É exagero reclamar de BBB?
Chega o início do ano, desde que estamos neste século, e um evento se repete: uma nova edição do Big Brother Brasil na Globo. O reality show, que é criação holandesa, teve seu nome baseado no personagem criado por George Orwell para o livro “1984”, é líquido e certo. Há um bom tempo que todas as arestas de “realidade” foram limadas da atração, deixando-a cada vez com cara de irreal, pré-fabricada, forçada e artificial. Mas ninguém parece se importar muito com isso. Se fossem 20 girafas ou 20 antas encarceradas numa casa, interagindo, haveria audiência e mais: haveria defensores e detratores.
Eu fico a me perguntar. É exagero reclamar do BBB? É bem chato ter alguém postulando supostas verdades ou clamando ser detentor do saber máximo, legislando sobre o gosto alheio. Né? As pessoas assistem o que têm vontade, oras. Se querem – para usar um termo caro ao mercado – investir seu tempo disponível acompanhando as aventuras dos participantes, o que há para ser feito? Nada. Se há amigos teus, progressistas, articulados/as, queridos, vendo e debatendo sobre o BBB, o que fazer? Nadica de nada.
Tenho uma teoria simpática sobre o povo brasileiro e a Globo. É um caso de amor intenso e abusivo. O povo ama a emissora carioca, mesmo que essa tenha feito tanto mal ao longo dos anos, apoiado ditadura, deposto governo, sempre estado do lado do rico, direcionado sua programação e jornalismo para privilegiar visões da vida e da história que colocam o pobre, a minoria, o progressista, junto com corrupção, crime, desvio de conduta e exotismo. Mesmo assim, depois de todos esses anos, novelas, anas marias bragas, faustões, fantásticos, o povo segue assistindo domesticadamente a programação. Não é diferente com o BBB, tanto que a atração chegou a alçar o ex-apresentador pedro bial à condição de “poeta”, ele que editou um livro que compilava seus … discursos de despedida de participantes da atração.
BBB é o exercício da sociedade brasileira, de prestar atenção nos outros em vez de olhar pra si. Agora, que a atração colocou famosos e anônimos – segundo eu li em pesquisa para este rápido texto – o ato de bisbilhotar fica ainda mais irresistível. Nada é mais legal que olhar para o gramado do vizinho, especialmente quando ele é famoso e rico. É o que se faz por aqui, desde Cabral.
Mas e daí? Qual o problema de gostar disso?
Nenhum, oras.
Ver BBB é exercitar e perpetuar o seu sagrado direito de ser brasileiro.

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.
Valeu, Fernando!
Exatamente !!!! Mais um excelente texto, resumiu como eu jamais conseguiria. Existe um elitismo cultural que renega o popular, já fui bem assim.
Parabéns pela bela reflexão!