A melancolia solar do Massage

 

Massage – Still Life

Gênero: Rock alternativo

 

Duração: 37:57min
Faixas: 12
Produção: Jed Smith, Lewis Pesacov e Massage
Gravadora: Mt. St. Mtn., Tear Jerk e Bobo Integral Records

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

Houve um tempo, entre o esmorecimento do pós-punk e o início do que se entendeu por rock alternativo, em que surgiu uma música bem específica mas quase inclassificável no Reino Unido. Ela é difícil de captar de forma linear, não há uma cronologia precisa, surgiu em respingos. Por exemplo: ela está em “Just Like Honey”, clássico do Jesus And Mary Chain, de 1986. Também está em “There She Goes”, do La’s, de 1990. Também habita os acordes de “Here’s Where The Story Ends”, do Sundays ou de “Run”, do New Order, ambas de 1989. E em alguns momentos do Cure que surgiu em “Wish”, seu álbum de 1992, criminosamente esquecido, mas que deu um de seus maiores sucessos radiofônicos desde sempre: “Friday I’m In Love”. Pois bem, o Massage, um quinteto californiano surpreendente, está nesta dobra espaço-temporal, fazendo canções como estas acima, mergulhado naquela melancolia autocomiserativa que nós, quarentões e cinquentões costumávamos ter. Seu disco, “Still Life” é uma maravilha absoluta, que tende a passar completamente ignorada pelo radar dos remanescentes dessa espécie rara de gente que sofreu. Pois bem, a gente vai tentar impedir que isso aconteça.

 

Este som, mencionado acima, é entendido por muitos como guitar rock. É um termo genérico, mas que serve como rótulo. E o Massage, tem um certo pedigree pra abordar o assunto, uma vez que é um projeto que traz nas guitarras e vocais, Alex Naidus, que foi baixista e uma das mentes pensantes e criativas do The Pains Of Being Pure At Heart, banda de Nova York que também se dedicava ao decalque e reinvenção dessa sonoridade guitarreira e tristonha. Ao seu lado aqui estão Andrew Romano (também nas guitarras e voz), Gabrielle Ferrer (Vocais e teclados), David Rager (baixo) e Natalie de Almeida (bateria). O resultado que esta galera obtém ao longo das 12 faixas de “Still Life” é adorável, totalmente digno de figurar na galeria de representantes dignos dessa linhagem que se inicia lá nos anos 1980.

 

A gente já sabe que, de nada adiantam boa intenção e apuro técnico-estético num disco de música popular se não houver uma quantidade considerável de boas canções que sustentem a coisa. E aqui há um número surpreendentemente alto de ótimas melodias. O Massage tem a manha de diversificar os arranjos a ponto de dar conta de várias nuances desse termo “guitar rock”, satisfazendo assim vários subgrupos de admiradores e fãs. Ainda que alguns momentos flertem com a mera cópia de sonoridades, a boa intenção é mais forte. Veja, por exemplo, a abertura, com “Half A Feeling”, uma canção de manual sobre como recriar a sonoridade do Jesus And Mary Chain em “Just Like Honey” sem abusar da distorção das guitarras. É tudo muito parecido, inclusive com a mesma levada spectoriana de bateria, mas é tudo muito belo também. E, a partir dela, tem início um desfile de pérolas sonoras que vão fazer o velho indie sorrir chorando. Ou, como diz uma amiga minha, chorrir.

 

“Made Of Moods” tem vocais harmoniosos que galopam sobre uma melodia maravilhosa, adornada com guitarras que surgem de todos os lados. “Sticks & Stones” já tem uma bateria um pouco mais pronunciada, que imprime velocidade mais rápida sob os comichões de guitarras fluidas. Até para destacar as faixas é difícil porque todas têm méritos e atrativos inegáveis. “I’m A Crusader”, por exemplo, tem pinta de lado-B dos Smiths, com o mesmo entrelace de guitarras e violões, enquanto o baixo de Peter Hooke assombra “In Gray & Blue”, conferindo uma identidade inegável e justa. “At The End Of The World” também é outro momento iluminado, lembra The Sundays mas também lembra os americanos do Real Estate, outra banda contemporânea que se dedica a revisitar esses terrenos de praia branca sob o céu cinzento. O fim do percurso chega com outra belezura, “I Come Running”, linda e agridoce, com participação adorável da tecladista Gabrielle Ferrer nos vocais.

 

“Still Life”, esse álbum do Massage, é um brinco de ouro da princesa. É um tesouro sonoro que merece ser abraçado, mimado e acarinhado por quem andava meio desesperançoso e desalentado neste mundo tão rápido e frenético. Essas canções pedem calma, oferecem calma e a sensação de que alguém entende essas tristezas teimosas que te assaltam o peito. Vá na fé.

 

Ouça primeiro: “I Come Running”, “At The End Of The World”, “In Gray & Blue”, “Half A Moment”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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