Letrux – Aos Prantos

 

 

Gênero: Rock alternativo, eletrônico

Duração: 48 min.
Faixas: 13
Produção: Arthur Briganti e Natalia Carrera
Gravadora: Independente/Natura Musical

 

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

A música de Letrux, também conhecida como Letícia Novaes, é multifacetada e totalmente contemporânea. Ela retrata com boa dose de precisão o comportamento e o kit de identidades do pessoal urbano que está na faixa dos 30 e tantos. É uma geração inteira, cheia de tiques e taques. Se o álbum anterior da moça, “Em Noite de Climão”, era uma radiografia do “fervo” noturno das azarações, tesões, pistas de dança e toda uma sequência de posturas, este “Em Prantos” é uma espécie de ficha caindo em relação à impossibilidade de seguir com a noite de climão. É como se fosse absolutamente inevitável desacelerar, refletir e, após pouco tempo, constatar o inegável vazio da nossa vida nesse início de século 21. “Aos Prantos” é a semana seguinte, a volta à condição normal.

 

Letrux faz isso com um planejamento que não estraga a espontaneidade, visto que esta é uma condição sine qua para seu trabalho existir. Quando a ouvimos e vemos, temos absoluta certeza de que ela está dando tudo, falando a verdade, mesmo que sob maquiagens e cenografias. É a mulher carioca, boiando nesta realidade, vivendo numa cidade que já foi maravilhosa, tentando entender seu papel no mundo, lutando por respeito e lidando com o conjunto de signos e significados de seu papel. Falando assim pode até parecer chato e estudado, mas não é. Assim como em “Climão” (e no adorável disco de remixes “Em Noite de Pistinha”), “Aos Prantos” é fiel e preciso no que se dispõe a relatar.

 

A moldura sonora fica a cargo dos produtores Natália Carrera e Arthur Briganti, que fornecem sonoridades que vão do synthpop mais eletrônico a roupagens pop oitentistas, baladas decadentes cantadas em frente ao espelho e por aí vai. É um conjunto de treze canções para serem ouvidas e pensadas numa maré de consciência total. Após a transa da noite, do fim de semana, do mês, ficam os buracos, a falta de companhia, de amor, a noção exata das coisas, da rua, do mercado, dos passantes que não estão nem aí para você, suas carências, seus fantasmas, seus grilos. Como diria a própria Letícia, você está “Fora da Foda”.

 

Algumas canções são especialmente legais. “Déjà Vu Frenesi”, a faixa de abertura, é soturna e declara as intenções: “se organizar direito, todo mundo chora, todo mundo cansa, mas nem todo mundo transa”, com Letrux falando que somos todos feitos de “lágrima, suor e porra”, matando a charada com “ou a gente pensa ou a gente sente”. É por aí. E é com este cartão de visitas que o ouvinte adentra essa verdadeira instalação de comportamentos. “Dorme Com Essa” é fruto de relances na rua “delirei, achei que te vi em Copa”, mas também é ficha caindo sobre a inevitabilidade da lembrança e da mágoa (dorme com essa, dorme com ela, dorme comigo”. Em “Fora da Foda”, o clima de funk-melody estilizado conduz letra sussurrada e cantada em dueto com Lovefoxxx. “Abalos Sísmicos” é uma linda faixa com arcabouço pop atual olhando para si – “por isso eu canto com essa cara de espanto” . “Salve Poseidon” é outra lindeza de guitarras funkeadas e letra de dança no escuro do quarto, mas citando Shakira e seu marido, o zagueiro Piquet. Tem participação de Liniker e os Caramelows em “Sente o Drama”, enfim, é um disco cheio de jeitos de olhar a mesma coisa.

 

Letrux é um talento que está se consolidando. Este álbum é tão bom quanto “Climão” e deve ter sido mais dolorido para existir. Letícia Novaes, gostem ou não, é sinônimo de sinceridade, nunca sincericídio. É a cantora a ser ouvida atualmente no Brasil que importa.

Ouça primeiro: “Salve Poseidon”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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