Saudades do R.E.M: “Monster 25”

 

 

A banda cuja carreira era o ideal de cada grupo de rock independente do planeta havia chegado ao mega estrelato com dois álbuns de texturas acústicas, erguidos sobre arranjos do cancioneiro folk e dosado com largas porções de melancolia

 

Depois do sucesso popular e comercial de “Out Of Time” (1991) e “Automatic For The People” (1992), o R.E.M. se reunira para conceber o sucessor. Os quatro músicos decidiram a certa altura que era chegada a hora da música plugada ser protagonista novamente. A banda estava acenando ao rock de arquitetura mais básica. Co-produzido pelos músicos e o fiel Scott Litt que os acompanhava desde o clássico “Document” (1987), “Monster” chegou ao mercado em setembro de 1994, cinco meses após o suicídio de Kurt Cobain. Abria a era pós grunge extrapolando as fronteiras roqueiras estabelecidas pelo R.E.M. em sua música.

 

As guitarras de Peter Buck fazem uma camada densa, sinuosa, para letras sobre mídia, fama, sexo e obsessão. Pela primeira vez na carreira, dados externos sobre a trajetória da banda encontravam espaço na temática das canções. Inevitável, graças ao gigantismo atingido pelo R.E.M. após “Losing My Religion”.  “King Of Comedy”, faixa com trilhas eletrônicas, uma exceção no disco, e o primeiro single, “What’s The Frequency, Kenneth?”, ambas discorrendo sobre mídia e super exposição (Não sou rei da comédia/não sou sua revista/não sou sua televisão), passavam o recibo de que o R.E.M. havia acusado o golpe de ser estrela na imprensa mundial. Isso após mais de uma década construindo uma presença coerente e artisticamente íntegra no cenário das “college bands” que eles inadvertidamente haviam ajudado a criar.

 

“Monster” fazia ainda emergir elementos mais discretos que sempre fizeram parte do DNA da banda. “I Took Your Name” eletrificava o Velvet Underground de 1967 (Eu não quero ser Iggy Pop/mas se isso for o que é preciso..). Egresso do pós punk, o R.E.M. fazia de “Monster” sua guinada às guitarras urbanas, a um glam rock sujo. Nova Iorque no lugar de Athens, Geórgia. Não é por acaso que Thurston Moore, do Sonic Youth, participa de “Crush With Eyeliner” (Eu poderia ser seu Frankenstein/minha paixão com delineador). Patti Smith, que fora musa de “Automatic For The People” – um disco de punk rock lento, como “Horses”, da cantora, segundo Stipe – ainda indicava um norte poético a cada personagem envolvido em paixões obsessivas, interpretados pelo cantor em músicas como “Strange Currencies” e “Bang And Blame”. Patti iria sacramentar sua bênção à banda participando da canção “E-Bow The Letter”, do disco seguinte.

 

A turnê que se seguiu ao lançamento foi a primeira da banda desde 1989. Bem sucedida e caótica, com membros sofrendo graves emergências de saúde. Mike Mills, o baixista das harmonias vocais perfeitas, foi hospitalizado e o baterista Bill Berry sofreu o aneurisma que o levaria à decisão de deixar a banda em 1997. “New Adventures In Hi-Fi” (1996) foi gravado nos intervalos dessa turnê, um maravilhoso epílogo para “Monster”, multifacetado e mais variado estilisticamente. Depois da saída de Berry o R.E.M. se torna mais eletrônico, a banda se apresentava como um “cachorro de três patas”. Fase só abandonada em 2008, com “Accelerate”.

 

“Monster” trouxe o R.E.M. incorporando seu então recente mega estrelato à sua música e à maneira como se relacionava com o mundo. O clipe de “What’s The Frequency Kenneth?” trazia a primeira imagem do Stipe de cabeça raspada. O cantor flertava com o visual e imaginário queer e se tornava paulatinamente mais aberto sobre sua sexualidade até então mantida em segundo plano.

 

Em comemoração aos seus 25 anos a banda está lançando uma edição Deluxe, remixada pelo próprio Scott Litt, com os vocais de Stipe mais limpos e destacados da base. Talvez uma iniciativa desnecessária. Todo o caos e sujeira do som fizeram esse monstro rugir muito bem nessas duas décadas e meia. Além disso, a versão traz um grande número de demos e rascunhos em estúdio, além de uma apresentação ao vivo completa da banda em Chicago, 1995

 

Fabio Luiz Oliveira

Fabio Luiz Oliveira é historiador e crítico da Arte não praticante. Professor da rede pública do Rio de Janeiro. Escritor sem sucesso, espanta o mofo de seus textos em secandoafonte.wordpress.com

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *