Ver ou não ver o novo Rei Leão?

 

Você deve saber: está em cartaz uma nova versão de “O Rei Leão”, sensacional desenho da Disney, que foi exibido em 1994 e arrebatou plateias ao redor do mundo. Lembro de ver no Roxy 1, em Copacabana, ao lado de uma namorada que chorou durante todo o filme. Nas cenas felizes, nas cenas tristes, nas piadas, nos musicais, a menina chorou por mais de 100 minutos e, por mais que isso pareça exagero, dá pra compreender sem muito esforço ou justificativa. “O Rei Leão” é, de fato, uma obra imensa e relativamente recente, certo? Só tem 25 anos de idade. Qual seria a razão para uma nova versão do que já é sensacional e imorredouro?

 

O novo Rei Leão vem alardeando um formato de animação mais real. Quem dirige é Jon Favreau, responsável por outra releitura de desenho clássico Disney – Mogli – com o apelo do “live action”. Mas, como a trama dos leões e outros bichos não traz nenhum humano, a ideia de “animação realista” ganha corpo e se torna a explicação. Eu ainda não vi o filme – devo vê-lo por conta da família em breve – e não estou muito animado para tal. O primeiro desenho foi tão impactante que eu receio ser difícil para uma nova produção romper este limite. O original tem, pelo menos, duas sequências exuberantes em termos de animação e drama, a saber, o início, quando os animais se reúnem para saudar o novo herdeiro do reino, Simba, e a morte de seu pai, Mufasa. Ambas capazes de provocar emoções intensas, dado o impacto musical/visual que despertam. A apresentação de Simba, ao som de “Circle Of Life”, canção de Elton John e Tim Rice, é um dos momentos mais emocionantes do cinema feito nos anos 1990, sem exageros. A morte do rei, bem, é tristíssima. O impacto de “O Rei Leão” é tanto que eu só o assisti no cinema.

 

A nova versão traz alguns elementos que chamam a atenção. O elenco de dubladores – que faz toda a diferença numa produção dessa natureza – é predominantemente negro. Tem Beyonce como Nala; Chiwetel Ejiofor como Scar; Donald Glover como Simba; Alfre Woodard como Sarabi e, claro, James Earl Jones repetindo seu papel como Mufasa. Além deles, SEth Rogen e Bill Eichner vivem Pumba e Timão, respectivamente. Com um elenco destes, como perder esta oportunidade para iniciar as crianças na adorável arte de ver filmes legendados e se familiarizar com o inglês? Há quem prefira as versões dubladas, vai saber…

 

A presença de Beyonce, inclusive, aponta para uma ação ainda mais pesada em termos de marketing. A cantora – e seu marido, Jay-Z, produtor e rapper – lançaram o álbum “The Lion King: The Gift”, com a trilha sonora do filme, que traz canções interpretadas por eles e por Glover, que é ninguém menos que Childish Gambino, um dos mais criativos rappers em atividade. Além deles, Kendrick Lamarr, Pharrel Williams e até a filha mais velha de Beyonce, Blue Ivy, participam da empreitada, numa onda meio “Black Panther”. Já estão em alta rotação os singles “Spirit” e “Brown Skin Girl”.

 

 

Longe das implicações marqueteiras do novo longa, a questão é: o que este novo filme traz de novidade? Qual é a justificativa para realizá-lo além de gerar mais e mais dinheiro às custas da nostalgia? Segundo informações do site imdb.com, o lucro no primeiro fim de semana já teria ultrapassado 190 milhões de dólares, apenas nos Estados Unidos.

 

A impressão que o trailer trouxe é de uma produção caprichadíssima, bem feita, com o máximo de modernidade que o dinheiro pode comprar, se esmerando em repetir e reproduzir algo que já foi feito e que ainda cumpre seu papel. A indústria da nostalgia é um sintoma importante da nossa sociedade, que aliena a perspectiva de futuro em favor de uma visão “remodelada” de passado. Parece que o novo Rei Leão é mais uma manifestação desta tendência.

 

Longe desta discussão, o que importa ainda é a arrebatadora sequência de abertura do original, de 1994. Emocionante, bela, maior que a vida. E ponto final.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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