Chris Cornell – No One Sings Like You Anymore

 

 

Gênero: Rock alternativo

Duração: 36 min
Faixas: 10
Produção: Brendan O’Brien
Gravadora: Universal

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

A morte de Christopher John Boyle em 18 de maio de 2017 é um evento que, confesso, tenho dificuldade em aceitar. Não só pelo fato de Chris Cornell ter sido um dos grandes, enormes cantores do rock, mas porque era, de fato, uma alma atormentada, que merecia destino melhor. Seja à frente do Soundgarden ou do Audioslave, seja em carreira solo, ele deixou sua marca na música e hoje, sem mais aviso, chega às plataformas de streaming suas últimas dez gravações realizadas e acabadas em estúdio, com o nome de “No One Sings Like You Anymore”. São dez covers, escolhidas pelo próprio Cornell, finalizadas em 2016 e que só chegaram à luz do dia por conta de decisão de sua esposa, Vicky Cornell, que detem os direitos sobre sua obra. O que ouvimos nestas dez canções é um painel amplo que vai além do rock mais óbvio e que mostra o quanto Chris tinha um olhar generoso sobre o pop também, algo que ele já demonstrou no passado, seja no controverso álbum “Scream” (2009), seja em versões como a de “Billie Jean”, de Michael Jackson, gravada em 2007, para seu disco “Carry On”.

 

Tudo que se ouve no álbum é produto da interação entre Chris e Brendan O’Brien. Os dois tocam todos os instrumentos e O’Brien produz, ele que é um tarimbadíssimo piloto de estúdios, especialmente para gente como Pearl Jam e Bruce Springsteen. O resultado é, claro, como em todo álbum dessa natureza, irregular. O que unifica a proposta e as faixas é, justamente, a tristeza pela partida tão prematura de Cornell em plena forma, como se pode ouvir em vários registros ao longo do álbum. As versões não têm obrigação com suas gravações originais e Cornell se espalha nos terrenos do pop mais comercial sem muita cerimônia, mas com o cuidado de não soar superficial. O que temos é um monte de intervenções eletrônicas de percussão, sintetizadores sempre que possível, mas há muitas guitarras, teclados, baixo e bateria “humanos”, que conferem aquela mistureba humana/máquina que funciona bem quando bem pilotada – o que é o caso aqui.

 

O repertório – diverso e bacana – também ajuda. As notas divulgadas hoje dizem que estas canções significavam muito para Cornell e essas covers eram uma maneira dele prestar tributo e agredecer por sua influência. Grandes momentos surgem logo de cara, com “Get It While You Can”, que ficou famosa pela versão que recebeu de Janis Joplin, que a registrou em seu disco – igualmente póstumo – “Pearl”, de 1971. A versão que Cornell faz de “Jump Into The Fire”, pérola roqueira encrustrada em “Nilsson Schmilsson”, álbum gravado pelo sensacional Harry Nilsson, também em 1971, é fiel ao original, mas se permite acrescentar modernidade com bom senso na gravação, preservando o clima de festa original. E há surpresas: “You Don’t Know Nothing About Love”, balada soul dilacerada, registrada por Carl Hall, ganha novos vôos com o registro impressionante de Chris. Assim também é com “Showdown”, clássico da Electric Light Orchestra dos idos de 1973, que ressurge toda moderninha e brejeira.

 

Claro, há o ataque ao óbvio. Tem versão para “Patience”, do Guns’n’Roses, tecnicamente melhor que o registro original, mas destinada a sempre soar como uma homenagem ao grupo de Axl e seus amigos. Tem “Nothing Compares 2U”, que pulveriza a conhecida versão de Sinéad O’Connor para o original de Prince, que também será sempre inferior. E tem “Watching The Wheels”, clássica canção de John Lennon fase “Double Fantasy”, com roupagem moderníssima, teclados e percussões, que é bem legal. Fechando os trabalhos, uma versão arrepiante de “Stay With Me”, clássico que Bette Midler interpreta no sensacional filme “The Rose”.

 

Este álbum de covers é um tributo muito digno que Chris prestou aos seus ídolos, mas também é um belo registro da amplitude de sua carreira e capacidade como vocalista e músico. Não há momento ruim, não há um único instante em que não sintamos sua falta e que não tenhamos a noção exata do quanto este sujeito cantava. Que esteja em bom lugar.

 

Ouça primeiro: “Jump Into The Fire”, “Stay With Me”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *