Em Casa com Os Gil – Veredito

 

 

Está disponível no catálogo da Amazon Prime Video a série “Em Casa Com Os Gil”. Trata-se de um reality show sobre uma reunião da família de Gilberto Gil ocorrida ano passado, para planejar a turnê que está em andamento neste exato instante, “Nós, a Gente”. Com quinze datas em vários países da Europa, a família está viajando em peso, seguindo uma ideia que Preta Gil teve e comunicou ao pai, que concordou – cantar todo mundo junto, por aí. Como a oportunidade era boa demais para desperdiçar, a Conspiração Filmes foi recrutada para documentar esta viagem pela Europa, mas a pandemia do covid-19 adiou os planos por um ano. Por isso, a série começa em junho de 2021, às vésperas do aniversário de Gil, com JH se reunindo em sua casa de campo em Araras, região serrana do Rio, para escolher repertório e iniciar alguns ensaios.

 

Com os oito filhos presentes, vários netos e a bisneta Sol de Maria, a família protagoniza uma reunião que, se por um lado, oferece uma chance de vermos a dinâmica e a interação entre seus membros, também preserva a intimidade maior do clã Gil. Sim, porque, como a reunião que motiva a série é específica para escolha de repertório e planejamento de uma turnê com um grupo tão grande e díspar de pessoas, os eventuais “barracos” e “tretas” ficam em segundo plano, para a felicidade do espectador. Sim, porque, como a gente costuma dizer dos relacionamentos, intimidade demais pode atrapalhar. no caso dos Gil, algumas conversas mais acaloradas respondem por este lado, mas são minoria esmagadora. O que mais vemos ao longo dos cinco episódios é música e conversas sobre música, com alguns detalhes interessantes que são perceptíveis. Se, por um lado, tal caminho pode dar a impressão de que todo e qualquer membro da família Gil já nasce artista, por outro, mostra que, não, isso não é verdade. Há gente ali, como as filhas Marília e Maria, do primeiro e segundo casamento de Gil, respectivamente, que não atuam diretamente com música, mas que são produtoras e lidam com o meio.

 

É bacana notar os detalhes. Os netos de Gil são muito diferentes. Se há o pequeno Sereno Gil, filho de Bem Gil e Ana Paula Lomelino, a Mãeana, temos João Gil, já adulto, filho de Nara, a filha mais velha. Temos as novíssimas Roma e Pina Gil, bebês de colo, filhas de José Gil e Mariá Pinkusfeld e temos Flor Gil, filha de Bela Gil e JP Demasi. Enfim, temos um universo de criaturas-Gil andando de um lado para o outro, desfrutando sinceramente o clima familiar. As filhas mais conhecidas, Preta e Bela, surgem naturalmente com um pouco mais de destaque, cada uma a seu jeito, o que dá uma dinâmica a mais. Flora, a matriarca, mostra sua presença na organização e administração de tudo, desde a carreira de Gil ao próprio encontro da família em si.

 

E temos Gil, o próprio Gil. Ele surge como um sábio quase-buda, vivendo um pouco aqui, um pouco em uma dimensão própria, na qual o violão, as canções e o afeto pelos seus são evidentes e dominantes. Filmado em várias situações interessantes, Gil aparece dançando, discutindo sobre futebol, poesia e votando o repertório que a família vai escolhendo. A série faz uma homenagem discreta e sincera a Pedro Gil, filho que morreu em 1990 num acidente automobilístico, com a escolha da canção “Feliz Por Um Triz”, do álbum “Raça Humana”, de 1984. Pedro aparece tocando a canção com a banda de Gil no palco do Rock In Rio I. Falando nisso, a escolha do repertório gerou um álbum musical homônimo, que traz várias interpretações familiares para clássicos como ” Cores vivas” (1981), “Drão” (1982), “Esotérico” (1976), “Feliz por um triz” (1984), “Palco” (1980), “Queremos saber” (1976), “Realce” (1979), “Sereno” (parceria com Bem Gil, de 2018) e “Sítio do Pica-pau amarelo” (1977).

 

 

 

 

A turnê da família Gil pela Europa também está sendo filmada e vai gerar uma segunda temporada, que já tem o título de “Viajando com os Gil”. Neste ano de Gilberto Gil completando oitenta primaveras, toda e qualquer homenagem a ele é válida. Como disse Chris Fuscaldo, curadora do museu Gil Em Movimento, do Google Arts And Science”, “Gil é o Brasil que queremos”.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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