Como ficou “McCartney III” reimaginado?

 

Paul McCartney e vários – McCartney III Imagined

Gênero: Rock, eletrônico

Duração: 47:29
Faixas: 11
Produção: Paul McCartney, vários
Gravadora: Universal

3 out of 5 stars (3 / 5)

 

 

 

 

No fim de 2020, Paul McCartney lançou “McCartney III”, a terceira, e provavelmente última, parte de sua linhagem de álbuns gravados apenas por ele, em certa reclusão, que marcaram sua carreira ao longo do tempo. Este ótimo trabalho ainda teve o tempero extra da pandemia, que forçou Macca a se entocar em seu estúdio particular e ficar lá, ruminando melodias, lapidando ideias, testando timbres e dando vida a canções adoravelmente tortas, rascunhadas, meio inacabadas, que mostraram uma sensibilidade fluida e intacta. Agora, meses depois, ele lança uma versão “reminaginada” do álbum, cheia de participações especiais de artistas convidados a entrar nessa refazenda das canções gravadas na solidão estética do estúdio isolado. A escolha dos participantes mostra que Macca e seu time estão de olhos e ouvidos ligados no que acontece no mundo da música e o resultado, bem, como não poderia deixar de ser neste tipo de trabalho, é bem irregular.

 

Por mais que algumas escolhas reflitam o olho certeiro na contemporaneidade, não dá pra dizer que gente como Phoebe Bridges (cantora e compositora americana em ascensão) ou Blood Orange (que já se chamou Lightspeed Champion) tenham acertado no alvo. Pelo contrário, suas versões de “Seize The Day” e “Deep Down”, respectivamente, soam completamente descoladas do contexto, levando as canções para espaços alternativos demais. É muita reimaginação, gente. E nem se trata de oferecer panoramas totalmente distintos, mas de entender o clima do original e modificá-lo sem perder a mão e este é o caso da versão de mais de onze minutos que 3D (do Massive Attack) fez para “Deep Deep Feeling” que, paradoxalmente, lembra algo que poderia estar no “McCartney II”, caso este também fosse reimaginado.

 

Há alguns figurões presentes na lista, claro. Damon Albarn, por exemplo, não consegue muitas horas de vôo com sua versão para a originalmente folkie “Long Tailled Winter Bird” traz caos e psicodelia de efeitos especiais, soando como alguma gravação em laptop do Gorillaz mais recente. Outro momento que fica aquém da expectativa é a colaboração com Josh Homme, que se limita a enfiar aquele timbre característico de Queens Of The Stone Age em “Lavatory Lil”, a canção mais rock’n’roll do original. O resultado não deixa de ser frustrante, com excessivo respeito de Homme pelo original. St.Vincent também não obtém um bom resultado em sua revisão de “Woman And Wives”, que soa linear demais e com vocais mexidos que chegam a parecer meio caricatos. Bola fora.

 

Agora os acertos. Beck leva a medalha de ouro logo na primeira faixa, “Find My Way”, que é turbinada por um balanção funk quase irresistível. A prata fica para a dancinha vintage e empoeirada que o Khruangbin consegue enfiar em “Pretty Boys”, misturando psicodelia do deserto com esquisitice pós-globalização, dando origem a uma nova e sensacional criação. E o bronze vem com a honrosa participação de Anderson.Paak, que levou “When Winter Comes”, originalmente uma balada tristonha, para um terreno neo-funk muito bem vindo, cheio de bateria nervosa e ambiência de pianos. Fechando a conta, as versões de EOB (Ed “Radiohead” O’Brien) para “Slidin'” e Dominic Fike, para “The Kiss Of Venus”, não chegam a entusiasmar, mas não fazem feio.

 

O inventário deste “McCartney III” reimaginado fica mais justificado pela disposição de Macca em mexer nas suas criações, torná-las disponíveis para novas visões e horizontes. Se o resultado final não foi o desejado em alguns momentos, pelo menos a intenção é a melhor possível.

Ouça primeiro: “Find My Way”, “Pretty Boys” e “When Winter Comes”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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