E o “Alta Fidelidade” da Zöe Kravitz?

 

 

Sim, você já deve saber que há uma série baseada no aclamado romance “Alta Fidelidade”, do escritor inglês Nick Hornby, certo? Se sabe, deve também ter conhecimento que a atriz americana Zoe Kravitz está produzindo e estrelando os episódios, no papel do protagonista original, Rob. Vi o primeiro episódio ontem, via PopCorn – site de downloads de séries e filmes – e vou dar um pequeno veredito sobre o que achei. Pequeno porque já está disponível a primeira temporada e só vou dizer o que é possível afirmar a partir da leitura do romance, de ter visto o filme com John Cusack no papel principal e apenas um episódio da série.

 

Bem, é possível dizer de cara que a série é melhor que o longa. E pelos motivos errados, diga-se de passagem. Eu ainda sonho com uma versão fiel ao original, no qual Rob seja um cidadão inglês, dono daquele humor próprio, irônico, incorreto. E que ele seja um cara com a experiência de ter vivido num país diferente, com uma relação diferente com os discos e a música pop em geral. As duas versões de “Alta Fidelidade”, a de Cusack e a de Kravitz, transcorrem nos Estados Unidos. A primeira em Chicago, a segunda – e atual – em Nova York. E, bem, por mais que seja interessantezinho, é diferente do original, que carrega seu charme na “britanicidade” da coisa. Mas, bem, chega de reclamar.

 

A versão atual é legal. Zoe tem carisma, charme e talento para ser a protagonista da coisa. Seu rosto é misterioso, insondável e mal-humorado na medida certa. Ela tem o ônus e o bônus de viver e entender a vida sob o ponto de vista da música pop e da cultura pop em geral. As listas de melhores e piores estão presentes, já de cara vemos ela fazer uma relação das cinco maiores decepções amorosas que viveu. E isso é legal pra fazer a conexão com o original, que foi responsável pela mania das listas e tops numéricos para todo tipo de situação. Há quem goste, há quem ache um saco, há quem não ligue. A Rob interpretada por Zoe é sincera, bissexual, atormentada, entristecida, típica representante de sua geração.

 

Sua loja é na periferia de Manhattan, só vende vinis e tem dois vendedores: Simon, um amigo gay, e Cherise, uma espalhafatosa e sensacional personagem. O primeiro episódio já fala sobre a importância de “Rumours” na carreira do Fleetwood Mac, menciona grupos obscuros gregos, cutuca os clientes hipsters, menciona Darondo, Zappa, Weezer (os garotos daquela idade adoravam ouvir Weezer – pensa uma Rob de 12 anos, bem precoce) e introduz Cameron, o irmão de Rob. E a mostra num encontro com um cara legal – Clyde – a quem ela cogita deixar sozinho no bar, mas precisa voltar porque esqueceu o celular na mesa. Acontece. E tem um momento especial, no qual Rob detona um ex-namorado, referindo-se a ele como “o tipo de idiota que gosta de Jay-Z, Dave Matthews Band, Eminem e acha que eles são os maiores artistas vivos”. Sim, é o meu tipo de série.

 

A edição e a direção de arte têm algo de “O Balconista”, uma agilidade interessante e uma cara de filme jovem, mas não bobo. À primeira vista – repito, verei os outros episódios e atualizarei este texto tão logo termine – é uma boa pedida. Tem alguma coisa de “Fleabag” também, uma vez que Rob vai usar sua feminilidade como um veículo condutor de sua visão de vida e perspectivas diante de seu mundo. E isso faz muita diferença.

 

Estamos acompanhando – e gostando. Vamos ver se o nível permanece.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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