Belle & Sebastian e Jackson 5 para skatistas?

 

The Go! Team – Get Up Sequences Part One

Gênero: Eletrônico, alternativo

Duração: 31:51 min.
Faixas: 10
Produção:
Gravadora: Memphis

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

Gente, as misturas…A música pop há algum tempo é sobre elas, as novas e revolucionárias fusões, que podem acenar para a sensação de novidade, às vezes tão paradoxalmente rara e banalizada. No caso dos ingleses The Go! Team, que já estão na lida desde o início do milênio, a ideia é fazer música eletrônica que tenha harmonia suficiente para ser pop. E música pop que tenha esquisitice em quantidade digna de ser vista como alternativa. Eu digo mais: a música que o TGT faz é inteligente e adorável, exige muita habilidade de seus executores e do cérebro que comanda tudo, Ian Parton. O leque de influências vai de Belle & Sebastian – quando os escoceses ficaram mais encorpados, a partir dos anos 2000 – e outras maravilhas, como Jackson 5, The Avalanches, o pop eletrônico/dancante do início dos anos 1990 e várias lindezas com gosto de drinks coloridos à beira da piscina azul numa tarde de verão. Sim, a musicalidade presente neste excelente “Get Up Sequences Part One” é puro sol e céu azul, com todo o imaginário que decorre disso. Para entusiastas da boa melodia e da importância da canção na música pop, é um mergulho irresistível.

 

Ian Parton teve sérios problemas de audição durante as gravações do álbum, o que quase colocou seu lançamento em risco. Parton e sua turma estão por aí desde 2004, ano em que surgiram com o ótimo “Thunder, Lightining, Strike”, que já dava amostras desta música adorável que ainda sai das caixas de som 17 anos e cinco discos depois. E o que está presente aqui é uma música com positividade inescapável, algo que te faz pensar em Muppets Show, Motown, doces coloridos, desenhos animados, brincadeiras na rua. Este sentimento pode variar de acordo com as referências do ouvinte – lugar, idade, vivências – mas sempre significará positividade e o que os anglo-americanos chamam de “feelgood”. Pois bem, mesmo com a doença de Parton, tudo que sai desse disco é puro prazer auricular, ainda que, admitamos, possa soar adoravelmente datado se pensarmos que esta mistura de sons e fofura já existe desde o início dos anos 2000. Mesmo assim, não há como não aceitar o convite para mergulhar nessas águas coloridas.

 

Além de Parton, que comanda tudo, há outra pessoa que deve ser lembrada: a rapper inglesa Ninja, que, quando assume o controle de uma canção como “Pow”, um dos singles, é capaz de provocar movimento até nas estátuas da praça. A faixa tem um misturão de James Brown e uma série de raps e funks eletrônicos do início dos anos 1990, com samples se dobrando sobre samples, num dos melhores momentos sonoros de 2021 até agora. Outra cantora, Indigo Yaj, abrilhanta a adorável ‘Cookie Scene”, que tem flautinhas – uma marca registrada do TGT – num clima que evoca inegavelmente Jackson 5, mas que também dá um aceno por trás da janela do ônibus escolar para Belle & Sebastian. As referências aparentemente díspares se abraçam sob este guarda-sol colorido que Ian Parton oferece para o ouvinte em tempos de acessibilidade total. E, se é Jackson 5 que você quer ouvir, vá direto a “A Bee Without Its Sting”, que é uma verdadeira homenagem ao estilo dos irmãos de Indiana, na aurora do surgimento de Michael Jackson como astro.

 

As outras faixas do álbum são pequenas maravilhas, cada uma a seu jeito. “Let The Seasons Work” é um amálmaga de rock indie com batidas dançantes e metais, quase como que materializando o próprio The Go! Team numa só canção. “A Memo For Maceo” com menos de dois minutos de duração, é um groove de baixo, bateria e gaita, algo adorável. Há certa latinidade presente no caldo que é “We Do It But Never Know Why”, que surge como fraseado dançante capturado de alguma boy band hipotética de meados dos anos 1990. “Freedom Now” é outro groove em miniatura, lembrando algo que evoca tanto Betty Boo quanto Fatboys Slim. “I Loved You Better” é outra pequena joia que parece alguma gravação da Motown devidamente repaginada para uma versão feita em 2003. E as duas faixas que encerram o álbum, “Tame The Great Plains” e “World Remember Me Now”, trazer flertes fofos com o ska e mais alguma belezura proveniente da linha de montagem musical de Detroit.

 

“Get Up Sequencer Part One” é uma bolinha de gude sonora, algo que deve, não só ser guardado mas levado aonde o ouvinte for, pois é fonte confiável de sorrisos e positividade. Nestes tempos horríveis, nada pode ser mais desejado e necessário. Vão fundo.

Ouça primeiro: “Pow”, “A Bee Without Its Sting”, “Cookie Scene”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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