“World Record” confirma boa fase de Neil Young

 

 

 

 

Neil Young & Crazy Horse – World Record
47′, 11 faixas
(Reprise)

3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)

 

 

 

 

 

Um cara com a história de Neil Young parece já ter quebrado todos os recordes em sua carreira, certo? Nem tanto. Este novo álbum, o quadragésimo-segundo que ele lança, marca a primeira vez em que Young trabalha com o Crazy Horse por três discos consecutivos. Os álbuns em questão são “Barn” (2021), “Toast” (2022) e, claro, este bom “World Record”. E até dá pra dizer que estes trabalhos guardam certa coerência temática, algo meio raro em termos de Neil. O primeiro foi gravado nas montanhas do Colorado, num velho celeiro, com suporte de balões de oxigênio para os veteranos músicos, falando sobre o transcorrer do tempo e como é bom poder olhar para trás e ver um monte de realizações. “Toast” é um disco baseado na releitura e recuperação de canções lançadas e deixadas em arquivo no início dos anos 2000, do período referente ao álbum “Are You Passionate?”. E este “World Record” meio que fecha esta trilogia, trazendo Neil e seu tema principal: a preocupação com a ecologia.

 

 

Olhando para “World…” em separado, dá pra destacá-lo dos outros já por dois motivos. A produção de Rick Rubin e a gravação/gestação do disco no estúdio dele em Malibu, de frente para o mar da Califórnia. Ali, durante o escaldante mês de julho deste ano, Neil e sua turma cascuda do Crazy Horse – Ralph Molina, Billy Talbot e Nils Lofgren, que substituiu o aposentado guitarristas Frank “Poncho” Sampedro – deram forma a este feixe de canções sobre como o Velho é grato ao planeta por tudo o que obteve nesta vida e, ao mesmo tempo, o sofrimento em ver a nossa bolota azul e branca em agonia diante dos ininterruptos casos de agressão ao meio ambiente e a degradação dos ecossistemas ao redor do mundo. No caso de Neil, o assunto é velho e ele é autoridade mundial no assunto, é bem natural que ele se manifeste diante do período terrível que vivemos sob os cascos de trump e de copycats locais como bolsonaro.

 

 

Em “World Record”, no entanto, Neil praticamente usou o disco para falar apenas desse assunto. É quase um trabalho conceitual, tanto temático, quando estético. A sonoridade presente nas onze faixas – dez, mais uma vinheta – é uniforme e tem um detalhe bem legal: Neil toca muito piano e órgão, decorrência da presença de Lofgren no Crazy Horse, permitindo que o cantor e compositor canadense possa dedicar seu tempo aos instrumentos. O resultado pode ser ouvido logo no primeiro single do álbum – também a sua faixa de abertura – “Love Earth” – cujo climinha instrumental fará os mais velhuscos lembrarem de “Lotta Love”, clássico agridoce da safra 1978 de Young. Esta sonoridade pianística e totalmente soft rock irá preencher a maior parte de “World Record”, mas também dará chance para o ouvinte sacar alguns detalhes bacanas.

 

 

O maior dele, certamente, é a presença de timbres rascantes de guitarra nos momentos em que os pianos não dominam a cena. É Neil e sua persona mais endiabrada, que os fãs tanto conhecem. O detalhe aqui é que ele está menos raivoso e mais, digamos, malandro, esperto e imbuído de um espírito de velha raposa rocker, algo que ele já é há bastante tempo. Esta atitude mais, digamos, relaxada, contrasta com a seriedade de faixas como “Break The Chain”, “This World (Is In Trouble)” e “The Wonder Won’t Wait”. Mas será na lindeza de canções como “The Long Day Before” ou “Walkin’ On The Road” que o disco terá seu maior sentido. Em tempo: um épico de 16 minutos habita as faixas de “World Record”: “Chevrolet”, que, claro, fala de carros – outra paixão de Young – mas, à moda de Bruce Springsteen, usa o tema como analogia para o transcorrer do tempo e o escrutínio de mágoas passadas.

 

 

“World Record” é inferior a “Barn”, do ano passado, mas mostra que Neil parece recuperar sua velha forma musical. É um trabalho consistente, coerente e que vai agradar os fãs do homem. Podem vir.

 

 

Ouça primeiro: “Chevrolet”, “Love Earth”, “Break The Chain”

 

 

 

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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