A fúria sem fofura das sensacionais Linda Lindas

 

 

 

The Linda Lindas – No Obligation
35′, 12 faixas
(Epitaph)

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

 

O punk pop se tornou um dos mais importantes idiomas do rock alternativo anglo-americano desde o início do século. Na verdade, desde os últimos instantes do século passado, quando Green Day e Offspring, numa raia em que corriam também bandas mais pesadas e estofadas como o Bad Religion e o Rancid, além de aspirantes a estrelas como Avril Lavigne se incumbiram de difundir a mistura explosiva de acordes rápidos de guitarra com melodias assobiáveis e cantaroláveis para além dos Estados Unidos. Deu no que deu: várias bandas e artistas surgiram na esteira dessa sonoridade ao longo dos últimos anos, de Paramore a Demi Lovato e Olivia Rodrigo, dando sua versão mais ou menos pessoal da mesma fórmula. Nos últimos anos, porém, nada é mais legal e simpático que o surgimento das Linda Lindas, quatro meninas de Los Angeles, irmãs, primas e amiga, que têm uma assinatura personalíssima da mesma forma de fazer rock – acordes rápidos e melodias simples, porém, eficientes. Some a isso a graça de suas integrantes terem entre 14 e 20 anos de idade e a uma liga sonora realmente forte, obra do pai-tio-produtor Carlos de La Garza e do próprio talento das gurias. Chegam ao segundo álbum, “No Obligation”, badaladas e tratadas como o futuro que já está entre nós. Vejamos.

 

Tudo tem acontecido muito rápido na vida das meninas. O grupo é formado pelas irmãs Lucia e Mila de La Garza, a prima Eloise Wong e a amiga Bela Salazar e se tornou viral com o primeiro single, “Racist, Sexist Boy”, lançado em 2021, elogiado por gente como Flea e Tom Morello. A prestigiosa gravadora Epitaph viu o clipe, gostou e assinou com as meninas quase imediatamente e, no ano seguinte, saía o primeiro álbum, “Growing Up” (que a gente resenhou aqui). Desde então, o grupo só faz ganhar mais e mais prestígio, fazendo shows no Festival Coachella e abrindo para ídolos como Paramore e Bikini Kill além de participar do badaladinho tributo ao Talking Heads (“Everyone’s Getting Involved: A Tribute To Talking Heads’s Stop Making Sense”) ao lado de gente como Miley Cyrus, Lorde, Norah Jones, The National, entre outros. Agora chega este ótimo segundo álbum, que manterá a chama acesa. O segredo desta evolução rápida é, digamos, caseiro.

 

Carlos de La Garza, pai de metade da banda e tio de outro quarto, é um produtor com bastante experiência no terreno do punk pop. Além de ter feito parte de várias bandas na periferia de Los Angeles, dentre as quais, Reel Big Fish foi a mais badalada, Carlos logo percebeu que funcionava melhor na pilotagem do estúdio, tanto na produção quanto na engenharia de som. Não por acaso, ele colaborou com um monte de gente boa, como M83, Jimmy Eat World, Tegan and Sara, Wolf Alice, Best Coast, Bad Religion, chegando a ganhar um Grammy em 2016 pelo trabalho com … Ziggy Marley. Além disso, de La Garza se tornou grande colaborador do Paramore, banda que se tornou ícone dessa geração pop punk dos anos 2010 e com quem ele também ganhou Grammy em 2015. Ou seja, o sujeito tem a manha para a confecção de um bom álbum dentro deste terreno e certamente educou bem suas filhas e sobrinha com boas influências sonoras dentro de casa. A presença de Carlos pode ter potencializado bastante, mas, certamente, as meninas têm talento e energia de sobra. Eloise Wong, por exemplo, é uma pequena grande baixista em formação. Sua pegada em estúdio e no palco é admirável.

 

“No Obligation” é um disco contagiante e cheio de ótimas canções. Tudo é programado para fisgar o ouvinte e grudar na mente dele e de lá sair apenas com muito esforço. E tudo é muito, muito bom. Uma canção como “All In My Head” é quase irresistível e, ao mesmo tempo, é cheia de ótimas referências, lembrando bastante uma cruza hipotética entre The Runaways e o Pretenders pré-1982, com acento pop perfeito para os dias atuais. “Too Many Things” é outra lindeza com ótima linha de baixo e poder de fogo que vai aumentando à medida que a canção vai acontecendo. “Yo Me Estreso” é uma excentricidade inesperada, cantada em espanhol e com participação, veja você, de Weird Al Yancovic, enquanto “Resolution/Resolution” é outra doideira grudenta e cheia de letras antissistema. Nesse mesmo clima vai “Nothing Would Change”, cheia de timbres agudos de guitarra e andamento vitorioso. Mas nossa preferida máxima do álbum é a adorável, sensacional “Once Upon A Time”, que tem arranjo intrincado e melódico, com mais um destaque para o baixão de Eloise, coisa realmente complexa e sensacional.

 

As Linda Lindas estão em turnê com o Green Day, o que mostra a relevância delas dentro deste contexto de renovação do punk pop. As meninas têm a manha e vão longe, com toda a certeza. Quanto tempo vai demorar para o ouvinte médio de música aqui do Brasil descobri-las? Ouça pra ontem.

 

 

Ouça primeiro: “Once Upon A Time”, “Too Many Things”, “Yo Me Estreso”, “Resolution/Resolution”, “Nothing Would Change”, “All In My Head”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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