Gabi Melim agora é Gabriela em estreia solo

 

 

 

 

Gabriela – Gabriela
34′, 13 faixas
(Believe Artists)

1 out of 5 stars (1 / 5)

 

 

 

 

“Gabriela” é o título do disco de estreia de Gabi Melim. Também é como ela deseja ser chamada em sua carreira solo, pelo nome, nada de apelido infantil ou algo do gênero. A gente já viu várias vezes esse filme – um artista muda de fase em sua trajetória e se enxerga “adulto”, “maduro” a partir de um determinado tempo. Eu acredito que essas mudanças estéticas devem ser perceptíveis a ponto de não ser necessário pontuar a alteração do nome ou algo do gênero. O fato é que Gabriela busca se colocar no competitivo mercado de cantoras jovens brasileiras que orbitam o universo do pop contemporâneo e sua versão do que se entendia/entende por MPB. A banda da qual Gabriela fez parte, a Melim, foi, durante alguns anos, um dos expoentes do chamado “pop good vibes”, uma forma ultralight de canção, marcada por arranjos em que uma gotícula de reggae via Jack Johnson era diluída numa piscina olímpica, com resultados, bem, chatos. Mas essa é a opinião do velho crítico, a fórmula foi vencedora e fez da Melim uma representante vitoriosa dessa estética, na qual também estão nomes como Armandinho e Vitor Kley. Engraçado que, à medida que o grupo ficava mais velho, o interesse de seu público pelas novas criações – um pouco mais complexas (chegaram até a gravar um álbum de covers de Djavan) – ia diminuindo. Agora, devidamente separada dos irmãos Diogo e Rodrigo, Gabriela tenta a sorte.

 

O resultado é, com o perdão da sinceridade, péssimo, e isso se deve tanto ao pacote de marketing do álbum quanto ao terrível timbre de voz da moça. Ela é esforçada, tem garra, tenta se expor artisticamente, mas é tudo em vão. Gabriela não consegue escapar do tom de voz infantil e as tentativas da produção acabam piorando o resultado. Em alguns momentos, o tom de voz é tão irritante que fica impossível prestar atenção na canção. É uma pena, a produção de Gabriel Geraissati e José Gil tenta tirar coelho da cartola, oferecendo arranjos estilizados de forró, reggae, balada, tudo para dar a chance de Gabriela se destacar mas ela fica muito aquém do esperado para um trabalho que se enxerga “adulto”. “Um Salve”, baladinha com acordeon sob medida para um por do sol idealizado, parece cantada por uma criança de dez anos e essa impressão – que está por toda parte – coloca em xeque a engenharia marketeira do álbum. Dá pra lembrar de uma contemporânea de Gabriela, Luisa Sonza, que também abusa do marketing de produto e tem um timbre de voz dos mais terríveis, além de um jeito de cantar que desafia a paciência do mais elevado ouvinte. Perto delas, Sandy soa como Nina Simone.

 

“Gabriela”, o disco, conserva um pouco da aura good vibes da Melim. Tudo é muito solar, ventilado, arborizado, com móveis sustentáveis da Tok Stok, próximo ao mar. É como uma produção do Multishow sobre o litoral, com belas imagens e sacadas bacanas de produção, mas com um texto péssimo e bobo. A sensação que as treze intermináveis faixas transmitem é deste eterno e estilizado verão de pousada na Região dos Lagos com produtos de beleza da L’Occitane Au Brésil achados no banheiro. Com essas sensações e referências, digamos, extra-música, é bem difícil destacar uma canção, mas talvez o dueto com o ótimo Bruno Berle em “Amor Inteiro” faça alguma diferença em meio ao todo. Seu ritmo é diferente, tem um pouco mais de percussão no arranjo e sangue nas veias, além de um toque caribenho com um efeito interessante. Mas é uma exceção em meio a um panorama estéril.

 

“Errejota”, como o nome já diz, evoca uma carioquice idílica e falsa como se o Rio fosse apenas um trecho de alguma restinga perdida no litoral.”Everybody Loves” é uma das que têm um arranjo reggae, que soa baixo demais na mixagem, deixando soterrada qualquer chance de chamar atenção pelo lado instrumental ou algo que não envolva os vocais. O refrão é temerário: “everybody goes goes goes, everybody la la la loves, quero o teu amor pra sempre”, mas a letra toda é terrível, falando sobre o sol e a praia que resolvem tudo no paraíso idealizado. “Desisto Não”, apesar do temerário e profético título, até ensaia alguma inovação estética no arranjo, mas a letra já começa com “Quando eu quero, você não quer, quando você vai, eu não vou, e nos seus encontros sempre dão caô, nunca dá bom meu bem, o que eu preciso só você tem”, sem falar no terrível, imperdoável verso “você é singular e eu sou plural”. A coisa só piora a caminho do fim do álbum, com mais tentativas de relevância que derrapam na mediocridade, como “Clichê do Clichê”, outra faixa que até tenta mostrar um arranjo criativo, mas, novamente, a letra, que fala em “samba na terça-feira, ginga na capoeira e gosto de maresia” torna tudo muito, mas muito difícil.

 

“Gabriela”, o disco, é um trabalho oco. Não parece ser real o envolvimento da cantora com o que está fazendo, tudo soa fora de lugar, raso, medíocre, tatibitati, bobo, tolo e desnecessário. Fico triste ao ouvir tamanho equívoco numa produção de artista jovem brasileiro. Sinceramente, isso só vai funcionar com muito investimento na mídia hegemônica, especialmente em atrações que pouco ou nada tenham a ver com música. Evite.

 

 

Ouça primeiro: nada.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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