Pitty – MATRIZ

Gênero: Rock alternativo
Duração: 43 min
Faixas: 13
Produção: Rafael Ramos
Gravadora: Deck
3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)

Pitty chega ao seu quinto disco de material inédito, “MATRIZ”. O release do álbum procura reforçar uma ideia básica a respeito do lançamento: é um trabalho moderno, “totalmente 2019”. É como se houvesse uma preocupação sutil em fazer a cantora e compositora baiana soar atual, sintonizada com nosso delicado momento. Não precisa, acho. Pitty há alguns anos é uma figura que extrapolou sua área de influência, especialmente a partir do momento em que assumiu um posto como apresentadora do programa Saia Justa, exibido semanalmente no canal global GNT. Sua atualidade vem daí, bem como sua popularidade hoje atinge gente que não gosta de seu trabalho como cantora. E pode haver o “vice versa”.

O disco se preocupa com uma legitimidade de Pitty a origens como a Bahia, o rock e um comportamento que não compactua com o sistema. É o que ouvimos logo de cara, nas primeiras palavras ditas na faixa “Bicho Solto”: “eu me domestiquei pra fazer parte do jogo, mas não se engane, maluco: continuo bicho solto”. É uma clara alusão à contradição de estar em evidência no Saia Justa, que soaria como a tal domesticação, e manter-se fiel ao que acredita, “ser um bicho solto” e, quem sabe, de dentro desse onipotente e onipresente sistema, mudar alguma coisa. Faz sentido, ainda que soe ingênuo e denuncie a alma que perpassa “MATRIZ”. Ele é um disco de reencontro, de reafirmação, de olhar no espelho diante das circunstâncias. É uma tentativa de reafirmar um compromisso firmado há muito tempo.

Esta preocupação de Pitty é válida e afetuosa. Ela poderia, simplesmente, dar de ombros e seguir por aí, fazendo o que lhe desse na telha. No entanto, parece sincera a vontade primordial de dar uma satisfação a si mesma e a quem a ouve desde que estourou no início dos anos 2000. Ao fazer isso, ela recorre a estas origens que mencionamos. A Bahia está presente nos convidados – BaianaSystem, Lazzo Matumbi, Larissa Luz, Teago Oliveira (da ótima banda Maglore) – seja na temática, geralmente sobre saudade e busca de identidade como reafirmação própria. Há uma ótima canção chamada “Bahia Blues”, na qual Pitty fala sobre suas origens como cantora e compositora, junto a amigos e parceiros que se distanciaram ou se perderam, caso de Peu, seu ex-companheiro e ex-guitarrista de sua banda, que ganha uma espécie de tributo em “Para O Grande Amor”.

Fora do espectro da saudade e das origens, Pitty também mostra bons achados. A balada “Motor”, gravada recentemente por Gal Costa, tem um instrumental beatle intencional e adequado. “Roda”, com o BaianaSystem, tem mistura de timbres roqueiros, que vão sendo engolidos pelo ataque rap-trap-tribal do grupo, com ênfase numa guitarra baiana bem sacada, que faz a diferença. Além delas, a dançante “Noite Inteira”, que tem um acento caribenho bem sacado e o rockão “Ninguém É De Ninguém”, a melhor canção desta safra oferecida pela cantora.

“MATRIZ” consegue se instalar nesses tempos atuais: tem sonoridade bem produzida – pelo veterano Rafael Ramos – diversidade, certa dose de conceito e a tal preocupação com os fãs, que soa fofa e delicada. Além disso, é a mesma cantora que emplacou “Equalize” e outros hits dos anos 2000, para o bem e para o mal.

Ouça primeiro: “Ninguém É De Ninguém”.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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