Feliz aniversário, Paul Weller!

 

 

 

 

Paul Weller – 66
42′, 12 faixas
(Universal)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Já que Paul Weller resolveu batizar seu novo álbum – o décimo-sétimo de sua carreira solo – com o total de anos que completará no dia 25 de maio próximo, vamos a mais alguns números. Ele tem um total de impressionantes 44 anos de carreira. Onze deles foram vividos entre The Jam e The Style Council, os dois grupos do qual fez parte, entre os anos 1970 e 1980. E há 33 primaveras, Weller é um artista solo que parece incansável quando o assunto é incorporar influências ao que é capaz de fazer. Ainda que sua obra tenha dois troncos primordiais, rock e soul, ele segue disposto a ramificar e diversificar experiências que concedem espaço para eletrônica, jazz, pop, psicodelia, standards, enfim, o homem é imparável e tal inquietação às vezes nos faz pensar que ele tem muito mais anos de vida. É como se fosse um irmão mais jovem de titãs como Van Morrison ou Neil Young, mais veteranos que ele, ainda tomados por inquietação e disposição para compor, gravar, fazer shows e tudo mais. Sendo assim, “66” é a mais nova produção de Paul Weller. Nos resta ouvir e entender.

 

É interessante notar como o Modfather parece estar notando a passagem do tempo mais intensamente agora. Ele tem total noção de seu tempo no planeta e, mais ainda, de seus grandes momentos artísticos. Em “66”, Paul Weller celebra este seu papel de líder experiente, o proverbial “dono da bola”, e se permite receber as presenças de vários colaboradores em diferentes escalas. Aqui estão músicos que o acompanham há tempos – Steve Cradock, Dr Robert, Ben Gordelier, Jacko Peake -, retornos valiosos, como o do guitarrista original do The Jam, Steve Brooks, artistas convidados de peso (Say She She, Richard Hawley) e novos talentos (White Label e Le Superhomard). Se “66” tivesse sido feito nos anos 90, poderia ser o trabalho de “grandes amigos”. Aqui, resolutamente não é. Todos os presentes – incluindo também os co-compositores Noel Gallagher, Bobby Gillespie e Suggs – contribuem exclusivamente para servir ao material.

 

Apesar de ser fundamentalmente um recorte das muitas sessões que se estenderam pelo lockdown, “66” é coerente, ainda que seja bastante diverso. Gostei particularmente da quantidade elevada de arranjos orquestrais de Hannah Peel, gravados em Abbey Road, que soam diretamente tributários de gente como Burt Bacharach, funcionando particularmente bem na suntuosa “Rise Up Singing”. Outras faixas, como “Soul Wandering”, “Jumble Queen” e “Flying Fish” são mais objetivas, com refrões e ganchos presentes por toda parte e muito espaço para diversidade de citações, abordagens e arranjos. Tem rock, tem pop, tem popão, tem latinidade, não parece haver limites para o homem. Mas o melhor disso tudo é que Weller parece ter recuperado uma irreverência/deboche que eram muito evidentes quando teve seu melhor momento na carreira, justamente a bordo do Style Council. A linda e fluida “A Glimpse of You” – co-escrita com Christophe Vaillant e a valsinha “My Best Friend’s Coat” são puro SC e isso é sensacional.

 

Já no território da soul music, a colossal “Nothing” logo se destaca. Outras canções que vão por essa mesma alameda, como “I Woke Up” e “Soul Wandering” também abrem espaço para um tipo de lirismo mais conectado tanto com as origens do estilo quanto com suas primeiras incursões na área, ainda no The Jam, quando adorava fazer cover de Curtis Mayfield. Completam o percurso momentos lindos como “Rise Up Singing” e a bela “Sleepy Hollow”. Na última faixa do álbum, “Burn Out”, ele diz não estar cansado de viver, algo que já era evidente.

 

“66” é uma viagem impressionista pela idade, pelo tempo e pelas pessoas que passam, observando crianças crescendo e se tornando adultas. É um trabalho adulto, que celebra a passagem do tempo e os benefícios que ela pode trazer. Discaço.

 

 

Ouça primeiro: “Nothing”, “My Best Friend’s Coat”, “A Glimpse Of You”, “Rise Up Singing”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *