Haddad x manhattan conection

 

 

Uma das maiores ironias da mídia hegemônica brasileira atual é a presença do manhattan conection na grade da … Tv Cultura. Um programa que tem a marca do privatismo, do neoliberalismo, da propaganda ideológica mais subserviente e rasa, é transmitido, desde o ano passado, por uma … TV estatal. É engraçado, convenhamos, mas talvez seja mais uma daquelas instâncias em que fica provado que o Brasil não é para amadores. O fato é que, depois de décadas na esfera de emissoras do grupo globo, o manhattan não mudou seu jeito de “fazer jornalismo” quando migrou para a esfera estatal. Ele segue mostrando paisagens e atrações em Nova York, colocando nas telas o quão sensacional pode ser a Big Apple. E lá estão 2/3 da bancada do programa, lucas mendes e caio blinder. O outro terço está na Itália, diogo mainardi.

 

Ontem, dia 10 de fevereiro, além destes senhores, o programa recebeu o ex-manhattan Nelson Motta, a economista Natalie Vital e o ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que foi saudado logo na abertura, como sendo um dos poucos – ou o único – petista a comparecer. E não tardou para que mendes iniciasse a pauta sobre o derretimento da lava jato. Haddad respondeu com serenidade, como é de seu estilo, com falas duras sobre a relevância de moro e sua eventual capacidade de articular frases, competência intelectual e demais quesitos de análise. Mais que isso: disse que, se estivéssemos nos Estados Unidos – uma alusão ao culto que o programa presta ao país? – moro estaria em Guantánamo, a prisão americana na base militar que mantém em Cuba. Haddad estava se referindo à pergunta: “o que fazer para combater a corrupção?”, com uma linha de raciocínio coerente e que ele já manifestou antes, a de fortalecer as instituições, dar condições para que elas tenham isenção e possibilidade de cumprir suas funções sem vícios ou influências. Coerente.

 

Até que veio a pergunta de mainardi, sobre quem seria o candidato do PT em 2022, se ele, Haddad, ou Lula. Mas tal indagação não foi feita com polidez, pelo contrário. mainardi se referiu ao ex-ministro da educação, como “poste de ladrão” e mencionou que “Lula sempre será um ladrão, recebedor de 40 milhões da folha de propina da Odebrecht e que ficaria com a ficha suja para sempre”, com evidente beligerância. Haddad não se alterou, disse que mainardi sempre foi uma “pessoa problemática, inclusive psicologicamente” e respondeu sobre a impossibilidade de se provar delitos eventuais uma vez que todos os processos vigentes estão sob a desconfiança geral, a partir da descoberta dos diálogos entre moro e a acusação. Como seria possível, a partir da evidente associação política do juiz e do procurador, com efeitos práticos e notáveis, dizer que tais julgamentos foram justos? mainardi sabe exatamente o sentido desta fala, tanto que se exasperou e, diante da argumentação de Haddad, disse para que “ele deixasse de ser imbecil” . Como cereja do bolo, após o clima péssimo, mendes chamou Nelson Motta, talvez com a intenção de dar um pouco de ar ao programa, perguntando sobre a presença de Haddad no estúdio. Motta disse que votou no ex-prefeito em 2018 e votaria em 2022, mas sem convicção, porque o PT cometeu tantos erros, mas tantos erros, que ele se desencantou com o partido.

 

Enquanto eu assistia ao primeiro bloco do programa – é o máximo que eu consigo, com a presença de um entrevistado interessante/importante – me dei conta da escolha que o brasileiro fez em 2018. Aquele homem sereno, com fala acessível, ainda que rebuscada e consistente, poderia ser nosso presidente. Fiz até o exercício de desvincular Haddad da ideologia que ele representa, a esquerda moderada. Pensei em como seria o Brasil apenas com a presença de uma pessoa com capacidade de articulação, evidente cuidado com o semelhante, noções de civilidade e alguns outros itens básicos do kit mínimo de cidadania. O atual ocupante da presidência não lê, não tem curiosidade, não tem habilidade, não tem educação…E logo em seguida me dei conta: talvez ele seja mais apropriado ao que o brasileiro médio é. E não Haddad.

 

Enfim…

O manhattan conection seguiu e eu não vi mais nada. O programa, pelo visto, com cenários bem menos elegantes do que em outros tempos, é uma triste reunião de homens brancos e velhos, que ficam enaltecendo um modo de vida excludente e que premia apenas os privilegiados. Só num país como o Brasil estes senhores – todos morando no exterior – são pagos para criticar e emitir opiniões … sobre o Brasil.

 

E segue.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

2 thoughts on “Haddad x manhattan conection

  • 11 de fevereiro de 2021 em 22:43
    Permalink

    Pois é, é um “traço de estilo” grafar esses nomes em minúsculas. E seguimos em frente. Abraço e obrigado!

    Resposta
  • 11 de fevereiro de 2021 em 19:43
    Permalink

    CEL, acho que alguns dos nomes citados aí por você não merecem nem mesmo a inicial minúscula, de tão baixos que são. Salve Haddad: um bom ser humano, uma pessoa digna e sempre competente naquilo que fez em sua história política.

    Resposta

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *