“Alien: Romulus” recupera e revigora a franquia

 

 

 

O diretor e produtor Ridley Scott talvez nunca tenha imaginado que seu filme de 1979, “Alien”, seria o primeiro de uma série, tampouco se transformaria num ícone da cultura pop. Mas foi exatamente o que aconteceu e a longevidade da obra é o maior sinal de sua excelência. Os números impressionam: depois do primeiro longa, vieram outros três, diretamente conectados, “Aliens – O Resgate”, “Alien 3” e “Alien 4 – Ressurreição”, além de “Prometheus” e “Alien – Covenant”, sem falar em dois outros longas escalafobéticos “Alien vs Predador”, sem falar em jogos eletrônicos, vídeos feitos por fãs, bonequinhos, naves, mitologia própria, ou seja, uma fonte quase inesgotável para falar sobre a descoberta de uma forma de vida praticamente perfeita e totalmente predatória, fruto de experiências feitas por uma raça superior num passado de dezenas de milênios. E o estrago é imenso em todos os capítulos da saga, com resultados sempre inferiores a este primeiro longa de Scott, feito há 45 anos. E “Alien – Romulus” chega com a missão de rever os elementos principais da história e levá-la adiante. E consegue.

 

Na verdade, é injusto invalidar os filmes seguintes. “Aliens, O Resgate”, de James Cameron, lançado em 1986, é sensacional e fica alguns décimos abaixo do original, tendo o mérito de mudar o clima de suspense e terror do original e ser um baita filme de ação frenético. E “Prometheus”, de 2012, dirigido pelo próprio Scott, tem ótimas ideias que ficam a meio caminho da realização plena. É pouco, no entanto, para tantas ramificações e “Alien: Romulus” chega para equilibrar o jogo. Dá pra dizer que este filme do diretor uruguaio Fede Alvarez chega para ocupar o terceiro lugar na ordem de excelência das continuações, ficando atrás apenas do original e do longa de Cameron. Dado o tempo transcorrido e a multiplicidade de situações possíveis, considero um baita mérito de Alvarez e sua equipe conseguir pegar eventos dos outros filmes, especialmente dos dois primeiros e de “Prometheus”, como ponto de partida para encaixar “Romulus” na linha do tempo, mais ou menos cinquenta anos após dos eventos de “Prometheus” e vinte e poucos após os do primeiro filme.

 

Outro mérito é a inserção de personagens novos dentro da lógica da série. Dessa vez, temos um grupo de jovens mineiros, que moram numa colônia em que não há luz do dia, a 65 anos-luz da Terra, chamada de “Jackson”, vivendo uma vida opressiva sob as condições desumanas de trabalho da Weyland-Yutani, a mega-corporação maquiavélica que está por trás de todas as tragédias da saga Alien. A maioria dos jovens perdeu seus pais trabalhando nas minas do planeta e buscam deixar aquele mundo horrível para trás, sem sucesso. Daí alguém tem a ideia de invadir uma estação espacial da W-Y, que está abandonada na órbita e, uma vez dentro dela, pilhar equipamentos de estase que permitam uma viagem de nove anos até um sistema solar no qual poderão ter um pouco mais de liberdade. Justo nesta estação, a “Romulus-Remus”, estão concentradas todas as pesquisas que a megacorporação vem fazendo desde os eventos ocorridos em “Prometheus” e no primeiro longa. Ou seja, é o lugar menos indicado para algum humano estar.

 

Entre os jovens invasores está a introspectiva Rain (Cailee Spaeny) que, por mais que deseje deixar Jackson para trás, intui que a empreitada renderá perrengues em quantidades industriais e suas previsões se concretizam em pouco tempo, logo que o grupo avançado da equipe dá de cara com vários, muitos, muitos mesmo, “facehuggers”, os vetores parasitários da criatura, que grudam no rosto do hospedeiro e estabelecem um ciclo simbiótico em que, se for removida, a pessoa perderá a vida. Pouco tempo depois, o hospedeiro tem uma criatura arrebentando seu peito, iniciando um ciclo de vida que a tornará o monstro, o xenomorfo, o “alien” do título. Logo que a primeira pessoa cai nessa situação e a certeza de que estão no pior lugar possível, o grupo procura fugir desesperadamente da estação, mas uma série de questões e contratempos colocam sempre tudo a perder.

 

O roteiro, do próprio Alvarez, faz com que a trama esteja contida muito mais no campo do terror do que da ação, lembrando bastante o clima do primeiro longa na maior parte do tempo, para chegar num ato final em que tiro, porrada e bomba têm lugar mais destacado. Rain é uma personagem carismática o suficiente para dar esperança de ter uma sequência de eventos centrada nela e sua postura diante das situações que vão surgindo é original e quase nerd, fazendo dela um tipo inédito na galeria de personagens pregressos. Ela é mais instintiva, com saberes e soluções que surgem de forma natural, sem ser uma cientista ou uma militar, algo que surge como novidade em relação aos outros filmes da série. O androide Andy, interpretado pelo competente David Jonsson, também estabelece novas relações na dinâmica entre humanos e sintéticos, rompendo um pouco a tradição, revelando uma abordagem moderna, que serve bastante à trama. A sequência final está no mesmo nível dos melhores momentos dos dois primeiros filmes da saga.

 

Fede Alvarez conseguiu realizar o filme que todo fã da série Alien estava esperando por anos a fio. Ele recupera e adapta a mitologia dos eventos, insere novidades críveis e consegue propor uma personagem com força suficiente para avançar em continuações possíveis. Vai mais longe que qualquer filme realizado após os dois primeiros longas da saga e isso, gente, é surpreendente. Vejam e se preparem para sustos sinistros.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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