Clássicos e adolescentes

 

Teenage Fanclub – Endless Arcade

 

Gênero: Rock Alternativo

Faixas: 12
Duração: 44:31 min
Produção: Teenage Fanclub
Gravadora: Merge

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Bem-vindos, senhoras, senhores, moças, rapazes e demais configurações, ao décimo-primeiro álbum do Teenage Fanclub. “Endless Arcade” dá continuidade a uma trajetória fonográfica iniciada há 32 anos, com “Catholic Education” e que adentrou os anos 1990 com uma mistura única e influente de power pop, Byrds e Beatles, com a sombra gentil do – então desconhecido e nada hype – Big Star. E deu no que deu: o TFC é uma das bandas mais queridas do mundo, mais em intensidade do que em quantidade, visto que seus fãs são do tipo “poucos e bons”, que se dedicam e amam a banda. Só que há uma constatação que deixávamos para baixo do tapete há tempos: a cada disco, o “velho” Teenage fica um pouco mais para trás, no espelho retrovisor da vida. Sim, sabemos que nada há de errado nisso, mas também não há equívoco em sentir saudades dos tempos em que havia mais peso na guitarra ou que dava pra sentir um pouco de coração pulsante por baixo das melodias doces e sonhadoras.

 

Talvez seja injusto cobrar isso dos caras. Norman Blake, Raymond McGinley, Francis MacDonald, David Gowan e o estreante e ex-Gorky’s Zygotic Mynci, Euros Childs, são criaturas a serviço de uma sonoridade que se tornou língua morta: o rock de guitarras melodiosas. Se eles já soavam meio fora de lugar há 20 anos, imagine agora, em pleno mundo dos algoritmos, dos streamings e deste pop eletrônico e hedonista que parece ser lei. As letras e amor e incompreensão, que refletem o ser humano em sua essência emocional, vão contra tudo o que se vê hoje em dia – não tenha emoções, lacre, dê, coma, pegue, jogue fora, siga em frente – e tal aceno ao passado soa revolucionário e antissistema em meio a uma realidade e um tempo presente ocos.

 

A sonoridade do Teenage Fanclub, se já não tem o pesinho de antigamente, os elevou a um status em que, tanto tempo depois de sua estreia, se configura como o de uma banda de rock clássico, exatamente com as suas inspirações. Ou seja, para o Death Cab For Cutie, por exemplo, o TFC é o mesmo que os Byrds ou o Big Star. E isso é a mágica do tempo, da percepção da música e da importância que ela pode ter. E talvez nesta visão “Endless Arcade” faça total sentido. É um compêndio de 12 faixas relaxadas, meio tristonhas, que clamam ao vento que a gente deve amar, mesmo que faça sofrer e que o sentimento resultante disso nos torna, enfim, humanos. É a trilha sonora para um mundo com menos smartphones e conexões, mas não soa nostálgica. A banda não oferece isso, a interpretação do ouvinte, sim. E funciona.

 

Das canções presentes, nenhuma é fraca. Mas é difícil achar uma que tenha força para entrar na galeria dourada de clássicos pregressos do TFC. Na verdade, apenas “Home” (psicodélica, com solo enorme de guitarra no fim), “The Sun Won’t Shine On Me” (que parece uma canção beatle que nunca foi gravada) e “I’m More Inclined” (linda, pesadinha, parruda e bem resolvida) têm potencial para se inscreverem num processo seletivo para o tal grupo seleto e irem relativamente bem. As outras nove faixas têm charme e belezura de sobra, mas ficam aquém do que o grupo costumava fazer. Por exemplo: “Living With You” é bela, melodiosa e efetiva, mas seria sensacional se tivesse mais guitarras e peso. “Everything Is Falling Apart”, o primeiro single, lançado ainda em 2020, tem lindeza sutil e melodia crocante, que vai crescendo, porém o todo padece de certa economia de sons e emoção. “In Our Dreams” começa mais invocadinha, mas não tem muito fôlego, enquanto “The Future”, solene, doída e lentinha, também não vai muito além. E “Silent Song”, que fecha o disco, é uma balada linda, mas que poderia ter um arranjo um pouco mais reforçado.

 

O que garante a nota 4/5 a “Endless Arcade” é o impressionante conjunto de canções. Se elas não têm envergadura para entrar no hall of fame de canções do próprio TFC, estão milhas acima da maioria da produção do rock de guitarras de hoje em dia. E isso sempre conta. Além disso, ouvir o álbum em 2021 é resistir a uma conjuntura emburrecedora e opressora que nos faz cegos de tanto vê-la.

 

Ouça primeiro: “I’m More Inclined”, “The Sun Won’t Shine On Me” e “Home”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

2 thoughts on “Clássicos e adolescentes

  • 30 de abril de 2021 em 12:36
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    Que bom que ainda exista bandas como os Teenage. Isso, para, mim, me deixa com certa esperança em seguir adiante.

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    • 30 de abril de 2021 em 13:09
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      Também compartilho do sentimento, meu caro. Abraço e obrigado pelo comentário.

      Resposta

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