Mortos pela covid 19 nas redes sociais

 

 

As estatísticas do noticiário não deixam dúvida: os brasileiros estão morrendo ao milhar por conta da covid 19, todo dia. A média de óbitos se estabilizou neste patamar há cerca de quinze, vinte dias, e não parece dar sinais de que vai retroceder. Ontem foram quase 1300 pessoas que perderam a vida. E na política é o que já nos acostumamos tristemente a ver: autoridades batendo cabeça com os programas de vacinação; discussões patéticas sobre eficácia chinesa, russa, inglesa; memes usando “bumbum tantan e “Butantã”, ou seja, uma panacéia de atitudes que têm uma única consequência: a lentidão na imunização do povo em relação à doença. E ainda temos que testemunhar o ocupante da presidência numa nítida postura de desencorajamento da vacinação. Sempre que ele surge na mídia e é perguntado sobre o assunto, sua resposta traz nitidamente a mensagem de que isso não vale a pena.

 

Ele é o único governante que é contra a vacinação de seu povo. Mesmo com as mortes se amontoando nas nossas portas, sua atitude é a de esvaziar eficácia médica e psicológica de um programa de vacinação. Imagine como seria bom se o presidente surgisse na mídia com constância encorajando a espera pela vacina, a sua importância, enfim, imagine só como seria bom. Mas o texto não é sobre este sujeito. É sobre como essas mortes já fazem parte do nosso cotidiano, seja pela mídia, seja pela nossa vivência diária. Veja, por exemplo, as redes sociais.

 

Todo dia eu vejo pessoas na minha timeline do Facebook lamento a morte de parentes ou pessoas queridas por conta da doença. Há tempos via as pessoas se perguntando quando a covid 19 iria chegar em seus cotidianos. Agora, poucos meses depois, todos se lamentam, sem qualquer força, sobre o quanto a doença levou este ou aquele ente querido. E, via de regra, são pessoas de meia idade, com vida ativa, que não são portadores de alguma moléstia grave. É gente como a gente que está morrendo. E sem parar. Sem que haja algo a fazer.

 

A gente sabe o roteiro do isolamento social e como ele foi rompido há tempos. As pessoas, simplesmente, deixaram de cumprir as regras de distanciamento. Acharam, incentivadas pela postura do presidente, que isso tudo é uma grande frescura, que é excesso de cuidado ou qualquer outra estupidez. E deixaram de lado. Os empresários pressionaram o governo que eles elegeram e, voilá, tudo voltou ao normal. Gente em shoppings, bares, restaurantes, mercados, entregues à sorte de seus próprios cuidados contra o contágio. Mas tudo isso é como o trânsito: não adianta você dirigir bem e ter cuidados, se uma carreta desgovernada te atingir, a morte é certa. Assim é a covid 19 e as pessoas que não dão importância para os cuidados, carretas vindo em sua direção.

 

A julgar pela mortalidade nos perfis do Facebook – uma estatística muito relevante – as pessoas vão para o hospital e, via de regra, evoluem para quadros que vão resultar em infecções de todos os tipos, algo contra o qual é quase impossível lutar. E morrem. Gente jovem, gente ativa, não idosos ou desenganados. Claro, muitos se recuperam, relatam tempos horríveis na convalescença, mas, posso dizer, o número de mortos é muito alto e me chama muito a atenção. Diariamente há relatos de alguém lamentando a partida de um ente querido.

 

Eu nunca havia testemunhado o desmerecimento de uma vacina. Ela é o único jeito de voltarmos à normalidade. Estou cansado de mortes. Elas não são normais, vivemos num país que naturalizou essa perda diária de mais de mil pessoas por esta doença. Isso é revoltante, bizarro e inacreditável.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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