Honk, a nova — e inútil — coletânea dos Stones
Compilações do tipo “maiores sucessos” e “o melhor de” tornaram-se escassas com a adoção maciça dos serviços de streaming como meio de consumo de música gravada, mas cá e lá ainda aparece uma dessas coleções, sobretudo de artistas que têm muitas décadas de atividade. Os Rolling Stones, na estrada desde 1962, têm mais de duzentas coletâneas (incluindo edições oficiais e apócrifas) publicadas em mídias físicas segundo o site Discogs. Duas antologias relativamente recentes dão conta de forma mais que satisfatória dos principais momentos fonográficos do combo dirigido por Mick Jagger e Keith Richards: “Forty Licks”, de 2002, primeira edição do tipo a reunir gravações feitas nos anos 1960 (que pertencem ao selo ABKCO do infame Allen Klein) com o material produzido de 1971 em diante, e “Grrr!”, que amealhou cinquenta registros feitos pelos Stones de 1962 até 2012 (ano de lançamento desta seleção) que marcaram não só a história do grupo inglês, mas também da música popular. Ambas as coleções oferecem aos colecionadores gravações inéditas como “Don’t Stop” e “Losing My Touch”, incluídas em “Forty Licks”, e “Doom and Gloom” e “One More Shot”, alojadas em “Grrr!”. Depois de 2012, os Rolling Stones lançaram apenas um álbum de estúdio, “Blue & Lonesome”, de 2016.
O anúncio da publicação em vários formatos de áudio de mais uma coletânea dos Stones em 2019 — chamada “Honk”, título tão bobo quanto o da compilação “Grrr!” — levanta algumas questões: precisamos mesmo deste produto? Por que os Stones não lançam oficialmente algumas gravações inéditas que têm em seus arquivos em vez de empurrar para fãs e público em geral os fonogramas de sempre? “Honk” tem evidentes desvantagens em relação às coletâneas citadas no parágrafo anterior, pois não só não apresenta as gravações em ordem cronológica, mas também não contém registros de estúdio inéditos. As faixas bônus das edições de luxo de “Honk” são gravações ao vivo, algumas delas com participações de músicos como Ed Sheeran, Dave Grohl e Florence Welch. “Honk” é só mais um produto criado para manter o nome dos Stones na mídia enquanto o grupo não lança canções novas? Tudo indica que sim. A utilidade marginal de Honk é mínima, talvez até mesmo nula, pois não há nada nesta edição que justifique sua existência além dos interesses corporativos do Stones. Edição de luxo em vinil colorido é gimmick, truque barato de marketing.
Os Stones têm verdadeiros tesouros em áudio guardados em seus arquivos, mas parecem que não se importam com isso. Jagger, Richards, Charlie e Ronnie preferem entupir o mercado com registros de áudio e vídeo de turnês históricas da banda. Por mais que sejam documentos históricos, cabe perguntar: de quantas versões ao vivo de “(I Can’t Get No) Satisfaction” e de “You Can’t Always Get What You Want” precisamos? Sabemos bem que o repertório dos shows dos Stones das últimas décadas é baseado nas canções mais manjadas e raramente oferece surpresas aos fãs, a despeito do grande número de composições clássicas de Jagger e Richards que não tiveram ampla divulgação, deep cuts que mereciam figurar nos setlists, entre elas “Lady Jane”, “Connection”, “Salt Of The Earth”, “Let It Bleed”, “Let It Loose” e “Hand Of Fate”. Não é de graça que alguns comentaristas chamam os shows mais recentes dos Stones de “jukebox musical”. Em nome das apresentações em estádios, os Rolling Stones abrem mão de parte essencial de seu repertório e, assim, contribuem para a diminuição da percepção do seu legado. É como se os Stones colocassem viseiras no seu público, impedindo que este tenha uma visão mais ampla e mais justa da extensa obra da banda. O mesmo acontece com as inúmeras reciclagens de material fonográfico feitas pelo grupo. Em termos de lançamentos de compilações e de seleção de repertório de shows, os Rolling Stones deviam usar como principal critério o ditado que deu origem ao nome que carregam há mais de cinco décadas: pedras que rolam não criam limo.
Abaixo, a lista de faixas da edição expandida de “Honk”.
Disco 1
Start Me Up
Brown Sugar
Rocks Off
Miss You
Tumbling Dice
Just Your Fool
Wild Horses
Fool To Cry
Angie
Beast Of Burden
Hot Stuff
It’s Only Rock’n’Roll (But I Like It)
Rock And A Hard Place
Doom And Gloom
Love Is Strong
Mixed Emotions
Don’t Stop
Ride ‘Em On Down
Disco 2
Bitch
Harlem Shuffle
Hate To See You Go
Rough Justice
Happy
Doo Doo Doo Doo Doo (Heartbreaker)
One More Shot
Respectable
You Got Me Rocking
Rain Fall Down
Dancing With Mr D
Undercover (Of The Night)
Emotional Rescue
Waiting On A Friend
Saint Of Me
Out Of Control
Streets Of Love
Out Of Tears
Disco 3 (gravações ao vivo)
Get off My Cloud
Dancing With Mr D
Beast Of Burden (with Ed Sheeran)
She’s A Rainbow
Wild Horses (with Florence Welch)
Let’s Spend The Night Together
Dead Flowers (with Brad Paisley)
Shine A Light
Under My Thumb
Bitch (with Dave Grohl)

Zeca Azevedo é. Por enquanto.
E qual seria a sua setlist do seu show dos stones dos sonhos?
É uma tarefa difícil fazer essa escolha, mas eu gostaria de ver os Stones ousando mais na seleção de repertório. Além das que citei (“Lady Jane”, “Connection”, “Salt Of The Earth”, “Let It Bleed”, “Let It Loose” e “Hand Of Fate”), gostaria muito de ver um show dos Stones que tivesse “19th Nervous Breakdown”, “All the Way Down”, “As Tears Go By”, “Black Limousine”, “Child of the Moon”, “Coming Down Again”, “Dirty Work”, “Down the Road a Piece”, “I Got the Blues”, “I’m Free”, “Jig-Saw Puzzle”, “Laugh, I Nearly Died”, “Love in Vain”, “Moonlight Mile”, “No Expectations”, “One Hit (To the Body)”, “Rocks Off”, “She’s So Cold”, “Sway”, “Sweet Virginia”, “Time Waits for No One”, “When the Whip Comes Down” e “Worried About You”. Agradeço pelo seu comentário!