MTV Unplugged de volta – Quem pediu?

 

A notícia veio ontem: o “Unplugged MTV” vai voltar. Lembra dele? Era um programa em que artistas eram convidados a fazer uma apresentação “ao vivo” nos estúdios da emissora, com plateia presente e instrumentos acústicos, mostrando, diante de um senso comum, alguma novidade em seu repertório, algo que justificasse a diferença entre versões acústicas e versões “elétricas”. Funcionou no início, notadamente nos anos 1990, especialmente em termos de Brasil, quando algumas bandas conseguiram, de fato, fazer algo interessante. Mas, e agora? Por quê ressuscitar este formato justo quando a indústria do disco é algo totalmente diferente de como era no tempo em que o programa esteve no auge e/ou quando a própria MTV já não é uma emissora que toca música 24 horas por dia?

 

Quem foi escolhido para inaugurar esta nova fase do programa foi Liam Gallagher. As gravações serão em Hull, na Inglaterra, no dia 03 de agosto, quando o ex-vocalista do Oasis subirá ao palco e desfilará um repertório de canções próprias, do ótimo disco “As You Were”, lançado por ele em 2017, além de clássicos dos tempos de sua antiga banda e, quem sabe, alguma coisa do repertório do Beady Eye. No Brasil o programa voltará com um show de Tiago Iorc, que esteve “sumido” por um bom tempo e retornou “do nada” com um disco convenientemente lançado há poucos meses, “Construção”. Tudo muito bom, tudo muito bem, mas, a pergunta que fica é: quem pediu a volta do MTV Unplugged?

 

Não dá pra negar que o programa gerou ótimos episódos, que, por sua vez, se tornaram discos e DVDs vencedores. Artistas como Eric Clapton, REM, 10.000 Maniacs, Tony Bennett, Rod Stewart e Nirvana viram suas carreiras ganharem novas dimensões após o lançamento de álbuns contendo o selo MTV Unplugged. Era a chance de ouvir uma espécie de “velho-novo”, canções conhecidas com nova roupagem e, em alguns casos, uma novidade. O caso mais evidente neste terreno é a releitura surpreendente que Kurt Cobain e seus amigos fizeram para “The Man Who Sold The World”, de David Bowie, em 1993. Já Clapton, que vinha numa fase tortuosa de sua trajetória, após a morte do filho, ressurgiu com uma nova versão de “Layla”, grande sucesso de seu grupo Derek And The Dominos, em 1992.

 

A verdade é que o programa foi descontinuado, mas a marca permaneceu forte. No século 21, muitos artistas ainda participaram de apresentações na emissora e lançaram discos a partir delas. De Queens Of The Stone Age a The Police, passando por Scorpions, A-Ha e Miley Cyrus. Pelo menos três destas apresentações – transformadas em disco – chegaram fortes ao mercado fonográfico brasileiro: A-ha, Florence And The Machine e Shawn Mendes, reforçando que, mesmo com a MTV se transformando numa emissora de programação diversa, a força dos artistas, junto com a marca vencedora de outros tempos, fazia com que houvesse alguma certeza de investimento por parte das gravadoras. Sim, porque, como dissemos, o mundo mudou e a indústria do disco existe de uma forma totalmente diferente hoje.

 

Será que os fãs da música em streaming serão tão fieis ao tal “formato acústico”? É sempre bom lembrar que as tais apresentações nunca foram totalmente desplugadas, apenas tinham restrições em termos de amplificação dos instrumentos. Talvez um ou outro artista tenha se empenhado mais nesta missão, mas é consenso que cada vez menos distinção havia entre os originais elétricos e as tais novas roupagens desplugadas. Claro, há também casos em que a performance dos artistas conferiu força e novidade suficientes para que os discos e DVDs resultantes fossem grandes sucessos de venda e crítica, caso de Paralamas do Sucesso, Jorge Ben Jor e Titãs, aqui no Brasil. No caso da banda paulistana, a fama pós-Acústico MTV gerou um “disco-irmão”, chamado “Volume 2”, lançado pela Warner sem a chancela da MTV, mas que reproduzia o mesmo espírito.

 

Se a MTV quisesse ousar na proposta, retringiria o convite a artistas cuja obra é baseada em música eletrônica. Já pensou uma versão acústica de … Underworld? Ou de Chemical Brothers? Ou de Drake? Pet Shop Boys e Depeche Mode? Isso talvez gerasse muito mais curiosidade e atenção por parte do público e demandasse criatividade por parte dos artistas. Por outro lado, que tal um MTV Plugged, o inverso do acústico, no qual gente que tem apreço pelo formato desplugado fosse obrigada a inserir roupagem eletrônica em suas canções mais conhecidas?

 

O que me aflige nisso tudo é que, ainda hoje, 2019, o “formato acústico” é sinônimo de curiosidade, como se, quem sabe, fosse necessária uma habilidade maior para empunhar um violão do que programar e samplear.

 

 

Quem pediu a volta do Unplugged MTV? Eu não fui.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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