Conheça o sensacional e desiludido Hataalii
Hataalii – Waiting For A Sign
38′, 10 faixas
(Dangerbird)

A música pop nunca vai parar de se misturar. É um movimento de precisão física, mecânica e irreversível. A partir da difusão massiva de informações e da proliferação da tecnologia ao redor do planeta, as possibilidades são, literalmente, infinitas e só aumentam à medida que o tempo vai passando. Veja, por exemplo, o caso do trovador navajo Hataałiinez Wheeler. Nascido há 21 anos na cidade de Window Rock, capital da nação Navajo, no Arizona, ele chega ao quinto álbum como um dos mais representativos integrantes da família de trovadores musicais da América profunda, aquela que não aparece nas séries espertinhas dos streamings.
Com uma sonoridade instigante, oscilando entre bandas dos anos 1990 como American Music Club, Pavement e Grant Lee Buffalo, além de uma influência nítida de Lou Reed e um desencanto próprio e contemporâneo, Hataalii atinge níveis altíssimos de eficiência e lirismo neste belíssimo “Waiting For A Sign”, um verdadeiro rosário de observações sobre a decadência da sociedade americana branca convencional. Como o release diz, as canções são “hinos de cidades fantasmas” ou uma reportagem que falava do álbum anterior, “Singin Into Darkness” (2023), “contos de saudade do Sudoeste americano”. Seja o que for, é absolutamente sublime na maioria do tempo. O instrumental é límpido, claro, convencional mas genial e usa a configuração básica de baixo, bateria e guitarra, sem nenhuma intervenção mais elaborada ou arranjo mais complexo.
O resultado é a quase-perfeição de canções como “Brown Fool Eyes”, que pega vocais agudos e graves do próprio Hataalii e traça pequenas tramas geniais. Outras gemas de têmpera folk rock grantleebuffalorianas surgem perfeitinhas, caso de “Go Ahead And Try”, cujos vocais lembram demais Grant Lee Phillips, na nossa opinião, o melhor cantor que o rock americano produziu desde os anos 1990. Ainda tem a placidez de “Near The Sea”, a bateria eletrônica de “Buckskin Boy”, o rock perfeito de “Something’s In The Air” e muito mais. Discaço absoluto.
Ouça primeiro: “Brown Fool Eyes”, “Something’s In The Air”

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.