Matt Berninger – Serpentine Prison

 

 

Gênero: Alternativo

Duração: 41 min.
Faixas: 10
Produção: Booker T Jones
Gravadora: Concord

3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)

 

Este disco solo do vocalista de Matt Berning, vocalista do The National, passa duas impressões logo de cara: é um álbum difícil e é um trabalho que não tem diferença substancial em relação ao que ele faz com o grupo. Ambas estão corretíssimas e significam muito mais méritos do que falhas na execução de “Serpentine Prision”. De fato não dá pra pensar em nada com sua assinatura que não signifique um passeio pelas sombras da existência, pelo lado mais chuvoso e cinzento do ser. E nestes termos, “Serpentine” tem predicados vastos, um disco que mescla uma tradição sombria do pop americano, que tem em Scott Walker um expoente máximo e que, ao mesmo tempo, soa totalmente consonante em relação a estes tempos. Não por coincidência, ao lado de um time de mais de dez colaboradores contemporâneos, quem pilota o álbum é o lendário Booker T. Jones, que também participa com seus teclados e órgãos de algumas faixas, confundindo as medições temporais do ouvinte mais atento. De qualquer forma, este é um mergulho controlado no lado mais fundo da piscina. Quem estiver a fim, que venha.

 

Berninger começou o ano lançando algumas covers interessantes. Ele soltou versões para “Inbetween Days”, do The Cure, e “Holes”, do Mercury Rev, ambas também produzidas por Booker T e com a pegada original dos trabalhos mais recentes do The National, especialmente o álbum de 2017, “Sleep Well Beast”. O tom sombrio e triste é definidor do ambiente em que o disco existe, sendo praticamente impossível apreciá-lo sem levar isso em conta. Não adiana começar a ouvir as dez faixas presentes aqui sem saber – e querer – o que vem, que é, nada mais, nada menos, que um desfile de baladas lentas, em câmera lenta, em que os vocais de Matt passam pelas melodias e arranjos com dor e sofreguidão. Ele não oferece nada além, nada menos. A música é muito bem produzida, bela, bem executada e abrangente. Quer dizer, é uma tristeza/contemplação que envolve o ouvinte sem cerimônia.

 

Mesmo em meio a esses pântanos de contemplação cinzenta, Matt não cobra mais do que atenção do ouvinte. As dez faixas são diretas e retas, ainda que durem na casa dos cinco minutos em sua maioria. Os arranjos são introspectivos, noturnos, com muitas guitarras e pianos fazendo climas e nuances. Quando ele acerta no alvo, se sai com belas canções de amor e dor, caso específico de “One More Second”, que tem um andamento mais próximo da balada declamada, com uma belíssima participação de Booker T. no órgão, fazendo um contraponto doce em relação à voz grave de Matt. Outro lindo momento é “Take Me Out Of Town”, que fala de depressão e isolamento voluntário, em meio a um ritmo de valsa, pontuada por metais e belos vocais de apoio. Em “Collar of your Shirt”, novamente o arranjo de Booker T se impõe, com uma apoteose de pianos e teclados, em meio a cordas e guitarras, que emolduram o canto triste de Matt.

 

Talvez o momento máximo de “Serpentine Prison” venha na colaboração com a baixista Gale Ann Dorsey, que tocava com David Bowie. “Silver Springs” é uma faixa misteriosa, com clima noir, que tem os vocais de Gale, em meio a uma levada que tangencia o jazz e cheira a espelunca decadente no fim da madrugada. Na verdade, a letra fala de outras questões, especialmente da esperança que move os jovens artistas a saírem de suas cidades e rumarem para os grandes centros, em busca de mais chances. Interessante que o tema poderia estar numa canção dos anos 1960, mas tem contemporaneidade suficiente para sobreviver neste disco.

 

“Serpentine Prison” é denso, lento, que oferece um clima específico para quem se aventura por suas faixas. O percurso não é retilíneo ou simples, exige do caminhante mas o recompensa plenamente.

 

Ouça primeiro: “Silver Springs”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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