My Morning Jacket – The Waterfall II

 

 

Gênero: Rock alternativo

Duração: 46 min.
Faixas: 10
Produção: Jim James, Tucker Martine
Gravadora: ATO

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

Se a gente voltar lá pro início dos anos 2000, veremos que o My Morning Jacket era uma das apostas mais garantidas de grande banda para o novo milênio. Original, interessante, com um vocalista/cérebro bem carismático – Jim James – e uma queda por recriar a pegada folk de Neil Young com várias inserções de modernidade não-chata. Ao longo do tempo, a banda foi migrando para novas sonoridades, sem deixar de lado este início de intenções, agregando influências de soul, de pop radiofônico setentista e criando uma identidade. Jim, por sua vez, gravou uma mãozada de discos solo interessantes, o que fez do MMJ uma pequena instituição entre seus fãs. Em 2015, entraram em estúdio para lançar um álbum triplo, que saiu como disco simples, “The Waterfall”. A ideia de dar mais corpo ao trabalho, no entanto, fez com que o grupo deixasse para trás várias faixas gravadas nas mesmas sessões. Este novo lançamento, como o nome já diz, é um apanhado destas sobras de estúdio, todas finalizadas, completando assim mais um pedaço da ideia original. Assim como o registro de 2015, há muita beleza por aqui.

 

O interessante desde segundo set de canções de 2015 é que temos composições e faixas mais simples e bem pensadas. Não que o primeiro “The Waterfall” não fosse legal, mas aqui as coisas parecem mais focadas e providas de sentido. Há algumas canções sensacionais que apontam para caminhos mais arejados, como o caso de “Climbing The Ladder”, que tem uma boa vibração country rock assumida, algo que o MMJ nunca fizera em faixas autorais, apenas em covers. Sempre que ciscara no terreno do estilo, o fizera com alguma aura moderna, revisitada. Aqui, não, é um passeio assumido e orgulhoso em uma levada que poderia ser de um JJ Cale ou de um John Fogerty, sem erro. E não é só aqui que tudo parece mais direto e simples. “Feel You”, outro exemplo, é uma balada ao piano com melodia linda e acentos soul FM, que estaria numa fita cassete gravada nos anos 1980 para se dedicar à amada distante. Eu faria isso, podes crer.

 

A mágica vai pelo disco adentro. “Still Thinking” é uma dessas incursões de Jim James no cânon beatle, brincando de emular andamentos psicodélicos de caixa de lápis de cor enquanto mete uma melodia exemplar e linda no meio do arranjo, desconcertando – positivamente – o ouvinte. Também tem aura de Liverpool na soberba “Beautiful Love (Wasn’t Enough)”, uma lindeza/belezura de pianos, andamento cadenciado e guitarra encardida em solo discreto. A melodia é de manual para se fazer uma bela canção, algo que Jim James vem se aprimorando a olhos e ouvidos vistos nestes anos como líder da banda e artista solo. Daí, quando você pensa que está tudo muito harmonioso e bonitinho, vem “Magic Bullet”, que se baseia num groove eletrônico, tem voz em falsete e uma pegada oitentista do bem.

 

Ao longo das canções, dá pra notar essa diversidade de estilos que passaram a caber sob o manto do My Morning Jacket. Se a primeira faixa do trabalho, “Spinning My Wheels”, acena para a sonoridade mais complexa que a banda incorporou já nos anos 00, “Run It” é o contraste com isso, soando novamente como uma faixa dos Eagles, enquanto “Wasted”, ainda que guarde certa pompa no arranjo, é calcada num riffão de guitarra setentista que poderia ser – bingo – do Crazy Horse. As duas faixas finais – “Welcome Home” e “The First Time” – cumprem a função de fechar os trabalhos, ainda que não sejam as mais inspiradas do álbum.

 

Certamente melhor que o antecessor, “The Waterfall II”, sem que ninguém note ou dê a devida atenção, chega como um ótimo disco deste 2020, cheio de nuances e surpresas de uma banda que é sensacional e periga se tornar privilégio de poucos atentos. Seja um destes e se esbalde nesta piscina de águas claras numa tarde de verão.

 

Ouça primeiro: “Beautiful Love (Wasn’t Enough)”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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