Morreu Cassiano, o maior de todos

 

Estava agora há pouco numa live sobre os 30 anos dos álbuns “Use Your Illusion”, do Guns’n’Roses, com meus amigos e colegas Bruno Eduardo e Marcos Bragatto, quando uma amiga querida me avisou da morte de Genival Cassiano, o compositor de “Primavera” e várias outras canções marcantes do início dos anos 1970. Cassiano estava internado há cerca de um mês no Hospital Estadual Carlos Chagas, no Rio e é mais uma vítima da covid-19.

 

Sempre que vejo uma pessoa morrer por covid-19, penso que o governo federal se recusou mais de dez vezes a comprar vacinas ainda no ano passado. Penso também na enorme quantidade de pessoas que lamentam as perdas de seus entes queridos todos os dias, todos os cantos.

 

Ninguém aguenta mais esta vida sequestrada. Essa indiferença em relação às mortes. Esse bando de gestores mambembes, mal intencionados, inventando desculpas e falácias para justificar o injustificável, em se tratando de um governo eleito: o descaso absoluto, a satisfação com o caos, a ponto de depender dele para se justificar. É tudo muito hediondo.

 

Mas Cassiano não tem nada a ver com essa maldade.

 

Ele era o oposto disso. Começou no grupo Os Diagonais – com os quais gravou dois discos – e adentrou a carreira solo com “Imagem e Som”, lançado em 1971. Antes disso, em 1970, Cassiano tocou guitarra no primeiro disco de Tim Maia, também assinando o maior sucesso daquele álbum: “Primavera”. Também é dele a linda e arrepiande “Eu Amo Você”.

 

Em 1973 seria a vez de “Apresentamos O Nosso Cassiano”, que trazia belezas como “Cedo ou Tarde” e “Me Chame Atenção”, mas foi em 1976 que ele lançou o seu maior sucesso como cantor e compositor: “A Lua e Eu”, que puxou seu terceiro – e último disco de inéditas – “Cuban Soul”. Desse álbum também é “Coleção”, assim como “A Lua…”, uma parceria com Paulo Zdanoviski.

 

Cassiano só voltaria ao disco em 1991, quando participou de um Songbook em homenagem a Noel Rosa e quando lançou uma compilação de atualizações de suas canções, “Cedo Ou Tarde”, na qual participam vários artistas mais jovens, como Ed Motta, Djavan, Marisa Monte, além de gente mais graúda, como Luiz Melodia. O disco não teve um resultado muito expressivo e Cassiano voltou à reclusão, só surgindo para participar de um disco dos Racionais MCs em 2002.

 

A morte de Cassiano é uma dessas enormes tragédias que tendem a ser inseridas no hall das perdas de artistas. O Brasil de 2021 é um terreno minado, onde a morte é algo absoluta e terrivelmente possível a cada instante, seja a de uma pessoa famosa, de um anônimo, seja por covid-19, seja por execuções sumárias como a empreendida pela polícia carioca na comunidade do Jacarezinho

 

Que Cassiano tenha feito sua passagem em paz e que siga encantando as pessoas por onde for.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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