Não deixe de ver “Power” na Netflix
Apesar do título deste texto parecer com um slogan de isotônico ou algo assim, é, na verdade, uma recomendação sobre o novo filme na Netflix. Estreou há poucos dias “Power”, o longa dos diretores Ariel Schulman e Henry Joost, estrelado por Jamie Foxx, Joseph Gordon-Levitt e a adorável Dominique Fishback. Rodrigo Santoro também participa do filme e não faz feio. Já aviso de cara que trata-se de um eficiente cinema-pipoca-streaming, com roteiro na medida para fazer o espectador se interessar por detalhes, subtramas, atuações entre o razoável e a canastrice e, de quebra, se apaixonar por Robin, a menina que trafica uma droga poderosíssima nas ruas de Nova Orleans para ajudar a comprar remédios para a mãe diabética.
Não espere nada além disso. “Power” não tem pretensão alguma de fazer pensar ou despertar algo na audiência. A ideia é servir como um equivalente fílmico de um passeio na montanha-russa radical da vez. Para isso há uma torrente de efeitos especiais e doses de familiaridade na trama que cativarão os fãs do gênero tiro-porrada-bomba-alienação. A idéia é bem simples: uma nova droga está nas ruas. É uma pílula que concede superpoderes ao usuário, mas apenas por cinco minutos. E não há garantias nesta oferta, pois o sujeito pode, literalmente, explodir, caso não tenha compatibilidade. Mas, se a onda bate certo, é possível ficar à prova de balas, controlar a temperatura, camuflar a ponto de ser quase invisível, correr mais rápido que um trem e por aí vai. É como se fosse um X-Men com chip pré-pago ou algo assim.
Ainda que pareça mirabolante, o filme não tem problemas com esta ideia e tudo funciona a contento. Tem explosões, planos enlouquecidos das câmeras, cores incomuns na palheta visual, trilha sonora com raps supermodernos e atuações de Foxx e Gordon-Levitt no piloto automático. Como são bons atores, fazem o esperado e ponto final. A grande maravilha é, de fato, Dominique Fishback, que parece uma Whoopi Goldberg adolescente, cheia de presença de espírito, não necessariamente engraçada, mas espontânea daquelas que dá vontade de abraçar quando acaba o filme. Sua Robin tem a profundidade exata de uma representanta da geração digital ultra-moderna num mundo caótico no qual os adultos parecem saber menos que você.
Há um viés quadrinhesco na trama de “Power”, que mostra a preocupação dos personagens com Nova Orleans, onde se passam as ações. Devastada pelo furacão Katrina, a “Crescent City” é um brinco de ouro de diversidade musical e cultural, mas aparece como uma cidade qualquer do sul dos Estados Unidos – corrupta, suja, racista e às voltas com a degradação do espaço urbano. Como se não bastasse, o fato de ser alvo de uma trama governamental que envolve um teste de laboratório a céu aberto com uma droga poderosíssima, enfurece os personagens de Gordon-Levitt – um policial – e Foxx – um ex-militar com vínculos obscuros. Só Robin é o que aparenta ser: uma menina se virando para sobreviver no submundo da desigualdade.
“Power” é legal na medida certa. Não acena com possibilidades picaretas de continuação, diverte e aliena. Não falo da droga, mas do filme. Veja e curta sem compromissos maiores.
“Power” (2020)
Estados Unidos – 113 min.
DIREÇÃO:Ariel Schulman, Henry Joost
ROTEIRO:Mattson Tomlin
ELENCO:Joseph Gordon-Levitt, Jamie Foxx, Dominique Fishback
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.