Alt. Country + Power Pop = Ezra Cohen

 

 

 

 

 

Ezra Cohen – The Sweet Million
(Dead Broke)
32′, 10 faixas

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

 

Este “The Sweet Million” é um daqueles discos que parecem feitos sob encomenda. Nós, que recebemos o alt.country lá nos anos 1990 como um estilo que havia chegado para nos reconectar com uma humanidade simples, que parecia perdida nas mãos dos grunges e britpoppers, iremos aplaudir a iniciativa solo do jovem Ezra Cohen, nativo do pequeno estado de New Hampshire, costa leste dos USA, perto de Boston e daquela região. Cohen foi vocalista de uma banda chamada Notches, um pequeno combo que emulava a sonoridade de Replacements e Husker Dü com admiração e fofura. Vale dar uma olhada no trabalho dos caras, que está todo disponível nos serviços de streaming, porém, é mais bacana ainda constatar o talento de Ezra já nesta época e ver como ele foi capaz de canalizar essas influências e modificar sua música para algo mais maduro, belo e confessional. Conseguiremos ouvir o Notches e as canções de “The Sweet Million” e perceber que estamos diante da mesma pessoa, porém, a maturidade e a mudança são admiráveis no trabalho solo.

 

 

Mas restringir o trabalho de Cohen a algo mais voltado para o alt.country é deixar de lado outra importante influência – o power pop, especialmente da matriz constituída por gente como Matthew Sweet, Lemonheads e Teenage Fanclub, lá no início dos anos 1990 e, certamente, este é um dos grandes charmes de “The Sweet Million”. O equilíbrio entre uma narrativa cotidiana e o romance urbano, igualmente cotidiano, se dá através desta junção de timbres mais simples e do tempereo com esta agridoçura pop. O resultado é adorável e funciona ao longo de todas as dez faixas do álbum, que tem uma duração enxutíssima de 32 minutos. Cohen não perde tempo com grandes rebuscamentos estéticos ou enfeites de estúdio, pelo contrário, suas canções vão direto ao assunto e isso, certamente, é outro charme que o álbum exibe. Sendo Cerassim, a gente coloca na mistura o powerpop, o alt.country e não deixa de fora as influências iniciais, do tempo do Notches. O resultado não poderia ser ruim, certo?

 

 

Logo de cara, com “Catchin’ Up”, Cohen mistura teclados com uma melodia/arranjo que poderiam ser de Paul Westerberg, o cérebro pensante dos Replacements. As guitarras soam melódicas mas constroem aquela parede sônica, que vai costeando a canção, que não chega a dois minutos de duração. A seguir, “I Saw The Country” mostra como Ezra tem jeito para erguer a tal ambiência alt.country, que não funciona em qualquer mauricinho com uma guitarra. Ele canta a tristeza, o amor e as nuances de viver perto de grandes cidades americanas, mas, ainda assim, preservar a doçura e a camaradagem das “watertowns”, pequenas comunidades onde se lê o nome da cidade na cisterna. E o versinho “I saw Virginia, North Carolina, I wanna see that from your side / ‘Cause I want you, and I need you in my life” mostra a simplicidade que o amor pode ter. “Sixteen”, logo em seguida, é pop perfeito de guitarras, com uma ótima produção, ótimas guitarras e um forte acento que lembra Pete Yorn ou mesmo Gin Blossoms.

 

 

A lindeza absoluta que é “Shooting Star” deixa claro que Cohen é um baita compositor. A canção é uma nítida referência ao Big Star, seja à banda, seja ao som que ela representa. Tem uma linda e delicada introdução acústica, que logo deságua num clima de guitarras melódicas, vocais desencarnados e a aquela familiaridade que a gente sente com essas canções, que parecem deixadas no meio do caminho para serem apanhadas por nós, como pistas que irão nos tirar do labirinto de Creta. “Annabelle” é outra lindeza baladística, com nome feminino, mas que é uma homenagem de Cohen à sua gata e tem participação de Molly Devitt nos bocais de apoio. Certamente quem já teve gato, mais especificamente, gata em casa, sabe o quão apaixonantes elas podem ser a ponto, mesmo de inspirar uma canção. “Just Like You” lembra um pouco da sonoridade do Goo Goo Dolls antes de estourar com “Iris”, em 1998. É rock com bons riffs pontuais e uma bela melodia. “Kiss Me In The Dark” é outra balada matadora, novamente parecida com algo que Pete Yorn poderia compor e gravar. O fecho vem com três ótimas faixas: “Talk Of The Town”, que tem um belo ataque de guitarras melódicas; “Guess It Was Love”, uma balada folk rock com melodia sofrida e o a linda “Change Of Season’s Kiss”, que entremeia barulho e dedilhados de violão com maestria.

 

 

Este primeiro álbum de Ezra Cohen é uma baita credencial. Tem influências sensacionais, execução perfeita e um punhado de ótimas canções. O sujeito sabe o que está fazendo e se você gosta das bandas e artistas mencionados aqui nesta resenha, deve ouvi-lo já. Pra ontem.

 

 

Ouça primeiro: “Shooting Star”, “Just Like You”, “Catchin’ Up”, “Change Of Season’s Kiss”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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