O coronel que raptava infâncias: o Brasil que não deveria existir.

 

 

O Brasil não é para principiantes, sabemos.

 

Notícias absurdas colocam nossa serenidade à prova todo santo dia.

 

Mas sem informação não dá para nos colocarmos como seres pensantes do mundo e do país em que vivemos. Então seguimos, tentando entender como uma sociedade consegue se construir a partir de bases tão frágeis e revoltantes.

 

Esses são só alguns dos pensamentos dos quais não dá para fugir quando lemos “O coronel que raptava infâncias”, o primeiro livro do escritor e jornalista Matheus de Moura, lançado pela Editora Intrínseca em 2021.

 

Como ser diferente, diante do Rio de Janeiro da população mais pobre, que mora nas regiões aonde o poder público não chega, seja por omissão ou impossibilidade?

 

Um cenário perfeito para a ação de criminosos como o coronel reformado da PM Pedro Chavarry Duarte, preso em 2016 em um estacionamento do Bob’s com uma criança de dois anos de idade dopada em um carro de luxo.

 

Liberado, três anos depois ele se entregou em uma Delegacia na Tijuca, dizendo agir para provar aos seus perseguidores ser inocente de qualquer acusação capaz de macular um honesto passado profissional e pessoal.

 

Na verdade, desde os anos 80 sua trajetória remonta a ações criminosas, incluindo a presença do seu nome na folha de pagamento do bicheiro Castor de Andrade.

 

Como todo falso Messias, Chavarry viveu anos valendo-se de sua posição de homem de bem, um filantropo que manteria uma creche para ajudar crianças moradoras dos bairros mais pobres da cidade.

 

Entretanto, longe dos olhos das famílias desesperadas por ajuda e perto demais dos próprios privilégios, Pedro usava dinheiro público para alugar casas e os carros que serviam de lugar para os crimes medonhos que cometia contra  as crianças.

 

Uma creche sem nome, sem endereço.

 

Sem verdade e nem cuidado.

 

Anos de horror construídos pela certeza da impunidade e a falta de seriedade com que a exploração e o abuso infantil eram encarados, ainda que o ECA, o Estatuto da Criança do Adolescente já tivesse sido criado em 1990.

 

Matheus traça com muito cuidado um panorama geográfico e social do Rio de Janeiro, que informa e contextualiza mais um dos muitos casos envolvendo quem deveria proteger a população. E mais importante, dá voz às histórias das famílias vítimas de Pedro sem violentá-las novamente.

 

Não é um livro fácil, talvez você pare sua leitura durante alguns momentos, eu mesma fiz isso várias vezes, mas se o Brasil é um país difícil, manter viva as memórias de seus piores momentos para que eles não se repitam não seria diferente.

 

Contudo, é necessário.

 

Matheus de Moura é mais um de nossos escritores a nos ajudar nessa tarefa.

Debora Consíglio

Beatlemaniaca, viciada em canetas Stabillo e post-it é professora pra viver e escreve pra não enlouquecer. Desde pequena movida a livros,filmes e música,devota fiel da palavras. Se antes tinha vergonha das próprias ideias hoje não se limita,se espalha, se expressa.

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