Medalhões dos anos 1980 em discos ao vivo
Simple Minds – Live At The City Of Diamonds
100′, 18 faixas
(BMG)

Sting – 3.0 Live
48′, 10 faixas
(Universal)

Em 1986/87, Sting e Simple Minds também lançaram álbuns ao vivo. O grupo escocês veio com o multiplatinado “Live In The City Of Light”, registro duplo de um show feito em Paris, num tempo em que o vocalista Jim Kerr e sua turma surfavam o sucesso global de “Don’t You (Forget About Me)”, que ainda estava nas paradas do planeta mesmo lançada como single dentro da trilha sonora do filme “The Breakfast Club”, de 1985. Além disso, eles lançaram no mesmo ano o álbum “Once Upon A Time”, que marcava a guinada pop do grupo e emplacava outros dois hits mundiais: “Alive And Kicking” e “Sanctify Yourself”. Sting, por sua vez, estreara solo em 1985 com uma banda que equilibrava jazz e rock. “The Dream Of The Blue Turtles” foi o álbum que marcou este início de carreira, bem diferente do que fazia com seu ex-grupo, The Police. Para marcar esta nova fase e documentar as apresentações que fazia com este timaço de músicos, Sting lançou “Bring On The Night”, um disco duplo, no qual mesclou repertório de “Blue Turtles”, canções inéditas e acenos a algumas velhas faixas do Police. Tanto Sting quanto Simple Minds eram artistas de dimensão global, num mundo bem diferente de hoje. Quase quarenta anos depois, as trajetórias de ambos os coloca novamente na situação de lançar discos ao vivo de turnês que vêm sendo feitas: “Live In The City Of Diamonds”, é o registro de uma apresentação feita em Amsterdam pelo Simple Minds e “Sting 3.0” é um apanhado de faixas gravadas na última turnê do músico inglês, na qual ele esteve à frente de um power trio. Mesmo longe do brilho de antes, estes dois álbuns têm certo charme e cumprem sua função.
Os dois lançamentos são bacanas, cada um a seu jeito, ainda que a qualidade do álbum do Simple Minds seja maior que o registro de Sting e o motivo é bem simples: os escoceses oferecem dezoito faixas (na versão digital) do disco e uma versão de luxo, com 24 canções. Já “Sting 3.0” tem apenas dez faixas em seu lançamento nas plataformas, com versões mais luxuosas disponíveis apenas em vinil. É uma pena porque a ideia de liderar um power trio ao vivo é bem interessante e o número minguado prejudica essa percepção. Sting se apresentou com o guitarrista Dominic Miller, que tocou em vários de seus álbuns de carreira, e o baterista Chris Maas, que pertence à banda de apoio do Mumford & Sons. A escolha dessas faixas também cometeu alguns erros, como, por exemplo, a inclusão de “Seven Days”, um “deep cut” dos tempos do álbum “Ten Summoner’s Tales” (1993) e das surradíssimas “Every Breath You Take” e “Fragile”, surfando no sucesso da trilha sonora de “Adolescência”, série da Netflix. A maioria dos registros, entretanto, é composta por belezuras imortais como “Message In A Bottle”, “Synchronicity II”, “All This Time” e “Englishman In New York”. Há um medley meio torto de “Roxanne” e “Be Still My Beating Heart”, mas que funciona. Poderia ser muito, muito melhor.
“Live At The City Of Diamonds” é o terceiro – e último – álbum da série ao vivo em alguma cidade do planeta, iniciada, justamente, por “Live At The City Of Lights”, em 1987, e ampliada por “Live At The City Of Angels”, de 2019, gravado em Los Angeles. Além desta trilogia, os escoceses têm outros seis discos ao vivo, provavelmente um recorde mundial. O fato é que a banda tem mais de quarenta anos de atividade e alguns ótimos registros na carreira. Os álbuns lançados entre 1981 e 1985 – “New Gold Dream”, “Sparkle In The Rain” e “Once Upon A Time” – compõem uma tríade sensacional, que documenta a evolução do grupo em que migrou de um art-punk-rock para um rockão classudo e tecladeiro, que, após estes três discos, colocou o Simple Minds em pé de igualdade com o U2, que, naquele meio de anos 1980, era, talvez, a banda de rock mais instigante no mainstream. Daquela formação inicial do grupo, que ainda permanecia intacta nesta passagem para o sucesso, restaram o vocalista Jim Kerr e o guitarrista Charles Burchill, que comandam uma bandaça que se apresenta ao vivo, composta por com Gordy Goudie (guitarra base), Ged Grimes (baixo), Cherisse Osei (bateria), Erik Ljunggren (teclado) e Sarah Brown (vocal).
Algo que chama a atenção no repertório do álbum é a não-inclusão de canções gravadas pela banda em seus álbuns lançados no século 21. É uma escolha temática, visto que a produção recente do Simple Minds é boa o suficiente para figurar em setlists bacanas, mas a ideia aqui é brindar os fãs de longa data. Tal fato também se traduz nos arranjos quase inalterados das canções, exceção talvez por “Belfast Child”, que surge numa versão climática com mais de dez minutos. O privilégio para os fãs é tanto que uma parte considerável das faixas presentes é do início da carreira do grupo, caso de “Sons And Fascination”, “Sweat In Bullet”, “Glittering Prize” e “Book Of Brilliant Things”. Além delas, versões fiéis aos originais das minhas preferidas pessoais do grupo, “Promised You A Miracle” e “Someone, Somewhere In Summertime” (ambas de “New Gold Dream”, de 1981), surgem majestosas em meio ao desfile. Os superhits surgem em sequência, com “Don’t You (Forget About Me)” provocando a catarse habitual, mantida por “Alive And Kicking” e o fecho climático com “Sanctify Yourself”. A voz de Kerr ainda está em forma, Burchill se mostra o guitarrista criativo que sempre foi e o resto da banda segura a onda com total facilidade, com destaque para a vocalista de apoio Sarah Brown.
Ainda que sejam calcados na nostalgia e na lembrança de tempos idos, os dois álbuns mostram como estes artistas – Sting e Simple Minds – se encontram hoje em dia. Produtivos, ativos e capazes de arrastar muita gente para seus shows. Ainda valem a pena. Bastante.
Ouça primeiro:
Simple Minds: “Promised You A Miracle”, “Someone, Somewhere In Summertime”.
Sting: “Synchronicity II”, “All This Time”

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.