhos da quebrada. A produção vem no estilo boom bap.

 

“Alquimia” é um discaço. Dá gosto de ouvir e reouvir a simplicidade, a sinceridade e o resultado belíssimo que ele traz. É o trabalho definitivo do DJ Hum solo, um atestado de amor à música negra. Bravo.

 

Ouça primeiro: tudo.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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