Foo Fighters lida com perdas em disco pouco criativo

 

 

 

 

 

Foo Fighters – But Here We Are
48′, 10 faixas
(Roswell/RCA)

3 out of 5 stars (3 / 5)

 

 

 

 

 

Aqui está o Foo Fighters enlutado por conta de duas perdas sérias para o grupo: o baterista Taylor Hawkins, em 2022 e a mãe de Dave Grohl, Virginia, neste ano. Ambas afetaram significativamente a dinâmica da banda, que ensaiava uma fase arejada ao lançar – sob o nome “Dee Gees” – um punhado de canções – covers e originais – que faziam menção à Disco Music e, antes disso, “Medicine At Midnight”, em 2021, um álbum cheio de boas tentativas de modificar arranjos e imprimir uma expansão sonora na combalida palheta musical que caracteriza o Foo há impressionantes 28 anos. Agora, com este “But Here We Are”, o grupo procura dar seu atestado de vida após as perdas mencionadas acima e, bem, dar andamento à sua carreira. Infelizmente, todo o movimento em busca de novos ares foi para o proverbial beleléu e a banda, agora um quinteto, volta para seu mundo de guitarras distorcidas ma non troppo, vocais rasgados e a manutenção de sua linha de montagem para os estádios da vida.

 

 

Antes de adentar a análise das novas canções, convém mencionar uma história. Quando eu trabalhava no mundo corporativo há uns vinte anos, tive um superior que, não importava o motivo, estava sempre com a mesma cara. A gente brincava que a fisionomia do sujeito seria igual diante de um tsunami ou depois de receber um telefonema dizendo que ganhou sozinho na MegaSena. Lembrei dele ao ouvir este novo trabalho do Foo porque as canções, os arranjos, a pegada, tudo é muito próximo do que a banda sempre fez. De um jeito que chega a suscitar a pergunta: Grohl e cia são profissionais a ponto de sublimarem esses lutos totalmente ou são pessoas que, simplesmente, não conseguem – ou não querem – fazer algo diferente. Se não fosse por algumas letras, este feixe de canções do Foo caberia em qualquer álbum, em qualquer época, com uma única exceção: “The Teacher”, feita para a mãe do vocalista e guitarrista, com dez minutos de duração que mais parecem três faixas menores encadeadas, num resultado que está longe do termo “épico”, que alguns veículos usam como referência a ela.

 

 

Grohl assumiu as funções de baterista no estúdio, anunciando há pouco tempo a adição de Josh Freese para as apresentações ao vivo. Greg Kurstin, produtor dos últimos trabalhos, divide as funções com a banda e, bem, temos o que os fãs poderiam esperar. Doze “clássicas” faixas do Foo Fighters, prontas para figurar ao lado de “Times Like These”, “Big Me” e outros cavalos de batalha. Na verdade, há, sim, pequenos lampejos de novidade em alguns momentos, mas eles se perdem no todo uniformizante. Por exemplo, “Show Me How” é uma canção que tem menos pressa de chegar ao fim, menos gritaria e um bom uso de guitarras em diferentes sonoridades, com a participação da filha de Grohl, Violet, nos vocais de apoio, com um bom resultado. “Hearing Voices” também é um bom caso de arranjo levemente modificado, quase reproduzindo uma parte da linha melódica de “11 O’Clock Tick Tock”, do U2, investindo na criação de uma aura oitentista, mas com os vocais de Grohl ultrapassando os limites em favor do modelão vigente. “Nothing At All” é o outro caso de esticamento nos parâmetros melódicos da banda, com mais pegada oitentista, dessa vez lembrando um pouco do arranjo de “Talking In Your Sleep”, dos Romantics. Mas fica por aí.

 

 

As faixas mais próximas do sentimento de perda não têm meio termo. “Rest”, que encerra o disco, tem um arranjo que oscila entre o soporífero (em sua parte violão e voz, que quase torna impossível receber a mensagem de saudade e resignação sem adormecer) e o intenso, com a explosão de guitarras e aumento das vozes, que a transformam numa canção forte, porém, monótona. “Rescued” e “Under You”, que, juntas compõem os dois lados da moeda melódica do Foo, são, respectivamente, mais próximas do rock alternativo americano noventista e de um pós-grunge sob controle, algo que Grohl, um dos participantes diretos do estilo de Seattle, jamais abraçou completamente. No meio de tudo, a já mencionada “The Teacher”, sem saber para onde ir, nem como chegou até ali.

 

 

“But Here We Are” não parece um disco de luto. Teria esse mesmo contexto se falasse sobre a pandemia ou a guerra na Ucrânia. É uma dor difusa, transformada em superação, dando a impressão de que essa gente que está cantando não é capaz de ser afetada ou mesmo modificada por perdas tão intensas. É apenas o Foo Fighters, lançando mais um de seus discos. O resto é com você, que vai ouvir.

 

 

Ouça primeiro: “Nothing At All”, “Show Me How” e “Hearing Voices”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

3 thoughts on “Foo Fighters lida com perdas em disco pouco criativo

  • 5 de junho de 2023 em 12:04
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    Na minha modestíssima opinião só os dois primeiros álbuns da banda são bons, são superestimados talvez porque o Dave foi baterista do Nirvana e ter a fama de ser boa praça!!!

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  • 2 de junho de 2023 em 21:43
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    “Eu não gosto dessa banda e também não gostei muito do seu novo álbum”. Ás vezes, as coisas podem ser ditas com a máxima simplicidade, mas o crítico musical, em geral, precisa embalar o seu gosto em uma montanha de argumentos pretensamente objetivos ou bem estruturados, justificando, assim, suas opções e afinidades sem admitir, contudo, que sua apreciação é mero gosto e subjetividade.

    Senão, como entender a cabeça do crítico, ao elaborar argumentos contraditórios para esconder que, no fundo, tudo diz respeito ao seu gosto pessoal, que nada tem de objetivo e sofisticado? Senão, como articular as seguintes ideias, que constantemente aparecem em textos da crítica especializada:

    – Para um álbum novo do Coldplay, alguns argumentam que a banda não é mais a mesma do início, deixou o melhor da sua sonoridade pra trás, assimilou novas sonoridades, deixou a sua música menos simples, acrescentou teclados viajantes e, por isso… se tornou uma banda pior, menos cativante, menos relevante, já não tem muito a dizer…

    – Para o Foo Fighters, vale o contrário: a banda não é criativa, sua sonoridade é a mesma de sempre desde o primeiro álbum, já não arrisca, só tem lampejos de novidades, fica sempre na mesma, só seu penúltimo álbum se destaca, pois fez algo diferente… Bem, será que esse argumento também vale, guardadas as devidas proporções, a bandas como Motorhead, Ramones, AC DC, que são elogiadas e respeitadas justamente por encontrarem uma identidade sonora e nunca mais produzirem uma linha sequer diferente dessa sonoridade, depurando o seu som e fazendo, de modo cada vez melhor, a mesma coisa, sempre? Nunca vi ninguém criticar essas bandas por falta de “lampejos de criatividade”.

    E assim se multiplicam os exemplos: será que o Rush pode ser criticado por, em sua longa discografia, terem constantemente assimilado novos elementos musicais e apresentarem, a cada década, algo diferente em sua identidade sonora? Led Zeppelin foi uma boa banda por que expandiu e explorou novos elementos e tornou-se uma banda muito além do blues e hardcore dos inícios? Ou isso é algo que depõe contra a banda?

    Como entender a cabeça do crítico? “Não parece um disco de luto”, pois sua melancolia é muito difusa, poderia valer pra qualquer coisa? Sério? E se fosse um disco como “Magic and loss” do Lou Reed, seria melancólico e deprimente demais? E Joy Division ou The Cure, são tristes demais, ou de menos?

    Ao fim das contas, concordo com a última frase: é mais um disco da banda – o resto é com você que vai ouvir. Sim, e a ironia é exatamente essa: as coisas poderiam ser ditas assim, de modo simples e direto, em 2 linhas – mas como justificar, então, todo o trabalho jornalístico de resenhar um produto cultural, manter uma página, um site… fazer cobertura dos shows, das carreiras artísticas, lançamentos… Talvez daqui uns 2 ou 3 anos, quando a mesma banda lançar algo novo, os argumentos também não sejam os mesmos de sempre, tenham mais criatividade e inteligência e sejam menos preguiçosos. Ou apenas atinjam direto o ponto: “continuo não gostando de nada dessa banda”!

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    • 3 de junho de 2023 em 00:31
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      Meu caro, que comentário enorme, obrigado pela atenção. Bem, se estamos falando de argumentos, aqui vai um: as bandas são diferentes. Para umas, vale elogiar a manutenção de uma identidade sonora ao longo do tempo. Para outras, vale criticar a falta de criatividade em nunca ousar, em abusar da mesmice. São múltiplos casos, carreiras diferentes, passados e presentes diferentes.

      Sobre o crítico, bem, eu posso falar por mim. Tenho bastante tempo de ofício, basta procurar por aí. Antes de escrever profissionalmente, eu já tinha bastante tempo de audição dedicada à música. Estudei sobre o assunto, li publicações especializadas, fui a shows que paguei do próprio bolso, enfim, sou um pesquisador musical dedicado e com uma trajetória que fala pelo que escrevo. Você pode, na qualidade de leitor, reduzir o texto sobre sua banda preferida às partes que te interessam, é seu direito e, vá lá, sua posição. Mas, se você acha que todo mundo está escrevendo contra o que você pensa, sugiro começar a expressar sua opinião num blog, num perfil de rede social e, a partir daí, iniciar a sua própria trajetória. Boa sorte.

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