Zelia Duncan – Tudo É Um

Gênero: MPB, folk
Duração: 37 min
Faixas: 11
Produção: Christiaan Oyeens
Gravadora: Duncan Discos/Biscoito Fino

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

Este sensacional “Tudo É Um” marca a volta de Zélia Duncan ao pop folk autoral, dez anos depois de “Pelo Sabor do Gesto”, o último trabalho dela nesta onda. Entre os dois, vários projetos: um DVD, “Totatiando”, um álbum de sambas e outros dois dedicados a Itamar Assumpção e Milton Nascimento, o último em dupla com Jaques Morelenbaum. Esta diversidade de trabalhos mostra a versatilidade de Zélia, não só como intérprete, mas atesta o extremo bom gosto dela ao gerenciar a carreira. Este novo disco traz de volta também a parceria com Christiaan Oyens, com quem ela surgiu no cenário nacional lá no meio da década de 1990. Quem lembra, lembra.

 

Zélia diz, ao escrever sobre o disco, que ele é uma espécie de resposta ao momento agressivo que estamos vivendo. Penso que só as pessoas muito bem resolvidas e serenas conseguem responder à violência com tamanha delicadeza. “Tudo É Um” é um disco excepcionalmente gentil, singelo, com um monte de canções belas. A cantora também diz que o resultado das gravações refletiu a sua própria necessidade por um pouco de tranquilidade e beleza, artigos em falta no país de uns anos pra cá. Na tradição das melhores e mais espontâneas realizações, as faixas, de fato, mostram o amor, a amizade, o prazer de estar junto e dividir momentos como os mais preciosos bens que podemos almejar nesta vida. E, num país dividido, encontrar gente para tal é cada vez mais complexo, dando uma aura de intensa realização quando acontece. Zélia diz que este é um disco de Pop Folk Brasileiro, termo que ela usou para caracterizar estas levadas de violão, baixo e bateria, com pianos aqui, metais ali, tudo muito fluido e simpático. É um bom rótulo.

 

De cara ela oferece as duas melhores faixas do álbum: “Canção de Amigo”, em parceria com Oyens, é uma bela homenagem a amigas da cantora, dos seus tempos em Brasília, a quem ela revê, sempre que possível. A faixa tem lindezas no arranjo e um belo trabalho de violões, uma característica comum a tudo que está presente por aqui. Os versos “Defeitos perdoados, abraços antigos apertados” e “Ser quem se é, aceitar o que não deu pra ser” refletem a longevidade intrínseca à própria amizade, algo que vai contra a rapidez e superficialidade dos tempos atuais. Logo em seguida, a colossal “Só Pra Lembrar”, que é uma delicada pérola sobre otimismo e a importância de se estar presente para o que der e vier do amor em diversos planos e formas: “só pra lembrar que você tem um amor”. O cantor gaúcho Duda Black assina a parceria participa da gravação com sutileza e espontaneidade.

 

Outros destaques: a parceira com Zeca Baleiro em “Me Faz Uma Surpresa”, com arranjo que injeta outras cores na ambiência folk reinante, com Zélia e Zeca cantando em dobro, num belo efeito. “O Que Mereço” lembra alguma canção perdida da Legião Urbana em versão acústica, daquelas mais leves e apaixonadas que Renato Russo costumava fazer nos tempos do Trovador Solitário. A faixa-título é criação conjunta com Chico César, enquanto “Sempre Os Mesmos Erros”, de Fred Martins, tem participação de Jaques Morelenbaun, dando uma profundidade ao arranjo que faz toda a diferença. Lá pelo fim do disco, “Feliz Caminhar” é dividida com Moska, mostrando leveza e belezura. Fechando com chave de ouro, “Eu Vou Seguir”, com coro beatle no fim e cordas.

 

“Tudo É Um” não só marca a volta de Zélia a este Pop Folk Brasileiro como também é um de seus trabalhos mais legais, mostrando sua marca registrada como intérprete e seu extremo bom senso/bom gosto na hora de pensar num disco assim, num momento como o atual. É simplicidade bela, que cumpre o que promete.

 

Ouça primeiro: “Só Pra Lembrar”.

 

 

Foto: Leila Pinheiro

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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