Conheça Young Guv, o sucessor do Teenage Fanclub

 

Young Guv – GUV III

Gênero: Rock alternativo, powerpop

Duração: 34:28 min
Faixas: 11
Produção: Ben Cook
Gravadora: Run For Cover

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

 

 

Se você acha que o título deste texto é exagero, te convido a ler até o fim. Sim, porque Young Guv, o projeto pessoal do multi-instrumentista canadense Ben Cook é exatamente isso – a mais bem acabada e talentosa empreitada de um músico/grupo no território do powerpop desde o revival que o gênero experimentou nos anos 1990, devidamente capitaneado pelos escoceses do Teenage Fanclub. Ainda que o TFC siga ativo e lançando bons álbuns, é fato que a banda já não tem a mesma pegada de outrora, levando sua sonoridade para passeios estilísticos aqui e ali. Cook, ao contrário, é um cara que escreve, produz e canta como se estivesse dentro das sessões de álbuns como “Songs From Nothern Britain” ou “Grand Prix”, dois dos maiores acertos dos escoceses. Quando ouvi os dois primeiros álbuns do Young Guv, lançados com intervalo de três meses em 2019, não acreditei em tamanha belezura. Resultado: os discos “GUV I e II”, foram parar – como um álbum único – na segunda colocação dos melhores trabalhos daquele ano, perdendo apenas para “Dogrel”, a ótima estreia dos irlandeses Fontaines DC. Pois bem, e se eu disser que “GUV III” soa como um aperfeiçoamento do que Cook fez em 2019? E se eu arrematar dizendo que, a exemplo do que aconteceu há três anos, já há um outro álbum prontinho e com data de lançamento mais ou menos cravada para o segundo semestre de 2022? Se você é fã do TFC, precisa, desesperadamente, ouvir e conhecer Young Guv.

 

Precisa porque, eu acredito piamente, o mundo é um lugar melhor com canções como as que o Teenage e Guv fazem. São pequenos filhotes de labrador musicais, alegres, fofos mas meio desajeitados, tropeçando por aí e se enrolando na hora de declarar amor pela pessoa amada ou, simplesmente, encarar a vida. Porque ela, a vida, é bem complicada e exige muito de nós. O contraste entre guitarras mais pesadinhas e o dulçor da melodia e das harmonias sempre foi uma espécie de Santo Graal sonoro para fãs que não se sentiam totalmente confortáveis batendo cabeça o tempo todo ou não queriam dar muita bandeira se emocionando com baladas melosas do rádio. Desse jeito, obras como a de Young Guv reúnem o melhor desses dois mundos, do peso e da melodia, com uma balança que pende mais para um dos lados, de acordo com a ocasião. E o bacana no que Guv faz é que ele não tenta emular os pais da matéria, Beatles, Big Star, Raspeberries ou Badfinger. Ele é um cara que mira os anos 1990 e aquele revival que nós, velhuscos de hoje, assistimos e participamos. O efeito na memória afetiva é certeiro.

 

Nada disso adiantaria se não houvesse boas canções, certo? Porque elas são o combustível essencial de tudo, especialmente quando se trata de powerpop. Cook tem um talento anormal para compor ótimas canções, tudo com um esmero que dá até nervoso. Todos os refrões do álbum são bem colocados, perfeitamente encaixados nas melodias, que adornam letras de amor ganho, amor perdido, desencontro, desajuste e tudo mais que rodeia a vida cotidiana das pessoas de umas duas ou três gerações. Se você quiser, pode percorrer as onze faixas do álbum – que totalizam 34 minutos e meio – atrás de alguma imperfeição na estrutura-arranjo-composição, mas será uma procura em vão, que, no fim de tudo, só servirá para confirmar o talento que Ben Cook tem a seu favor. “GUV III” foi composto e gravado na estrada, experimentando o confinamento social no peito e na raça, enquanto Cook e sua banda precisaram abortar uma turnê e acabaram encalhados no Novo México. Lá os dois álbuns – lembrem-se que haverá um “GUV IV” até o fim do ano – foram compostos, com gravações ocorrendo posteriormente com Cook manejando todos os instrumentos e produzindo tudo.

 

Indicar uma canção aqui é chover no molhado. Além de belas e joiadas, elas funcionam lindamente em bloco, como se o ouvinte estivesse fazendo um tratamento. De qualquer maneira, a abertura com “Couldn’t Leave U If I Tried” tem a missão de colocar o ouvinte nos termos do álbum. As guitarras harmoniosas, as vozes dobradas e a montanha russa suave da melodia dão a certeza de que estamos em 1997. Ou em 1969, dependendo de seu referencial. Daí em diante, as três faixas seguintes – “It’s Only Dancing”, “Lo Lo Lonely” (esta com guitarras mamúticas no melhor estilo early TFC) e “Only Wanna See U Tonight” conseguem encapsular a trindade de sentimentos primordiais do jovem adulto urbano médio – solidão, alienação, amor – de forma natural e inevitável. Ainda tem belezuras e lindezas até o fim do álbum, em detalhes como na bateria linear de “Good Time”, na introdução à la Monkees de “She Don’t Cry For Anyone” ou na fofura tristonha de “April Of My Life”, cheia de doçura no arranjo e letra que faz inventário pessoal como se fosse 1972.

 

Young Guv/Ben Cook é um talento inevitável e está em ascensão. Os fãs de powerpop do planeta já estão descobrindo suas façanhas e se perguntando como chegaram até aqui sem saber de sua existência. Não seja um desses retardatários e navegue nas águas plácidas dessas canções. Estamos precisados.

Ouça primeiro – o álbum todo.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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