Kestrels – Dream or Don’t Dream

 

 

Gênero: Rock alternativo

Duração: 41 min.
Faixas: 10
Produção: John Agnello
Gravadora: Daria

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

Este disco é especialmente endereçado aos fãs velhuscos da variação melodiosa-saturada do rock alternativo americano, que gente como Dinosaur Jr criou antes mesmo do Nirvana existir, lá em meados dos anos 1980. A verdade é que o Dino era uma banda punk nesta altura, só foi forjar sua liga maravilhosa de guitarras distorcidas em nome da melodia no início dos anos 1990, especialmente a partir do álbum “Green Mind”, de 1991. Essa remissão é necessária porque os canadenses do Kestrels situam sua abordagem sonora exatamente neste momento. Não por acaso, quem produz tudo por aqui é John Agnello, que pilotava o estúdio para o próprio Dino Jr. Como se não bastasse, J Mascis, o homem, o mito, o cérebro da antiga banda de Boston, é convidado de honra. E mais do que isso: através da colaboração do líder da banda, Chad Peck, com Tim Wheeler, chefe da banda irlandesa Ash, o resultado que se espalha ao longo das dez faixas é semelhante ao de uma apoteose de lindeza guitarrística, especialmente desenhada para quem ama distorção com coração. Isso, “Dream Or Don’t Dream” é uma espécie de álbum que muita gente esperou e desistiu.

 

“Muita gente” pode ser um exagero deste que vos escreve. Mas, certamente, eu esperei por tanto esplendor de refrões perfeitos, arranjos enxutos, vocais celestiais e esta quase incapacidade de errar a mão, que Peck demonstra possuir ao longo das canções. Tudo aqui é quase um túnel do tempo para 1992, só que com a experiência e a vivência de hoje, uma espécie de “desejo de gênio da lâmpada”. Seria injusto, porém, dizer que este é um álbum nostálgico e apenas isso. Peck e seus amigos entregam um trabalho 100% rock, com tudo o que é necessário para a devida fruição por parte de gente que admira um trabalho bem pensado. Não há uma única canção que não seja próxima da perfeição. Os vocais de apoio funcionam, a dinâmica das guitarras é perfeita, o baixo é aveludado e forte, fornecendo o revestimento necessário para tudo funcionar.

 

Mesmo assim, com esta média quase nota dez de acertos, é possível destacar alguns momentos iluminados. O solo do próprio J Mascis em “Grey And Blue” vai direto no ventrículo esquerdo de pessoas que estavam lá no início dos anos 1990 e nunca o viram ou ao Dinosaur J ao vivo e se impressionavam como ele conseguia fazer aquela alquimia de barulho e céu. “A Way Out” é outro exemplo de como é possível manter-se na mesma pegada, ainda que baixando um pouco o nível de velocidade da gravação. Aqui é o mais perto que o Kestrels chega de uma “música lenta”, com um verdadeiro vôo ao sol poente de inverno. Sim, o disco me inspirou.

 

“Everything Is New” é outro momento dourado para quem se amarra na característica simbiose entre marteladas na bateria, guitarras mamúticas e melodias de algodão doce. O timbre é meticulosamente escolhido, a rapidez é ideal para ser alcançada na linha de chegada e os vocais de apoio desabrocham em flor. E ainda tem um solo animalesco que me fez ostentar um air guitar já na minha quinta década de vida, sozinho no quarto. Sim, o disco me afetou, gente.

 

Qualquer canção que você escolha para ouvir em “Dream Or Don’t Dream” vai tentar te levar para um pequeno paraíso perdido/recuperado em que haverá amor, fé no futuro, olhar doce de mãos dadas num passeio vendo o sol poente e todas essas figuras que significam música linda como fundo musical perfeito para a vida. Uma verdadeira zebra na minha lista de melhores discos do ano. Pode conferir na fé.

 

Ouça primeiro: o disco todo.

 

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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