Kasabian e a busca pela modernidade constante
Kasabian – Happenings
28′, 10 faixas
(Sony)

A banda inglesa Kasabian já tem quase trinta anos de formada, mas completa, neste ano, o vigésimo aniversário do primeiro álbum, homônimo. O sucesso foi imediato, mas o grupo de Leicester se afirmou a partir do segundo trabalho, “Empire”, de 2006. A questão geracional é um ponto importante na análise do trabalho da banda liderada pelo vocalista e compositor Serge Pizzorno: nasceu moderníssima e urgente, porém, padeceu de envelhecimento rápido e cruel. Presa entre o rock eletrônico dos anos 2000 e as influências de britpop e acid rock noventistas, o grupo decaiu a partir do álbum “48:13”, lançado em 2014, e não conseguiu apontar na reta para vivenciar uma reinvenção ou algo do gênero. Sua aposta ainda é em faixas que têm muitos sintetizadores, algumas guitarras psicodélicas e uma atitude roqueira modelo 1997 no palco, o que funciona para os padrões britânicos, mas não vai muito além disso. Sendo assim, este “Happenings” chega com a missão de manter o Kasabian atualizado e elegível para o circuito dos festivais de verão, das paradas da BBC e demais indicadores de sobrevida. Será que consegue?
O disco é irregular, mas não podemos dizer que é ruim. Ele só é estéril de ideias e coisas interessantes. Não recupara com vigor algo do passado, nem procura avançar em direção a algo diferente. Como envelheceu rapidamente, o Kasabian parece tentar desesperadamente fazer alguma coisa que soe significativa, mas são poucos os momentos de luminosidade. O que salva os sujeitos é que Serge é um bom compositor, cheio de estilo e ótimo vocalista, substituindo Tom Meighan, que, em 2022, foi acusado de violência doméstica pela então esposa e foi “convidado a se retirar” da banda. O novo álbum consolida Serge na titularidade vocal e mostra sua ginástica estilística para manter sua banda interessante. O que primeiro salta aos ouvidos é a concisão da empreitada: menos de meia hora para dez faixas, enxutíssimas, prontas para cair no gosto de uma multidão em Glastonbury, mas não no palco principal.
É uma experiência interessante ouvir um disco de dez faixas durando menos de meia hora. Isso significa dar de cara com canções curtas, que soam, hum, estranhas. “How Far Will You Go” é a menor delas, com menos de dois minutos. É nervosa, urgente, meio como uma tentativa de fazer hardcore feita por quem não entende do assunto. É engraçado porque, antes dela, “Call”, com dois minutos e meio, soa como um pequeno frankenstein de estilos, misturando eletrônica, guitar rock, pop de estádio, rave e house music, algo que, levando em conta a curta duração, produz uma experiência meio esquisita. Mas, novamente, não é uma canção ruim, apenas mal pensada. Assim como ela, “Bird On A Cage”, com 2:39, já aponta para outro caminho, no caso, uma espécie de blues rock indie eletrônico que parece estar em duração alterada.
Mas, quando o Kasabian acerta, é no alvo. “Darkest Lullaby”, que abre o álbum, é uma lindeza híbrida total flex, que tem o DNA necessário para ser cantada em lugar aberto, lembrando uma variante indie e jovem do Duran Duran. “Coming Back To Me” é o ponto alto do álbum: uma pequena aula de como fazer uma canção de verão que serve tanto para cantar com a família, como dançar na noite e outras funções. Tem andamento que vai e vem, refrão grudento, progressão de acordes amistosos, tudo funciona bem. “Hell Of It” é outro exemplo de majestade: andamento dançante mas criativo, com eletrônica não-invasiva que se mescla lindamente à pegada rock híbrida, mas perigosa, esquistamente legal. E tem o céu aberto de “Algorithms”, que pretende ser consciente sobre a mecância pré-acordada das redes sociais e de como isso nos atrapalha. Só que é uma canção pós-hippie, psicodélica e com sol brilhando. Funciona, vai.
“Happenings” é divertido porque busca essa modernidade constante sem correr atrás do próprio rabo. É um disco de verão, divertido, leve e que não deve ser levado tão a sério assim. As boas canções salvam a pátria e credenciam a audição. Vão nessa.
Ouça primeiro: “Darkest Lullaby”,”Coming Back To Me”, “Hell Of It”, “Algorithms”

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.